No diverso ecossistema aquático, as pradarias são como mato: nascem em praticamente qualquer lugar e se espalham generosamente pela vastidão de oceanos, rios e lagos. Agora, pesquisadores australianos e indonésios descobriram que essa vegetação tem papel maior do que simplesmente ornar os jardins marinhos. Elas funcionam como um filtro natural, limpando a água ao absorver a poluição costeira. Dessa forma, garantem a saúde não só de animais, mas de outras plantas e também do homem.
A pesquisa, publicada na capa da revista Science, foi apresentada ontem em uma coletiva de imprensa transmitida pela internet, durante o encontro anual da Academia Americana de Ciências. A principal autora do trabalho, Drew Harvell, professora de ecologia e biologia evolutiva, contou que a descoberta aconteceu em decorrência de um evento desagradável que envolveu cientistas durante um congresso internacional na Indonésia. Na ocasião, boa parte dos pesquisadores presentes no evento, realizado no Arquipélago de Spermonde, caiu doente, com disenteria. Um deles chegou a ter um caso ainda mais grave, contraindo tifo.
Harvell, então, teve a ideia de investigar como um ecossistema doente poderia afetar não só a saúde dos corais, um tema com o qual vem trabalhando há décadas, mas a dos homens, que, por sinal, contribuem significativamente com a poluição das águas. ;Voltei lá depois com uma equipe de pesquisadores para testar a qualidade da água. Nesse arquipélago, água fresca é escassa, a superfície do solo é muito fina e, no litoral, o ambiente marinho se mistura a resíduos sólidos, detritos humanos e lixo. Além disso, essas ilhas, superpovoadas, não têm sistemas sépticos;, relata Harvell.
A fim de checar o nível de comprometimento aquático, o grupo usou como parâmetro o nível das bactérias do gênero Enterococcus, micro-organismos que habitam o trato digestivo e a bexiga. A Agência de Proteção Ambiental norte-americana utiliza esse padrão para verificar a qualidade de praias e piscinas, por exemplo, e estabelecer possíveis risco para a saúde. No geral, as amostras excederam em 10 vezes os níveis considerados seguros. Contudo, quando a água era coletada nas regiões de pradaria marinha, a quantidade da bactéria era três vezes menor. ;Isso foi replicado em quatro diferentes ilhas. Então, tivemos informações convincentes de que a planta é capaz de filtrar os micro-organismos provenientes de excremento humano;, observa Harvell.
Corais protegidos
A limpeza da água também é importante para os corais. ;Depois dessa descoberta, também fiquei curiosa para ver se, além de reduzir o nível de patógenos, os resultados significariam uma redução nos níveis de duas doenças que vêm devastando os corais, a praga branca e a banda-preta. Então, pesquisamos 8 mil corais e descobrimos que aqueles adjacentes às pradarias têm duas vezes menos risco de adoecer comparado aos que não estão protegidos pela planta;, contou Joleah Lamb, pesquisadora da Universidade de Cornell que participou do trabalho. De acordo com ela, essa é a primeira vez que um estudo verifica que o ecossistema costeiro pode diminuir o nível de enfermidades que afetam organismos marinhos.
;Acreditamos que nossa descoberta é realmente importante para a conservação das pradarias marinhas. Elas estão reduzindo significativamente a cada ano ; em média, uma redução anual de 7%, desde 1990;, diz Jeroen van de Water, pesquisador do Centro Científico de Mônaco. O cientista fez uma análise genética em amostras de água e constatou que, além das bactérias do gênero Enterococcus, a planta reduz em 50% a circulação de outros patógenos que colocam em risco a saúde de corais, peixes e invertebrados, além de causar diversas doenças em humanos. ;Infelizmente, pouca atenção é dispensada ao problema da redução das pradarias. Essa planta presta um serviço realmente precioso à saúde e esperamos que esse estudo mande a mensagem para o mundo que elas são muito importantes e repletas de benefícios.;