A análise da fibra capilar, uma ferramenta forense com passado questionável, poderá, em breve, ser utilizada para a polícia rastrear suspeitos. A técnica passou por um refinamento e será capaz de revelar com acurácia dados sobre idade, sexo, massa corporal, além de hábitos dietéticos e de exercícios físicos. ;Quem você é, onde você esteve, o que você come e quais drogas você toma ; tudo isso está no seu cabelo;, diz Glen P. Jackson, químico forense da Universidade de West Virgínia (EUA). ;Dependendo da pergunta que se faz, a análise química do cabelo humano pode fornecer pistas incríveis sobre a vida e o estilo de vida de uma pessoa.; O trabalho de Jackson foi apresentando ontem, no encontro anual da Sociedade Norte-Americana de Química.
Por muito tempo, a análise forense do cabelo foi o principal pilar das investigações criminais e nos tribunais. A técnica consiste no exame microscópico da cor, da espessura e da curvatura dos fios para identificar suspeitos e associá-los a cenas de crimes. Contudo, críticos argumentavam que essa era uma avaliação subjetiva e que os especialistas superestimavam sua confiabilidade. De fato, uma revisão recente conduzida pelo Departamento de Justiça dos Estados Unidos descobriu que 90% dos testemunhos baseados no exame de cabelo em julgamentos criminais continham erros.
Atualmente, o padrão ouro dos casos criminais é o teste de DNA. Contudo, Jackson diz que cabelos encontrados nas cenas do crime geralmente não têm material genético suficiente para análise. E, mesmo se tivessem, uma amostra correspondente pode não ser encontrada nos bancos de dado da polícia. Além disso, o DNA fornece somente um perfil genético do suspeito, não revelando nada sobre o estilo de vida da pessoa, o que pode ser a chave para a solução de um crime. ;Se você tem gêmeos idênticos e um é obeso e outro é magro, podemos diferenciá-los pelo cabelo, com nosso método;, explica o especialista.
Queratina
Jackson decidiu cavar mais fundo na composição química do cabelo para ver se é possível desenvolver uma técnica rigorosamente científica para identificar certas características de estilo de vida de suspeitos e suas vítimas. Usando cromatografia líquida com espectrometria de massa, os pesquisadores mediram a razão de isótopos (átomos do mesmo elemento que têm números diferentes de nêutrons) de 21 aminoácidos encontrados na queratina, o principal componente do cabelo. O método não é tão difícil de ser conduzido por um técnico e, atualmente, é cada vez mais comum em laboratórios forenses.
Com a abordagem, a equipe do pesquisador identificou 15 isótopos que potencialmente dão informações cruciais sobre alguns hábitos individuais. Para testar a possibilidade, os cientistas coletaram amostras de 20 mulheres. Antes da avaliação, elas responderam a um questionário que continha dados sobre saúde, cuidados pessoais e dieta. Sem saber a quem pertenciam os fios de cabelo, os profissionais foram capazes de predizer o índice de massa corporal de cada uma delas com 80% de acurácia. Recentemente, eles conduziram um estudo similar entre 20 homens e mulheres e identificaram o sexo corretamente em 90% dos casos.
Embora a abordagem seja promissora, Jackson diz que é preciso mais trabalho antes que ela seja usada em laboratórios forenses. A equipe precisa refinar a metodologia. Por enquanto, a análise requer diversos fios de uma mesma pessoa, o que dificulta o uso no dia a dia, quando, geralmente, apenas um fio está disponível. Mas se essa questão for resolvida, a técnica poderá ser uma ferramenta complementar ao DNA, preenchendo os vazios que, sozinho, o material genético não consegue explicar.
90%
Índice de precisão na identificação do sexo em estudo conduzido com 20 participantes