Ciência e Saúde

Xarope de bordo é usado para combater infecções, diz cientista

Adicionado a antibióticos, o extrato do famoso maple syrup potencializa a ação dos remédios, gerando o efeito esperado com apenas 10% das doses usualmente prescritas

Vilhena Soares
postado em 03/04/2017 06:00
Usado no café da manhã para deixar alimentos mais saborosos, o xarope de bordo pode ser a chave para o combate a um dos problemas mais preocupantes em saúde pública: a resistência das bactérias aos antibióticos. Pesquisadores canadenses descobriram que o extrato desse produto aumenta a ação dos medicamentos, fazendo com que as doses sejam reduzidas sem a perda do efeito esperado. Detalhes do trabalho foram apresentados ontem no 253 ; Encontro Nacional da Sociedade Americana de Química, que termina hoje, em São Francisco, nos Estados Unidos.

A autora principal do estudo, Nathalie Tufenkji, conta que o xarope de bordo, também chamado de maple syrup, já é usado para tratar problemas de saúde. ;As populações nativas do Canadá, há muito tempo, usam esse produto para combater infecções. Eu sempre me interessei pela ciência que existe por trás desses remédios populares;, declarou, em comunicado à imprensa. Em uma pesquisa anterior, ela e a equipe investigavam efeitos antimicrobianos em substâncias naturais e acabaram percebendo que o extrato do xarope de bordo tinha propriedades anticancerígenas. ;A partir daí, tive a ideia de verificar melhor sua atividade antimicrobiana. Então, pedi para um dos meus parceiros de pesquisa ir para a loja comprar mais xarope;, conta a autora.


No experimento, Tufenkji e sua equipe separaram o açúcar e a água dos compostos fenólicos (substâncias químicas) do xarope de bordo, que dão a coloração dourada ao alimento. Em um teste inicial, expuseram várias estirpes bacterianas causadoras de doenças ao extrato do xarope, mas não observaram efeitos promissores. Em uma segunda etapa, misturaram o extrato a antibióticos usados recorrentemente, a ciprofloxacina e a carbenicilina, e houve um aumento considerável no efeito dos medicamentos.

A eficácia foi tão grande que, ao adicionar o xarope de bordo a porções menores do antibiótico ; apenas 10% da dose usualmente prescrita ;, os cientistas observaram que a nova dosagem surtia o mesmo efeito. A mistura foi testada com a E. coli, que causa problemas gastrointestinais; a Proteus mirabilis, responsável por infecções do trato urinário; e a Pseudomonas aeruginosa, que pode causar infecções em hospitais. Todos os testes mostraram resultados positivos, com o aumento da eficácia do medicamento.

Mais estudos


A equipe de Tufenkji também testou o extrato em moscas de fruta e larvas de mariposas. Eles deram aos animais alimentos com bactérias e antibióticos com e sem o extrato fenólico. As cobaias que receberam a mistura do extrato de xarope de bordo e antibióticos viveram mais dias do que o grupo que recebeu o medicamento puro. Apesar dos resultados promissores, a autora ressalta que mais pesquisas precisam ser feitas.

;Hoje em dia, enfrentamos uma crise mundial de resistência aos antibióticos. Ainda é muito cedo para dizer que essa seja a solução. Precisamos fazer mais estudos. Porém, seria uma alternativa útil, já que usar doses menores desse medicamento pode ser uma maneira de impedir que ele perca a eficácia;, detalha a autora.

Para Leandra Sá de Lima, farmacêutica e consultora da Farmacotécnica, em Brasília, os resultados são animadores, mas ela também ressalta a necessidade de mais investigações até que a solução se torne uma realidade comercial. ;Acredito que essa seja uma saída muito interessante na área da saúde. Entretanto, usualmente, leva-se muito tempo para que os testes sejam concluídos. O trabalho foi feito com um extrato um pouco diferente do produto usado comumente na alimentação. Para chegar ao mercado, ainda demanda muito tempo de estudo. Mas é algo bastante promissor;, ressalta a especialista, que não participou do estudo.

Prioridade científica


São patógenos resistentes à ação dos antibióticos, principalmente pelo uso incorreto dos medicamentos. Em fevereiro, a Organização Mundial da Saúde (OMS) publicou uma lista dos micro-organismos com essas características que, segundo a agência das Nações Unidas, devem ser prioridade nas pesquisar por novos remédios contra esses micróbios. A lista inédita é dividida em três grupos de prioridade: crítica, alta e média. Fazem parte da mais urgente as bactérias Acinetobacter baumannii (que afeta principalmente as vias respiratórias e o trato urinário), Pseudomonas aeruginosa (uma recorrente causa de infecções hospitalares) e Enterobacteriaceae (responsável por complicações como pneumonia, meningite e gastroenterite).

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