Jornal Correio Braziliense

Ciência e Saúde

Maior presença de CO2 na atmosfera pode aumentar turbulências, diz estudo

A maior emissão de gás carbônico provoca diferenças de temperatura entre as camadas de ar, aumentando a probabilidade de ocorrência do fenômeno

Usando simulações feitas em supercomputadores, pesquisadores britânicos analisaram o efeito do aumento da concentração de CO2 na atmosfera nas áreas de turbulência de céu claro, que não podem ser detectadas atualmente. A maior emissão de gás carbônico provoca diferenças de temperatura entre as camadas de ar, aumentando a probabilidade de ocorrência do fenômeno.

Para os investigadores, até meados deste século, as turbulências severas devem aumentar cerca de 150%, as moderadas, 94% e as leves, 59%. ;A severa é formada quando há uma diferença de velocidade grande o suficiente entre duas camadas de ar;, explica Paul Williams, principal autor do estudo e pesquisador da Universidade de Reading, no Reino Unido. ;Por exemplo, quem já subiu a Torre Eiffel sabe que, geralmente, não há muito vento ao nível do chão, um vento moderado no meio e muito vento no seu topo. Esse gradiente de ventos ocorre até cerca de 10 quilômetros de altura.;

As turbulências leves são comuns e não causam transtornos: é possível andar e realizar o serviço de bordo normalmente enquanto elas ocorrem. As moderadas podem deslocar objetos e dificultar os movimentos da tripulação. Por isso, ;o sinal para atar os cintos é aceso pelos pilotos e o serviço de bordo, suspenso;, explica Williams. ;Já a turbulência severa é mais forte do que a gravidade. Passageiros e tripulação sem cinto podem ser arremessados dentro da aeronave, com ferimentos sérios.;

Fluxo caótico

Williams detalha que o aumento da diferença de temperatura entre as camadas de ar significa que elas estão fluindo umas sobre as outras. Se a mudança for muito grande, a atmosfera não consegue mais conter o fluxo de ar entre as camadas, e a situação fica instável. ;Quaisquer irregularidades pequenas nesse fluxo crescem exponencialmente e se tornam caóticas e turbulentas;, diz.


Por ocorrer em uma atmosfera limpa, sem nuvens, atualmente é impossível detectar esse tipo de turbulência, e ela pode pegar passageiros e tripulação desprevenidos. ;Os radares detectam partículas de água e gelo na atmosfera;, diz Ivan Bitar, meteorologista e piloto comercial. ;Por isso, a turbulência de céu claro é invisível.;

Segundo o especialista, porém, tecnologias recentes podem diminuir o efeito dessa turbulência. ;Existem agora os índices de turbulência, equações físicas e matemáticas adicionadas a modelos de previsão do tempo que podem ajudar a prevê-las. E há até um radar em desenvolvimento para detectar esse tipo de evento;, conta.

As simulações lideradas por Williams tiveram como modelo voos realizados sobre o Atlântico Norte durante o inverno. Apesar dos cenários específicos, os resultados poderão se confirmar em outras partes do mundo. ;Acredito que todas as regiões de latitude média serão afetadas em maior ou menor escala por essas mudanças;, afirma o pesquisador. ;Estamos trabalhando atualmente nos longos cálculos para outras rotas, além de outras estações do ano, e esperamos poder compartilhar mais resultados no ano que vem.;

Fluxo caótico

Williams detalha que o aumento da diferença de temperatura entre as camadas de ar significa que elas estão fluindo umas sobre as outras. Se a mudança for muito grande, a atmosfera não consegue mais conter o fluxo de ar entre as camadas, e a situação fica instável. ;Quaisquer irregularidades pequenas nesse fluxo crescem exponencialmente e se tornam caóticas e turbulentas;, diz.

Por ocorrer em uma atmosfera limpa, sem nuvens, atualmente é impossível detectar esse tipo de turbulência, e ela pode pegar passageiros e tripulação desprevenidos. ;Os radares detectam partículas de água e gelo na atmosfera;, diz Ivan Bitar, meteorologista e piloto comercial. ;Por isso, a turbulência de céu claro é invisível.;

Segundo o especialista, porém, tecnologias recentes podem diminuir o efeito dessa turbulência. ;Existem agora os índices de turbulência, equações físicas e matemáticas adicionadas a modelos de previsão do tempo que podem ajudar a prevê-las. E há até um radar em desenvolvimento para detectar esse tipo de evento;, conta.

