Ciência e Saúde

Aquecimento global tem aumentado a quantidade de noites maldormidas

Idosos e pessoas de baixa renda são os maiores afetados

Vilhena Soares
postado em 27/05/2017 08:00
As mudanças climáticas têm provocado o aumento da temperatura de forma global, castigando extremamente o meio ambiente. Dentro das casas também há prejuízos. Pessoas podem ter a qualidade do sono comprometida pelo desequilíbrio nos termômetros. É o que mostram cientistas da Universidade da Califórnia em um estudo com 765 mil norte-americanos. Para a equipe, o resultado do trabalho, divulgado na última edição da revista Science Advances, serve de alerta para os impactos pouco usuais na saúde pública e para a necessidade de estratégias que impeçam o agravamento do fenômeno ambiental.

Outubro de 2015 foi um dos meses mais quentes da cidade americana de San Diego. Os problemas gerados ao sono da população nesse período motivaram a investigação científica. ;Nossos amigos e colegas de pesquisa não dormiam bem à noite, era muito desagradável. Na época, eu estava trabalhando na análise de impactos gerados pelas mudanças climáticas em humanos. Nós investigamos e vimos que ninguém tinha examinado interrupções do sono como uma implicação potencial da mudança de clima;, conta ao Correio Nick Obradovich, pesquisador da Universidade da Califórnia e um dos autores do estudo.

Os cientistas analisaram dados de 765 mil norte-americanos coletados entre 2002 e 2011. O grupo havia respondido a um questionário da Pesquisa de Vigilância de Fator de Risco Comportamental, realizada pelos Centros de Controle e Prevenção de Doenças, que tinha perguntas sobre a qualidade do sono. Os investigadores compararam as noites em que os entrevistados relataram ter dormido mal com o registro da temperatura nelas e detectaram uma relação entre as noites maldormidas e as noites mais quentes do país.

Temperaturas noturnas que estavam 1;C acima da média provocaram ao menos três noites maldormidas para cada 100 indivíduos no período de um mês. ;O que o nosso estudo mostra não é apenas que a temperatura ambiente pode desempenhar um papel na interrupção do sono, mas também que a mudança climática pode agravar a situação, aumentando as taxas de perda de sono;, ressalta Obradovich.

Ar-condicionado

Os efeitos do aumento da temperatura sobre o sono não foram distribuídos uniformemente nos grupos analisados. Pessoas com renda inferior a US$ 50 mil e idosos com ao menos 65 anos foram afetados mais severamente. No caso da idade, o impacto foi duas vezes maior que o registrado nos adultos mais jovens. Para o grupo de baixa renda, três vezes pior do que entre os indivíduos com melhor situação financeira. ;As pessoas podem lidar com temperaturas excepcionalmente quentes aumentando a compra e o uso de ar-condicionado. Infelizmente, nas partes mais pobres do mundo, o acesso a esse equipamento é escasso;, justifica Obradovich.

Neurologista do Hospital Brasília e não participante do estudo, Arthur Sousa conta que, de uma forma geral, os idosos têm mais problemas para dormir. ;Não se sabe ao certo as razões, mas acreditamos que isso pode estar relacionado a algum desequilíbrio do organismo que influencie a regulação do sono. Talvez, ele seja até provocado por alguma doença;, cogita. ;Já sabemos que pessoas que conseguem manter a temperatura abaixo de 40;C conseguem dormir melhor. Essa relação é algo importante de ser abordada, já que as previsões são de que as temperaturas aumentem ainda mais;, complementa.

A equipe norte-americana também reforça a importância de o fenômeno ser mais estudado e discutido, até pelos prejuízos que vão além das noites perdidas. ;O sono tem sido bem estabelecido por outros pesquisadores como um componente crítico da saúde humana. Pouco sono pode fazer uma pessoa mais suscetível a doenças crônicas e prejudicar o bem-estar psicológico e o funcionamento cognitivo;, alerta Obradovich. Arthur Sousa percebe essas complicações no consultório. ;Um terço da população enfrenta problemas para dormir, e isso é algo preocupante, já que esses danos podem provocar problemas de saúde cardiovascular e diabetes, entre outros. Tenho muitos pacientes que me procuram e apresentam problemas cognitivos por causa do sono;, relata o neurologista.

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