Paloma Oliveto
postado em 14/11/2017 06:00
No ano mais quente já registrado no planeta, um balde de água gelada desabou sobre Bonn, na Alemanha, onde se reúne a 23; Conferência do Clima das Nações Unidas (COP-23). O balanço anual do Projeto Carbono Global, iniciativa que envolve cientistas de várias partes do mundo, mostrou que, depois de três anos de estabilidade, as emissões de CO2 provenientes da queima de combustível fóssil e da indústria devem aumentar em 2017, atingindo um recorde de 36,8 bilhões de toneladas. O trabalho, publicado nas revistas Nature Climate Change, Environmental Research Letters e Earth System Science Data, revelou um aumento projetado em 2%.
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Dizendo-se decepcionada com os resultados, uma coautora do estudo, Corinne Le Quéré, da Universidade de East Anglia, afirmou que o balanço reforça a necessidade de se ;atuar com mais resolução;. ;É uma grande decepção. Com a estimativa de 41 bilhões de toneladas de CO2 emitidas em 2017 (acrescentando o desmatamento), pode faltar tempo para manter a a elevação da temperatura abaixo de 2 graus Celsius, e menos ainda de 1,5 ;C;, advertiu a especialista, referindo-se ao Acordo de Paris, costurado há dois anos na capital francesa. ;Temos que esquecer qualquer autocomplacência;, disse Le Quéré. De acordo com ela, para alcançar o objetivo, seria necessário que as emissões alcançassem o pico nos próximos anos ; coisa que não ocorreu ; e diminuíssem rapidamente em seguida.
O estudo também mostrou que, em 22 países, houve queda das emissões. Foi o caso dos Estados Unidos, que registrou -0,4% de produção de gases de efeito estufa. Os autores do trabalho destacaram, porém, que essa não é uma notícia boa, contudo. O decréscimo norte-americano foi menor que os registrados de 2014-2016 (média de -1,2%) e, na contramão do que diz o Acordo de Paris, o consumo de carvão deve aumentar 0,5%, devido à escassez de gás natural. Será a primeira vez em cinco anos que o país elevará o uso de combustível fóssil.
Vice-presidente do Projeto Carbono Global e professor da Universidade de Stanford, o coautor do trabalho Robert Jackson afimou que, apesar de Donald Trump e do incentivo que o presidente quer dar à indústria dos combustíveis fósseis, há razões para ser ;cautelosamente otimista; em relação à transição norte-americana para uma energia limpa. ;O governo federal pode desacelerar o desenvolvimento de tecnologias renováveis e de baixo carbono, mas não pode parar com isso. A transição está sendo conduzida por nova infraestrutura de baixo custo, com o incentivo dos consumidores;, disse.
Oscilações chinesas
No Brasil, o Orçamento de Carbono Global 2017 projetou um declínio discreto, de 0,04%, nas emissões de gases de efeito estufa, mas o trabalho destaca que isso deve ocorrer, provavelmente, devido à crise econômica. Um estudo recente da rede Observatório do Clima mostrou que, em 2016, as emissões totais no país aumentaram 8,9% (2,278 bilhões de toneladas brutas de gás carbônico equivalente (CO2e), contra 2,091 bilhões em 2015), puxadas pelo desmatamento da Amazônia.
Maior poluidor mundial, com 28% das emissões de gases de efeito estufa, a China reduziu o uso de carvão nos últimos anos e registrou queda entre 2014 e 2016, mas voltará a aumentar a produção de CO2 neste ano, diz o relatório global. ;A China gera quase 30% das emissões globais e os altos e baixos da economia chinesa deixam uma assinatura no crescimento das emissões do planeta;, ressaltou Jan Ivar Korsbakken, pesquisador sênior do Centro Cicero de Pesquisa Climática Internacional de Oslo, na Noruega, e coautor do trabalho. ;As emissões chinesas caíram cerca de 1% em 2015 e ficaram estáveis em 2016, mas estão projetadas para aumentar de 0,7% a 5,4% em 2017. Ainda não sabemos se esse crescimento é um evento isolado;, afirmou o pesquisador.
As concentrações de dióxido de carbono na atmosfera atingiram os recordes mais dramáticos devido às altas emissões, combinadas com o evento climático El Niño, destacou o relatório. Em 2017, espera-se um aumento de 2,5 partes por milhão, maior que a média da última década. ;A temporada 2015/2016 do El Niño provocou condições quentes e secas nos trópicos que reduziram o sequestro de carbono pelas florestas e levaram a um aumento recorde nas concentrações de CO2 na atmosfera;, disse Corinne Le Quéré. ;Embora as emissões tenham crescido em 2017, esperamos um crescimento menor nas emissões, agora que o El Niño terminou;, afirmou Glen Peters, pesquisador do Cicero.
De acordo com os especialistas, ainda há dificuldades para estimar mudanças nas emissões de dióxido de carbono e gases equivalentes, particularmente quando ocorrem mudanças inesperadas ; caso da China, por exemplo. ;Quando há alterações inesperadas nas emissões ou nas concentrações atmosféricas, surgem questões sobre nossa habilidade de verificar de forma independente as emissões reportadas;, observa Peters.