As simulações lideradas por Williams tiveram como modelo voos realizados sobre o Atlântico Norte durante o inverno. Apesar dos cenários específicos, os resultados poderão se confirmar em outras partes do mundo. ;Acredito que todas as regiões de latitude média serão afetadas em maior ou menor escala por essas mudanças;, afirma o pesquisador. ;Estamos trabalhando atualmente nos longos cálculos para outras rotas, além de outras estações do ano, e esperamos poder compartilhar mais resultados no ano que vem.;


Referência histórica

O estudo afirma que os aumentos ocorrerão quando a concentração de CO2 na atmosfera atingir o dobro do que foi estimado para antes da revolução industrial, ou seja, antes da poluição em larga escala. Segundo o artigo Global Climate Projections, divulgado em 2007 no Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima (IPCC), isso acontecerá em meados deste século.

Exposição à radiação deve aumentar

Há perigos para a aviação que podem vir até mesmo de fora do espaço aéreo terrestre. Segundo estudo japonês publicado, no mês passado, na versão on-line da revista Space Weather, o enfraquecimento da atividade solar previsto para os próximos anos poderá aumentar a exposição de pilotos, passageiros e comissários de bordo à radiação. A partir de um modelo do campo magnético do Sol, os pesquisadores concluíram que as tripulações estarão sujeitas a um aumento de 20% na dose média anual de radiação à qual estão expostas, em comparação ao último mínimo solar, ocorrido em 2008.

Por causa da grande altitude, os voos comerciais expõem tripulantes e passageiros a doses altas da radiação cósmica, presente no espaço, e que se origina em supernovas, buracos negros e outros eventos de grande porte do universo. Quando a atividade solar diminui, o que acontece em ciclos de aproximadamente 11 anos, há um enfraquecimento do campo magnético do Sol, responsável por bloquear parte da radiação cósmica. O novo ciclo está previsto para começar entre 2019 e 2020, e o período de baixa atividade pode durar até cinco anos.

A exposição individual à radiação depende de quanto tempo uma pessoa passa em voo. Se alguém ficasse um ano inteiro dentro de um avião comercial, receberia uma dose de 65 miliSieverts (mSv), segundo o estudo. No começo do último ciclo solar, a dose estimada foi de 56 mSv e de 45 mSv durante o pico de atividade. Conforme a Comissão Nacional de Energia Nuclear, órgão brasileiro que regula o uso da energia nuclear no país, a exposição recomendada para trabalhadores expostos à radiação é de menos de 20 mSv por ano.

Sem alarde

Ainda assim, Ryuho Kataoka, coautor do estudo e físico do espaço no Instituto Nacional de Pesquisa Polar em Tachikawa, no Japão, ressalta que não há motivos para alarde. ;Eu não acho que os resultados indiquem um risco sério à saúde;, disse. O pesquisador afirma que, como os tripulantes não passam um ano inteiro dentro de um avião, as doses reais de radiação recebidas serão menores do que as estimadas pelo estudo. ;Porém, as tripulações e os passageiros mais frequentes, que chegam perto do limite de radiação anual, devem se atentar a esse aumento;, alerta.


PARA SABER MAIS

Impacto na duração dos voos


O aumento das turbulências não é o único efeito das mudanças climáticas sobre a aviação. Segundo estudo publicado também por Paul Williams, em fevereiro do ano passado, no IOP Publishing, o aumento na força dos ventos sobre o Oceano Atlântico tem afetado a duração das viagens. ;Os voos em direção ao leste estão ficando mais rápidos por causa dos ventos a seu favor, enquanto aqueles em direção ao oeste estão ficando mais longos;, explicou, à época, o pesquisador.

O estudo exemplifica que o trajeto entre Nova York e Londres terá maior probabilidade de durar menos de cinco horas e 20 minutos, enquanto os voos contrários, mais de sete horas. No geral, estima-se que as aeronaves transatlânticas ficarão 2.000 horas a mais no ar por ano, emitindo mais 70 mil toneladas de gás carbônico na atmosfera. ;O setor de aviação está enfrentando pressão para reduzir seus impactos ambientais, mas esse estudo mostra uma nova forma em que a aviação é, em si própria, suscetível aos efeitos da mudança climática;, observou Williams.

* Estagiário sob a supervisão de Carmen Souza