Jornal Correio Braziliense

Ciência e Saúde

Evolução dos hominídeos nem sempre ocorreu de forma simultânea

Ao longo da história do gênero Homo, ancestrais aumentaram a massa corporal e a estatura, mas nem sempre essa evolução aconteceu de forma simultânea. Em alguns períodos, os hominídeos só engordaram, enquanto, em outros, ficaram mais altos, sem ganhar quilos



;A maior relação superfície/volume de um corpo alto e delgado seria uma vantagem ao perseguir animais durante horas no calor e na secura, uma vez que uma área de pele maior aumenta a capacidade de evaporação do suor;, explica Manuel Will. ;A adição posterior de massa corporal coincide com migrações cada vez maiores em latitudes mais altas, onde um corpo mais volumoso seria mais adequado para a termorregulação em climas eurasianos mais frios;, complementa. No entanto, o cientista ressalta que, enquanto essas são teorias válidas, ainda há grandes lacunas no registro fóssil dos ancestrais humanos, o que pode mascarar a realidade. Ele explica que, para estimar o tamanho e o peso dos restos mortais extremamente fragmentados, muitas vezes se valia de um único dedo do pé.

Momentos-chaves

O estudo descobriu que as medidas corporais foram altamente variáveis durante a história dos hominídeos, com espécies passando por processos bastante distintos: do Paranthropus, largo e parecido com gorila, ao Australopithecus afarensis, mais magro e franzino. Havia quatro milhões de anos, os ancestrais pesavam, em média, 25kg, e mediam entre 125-130cm. À medida que o tempo foi passando, os corpos foram ficando cada vez maiores, sendo que há três momentos-chaves de mudantas significativas.

O primeiro ocorre com o alvorecer do grupo de espécies ao qual o homem moderno pertence, o gênero Homo, cerca de 2,1 milhões a 1,1 milhão de anos anos atrás. Nesse período, há uma onda conjunta de avanço na altura (cerca de 20cm) e no peso (entre 15-20kg). A estatura, então, começa a evoluir separadamente do peso, com um aumento de 10cm entre 1,4 milhão e 1,6 milhão de anos atrás, logo após o surgimento do Homo erectus. A massa corporal, contudo, se manteve. ;De uma perspectiva moderna, é aqui que vemos uma estatura que nos é familiar alcançada e mantida. A massa corporal, no entanto, ainda está longe de parecer a de hoje;, explica Will.

Não é até um milhão de anos depois (0,5 milhão a 0,4 milhão de anos atrás) que hominídeos consistentemente mais pesados aparecem nos registro fósseis, com uma estimativa de 10-15kg de ganho de massa corporal, um sinal de adaptação para ambientes ao norte do Mediterrâneo. ;A partir de então, a altura e o peso médios do corpo permanecem mais ou menos os mesmos na linhagem hominínea, o que leva, em última instância, a nós mesmos;, diz Will.

Há, no entanto, algumas exceções nessa grande narrativa: o Homo naledi e Homo floresiensis. Evidências fósseis recentemente descobertas sugerem que essas espécies nadaram contra a maré. ;Elas podem ter derivado de ancestrais muito pequenos e mais antigos ou se adaptado às pressões evolutivas que ocorrem em populações pequenas e isoladas;, sugere o especialista. ;Nosso estudo mostra que, além dessas duas espécies, os hominídeos que aparecem após 1,4 milhão de anos são todos maiores que 140cm e 40kg. Isso não muda até que os corpos humanos se diversifiquem novamente nos últimos mil anos;, informa.

O arqueólogo também diz que os fósseis analisados também sugerem que o dimorfismo sexual ; a distinção física entre gêneros, com as fêmeas de mamíferos tipicamente menores que os machos ; foi mais prevalente nas primeiras espécies de hominídeos, mas, depois, foi praticamente descartada pela evolução.

O coautor do estudo, Jay Stock, também do Departamento de Arqueologia de Cambridge, sugere que essa trajetória de crescimento pode continuar. ;Muitos grupos humanos continuaram a ficar mais altos ao longo do século passado. Com uma melhor nutrição e cuidados de saúde, as taxas médias provavelmente continuarão a crescer no futuro próximo. No entanto, certamente existe um limite máximo de nossos genes que definem nosso potencial máximo para o crescimento;, afirma.

;O tamanho do corpo é um dos determinantes mais importantes da biologia de cada organismo no planeta;, acrescenta Will. ;Reconstruir a história evolutiva das nossas medidas tem o potencial de nos fornecer informações sobre o desenvolvimento da locomoção, da complexidade do cérebro, de estratégias de alimentação e até mesmo sobre nossa vida social.;