Ciência e Saúde

Cientistas descobrem que mão dominante é definida ainda no útero da mãe

Na 18ª semana da gestação, o feto começa a trabalhar sua lateralidade predominante, segundo pesquisa italiana. O resultado poderá ajudar no combate precoce a distúrbios caracterizados por assimetrias no cérebro, como o autismo e o Parkinson

Vilhena Soares
postado em 13/12/2017 06:00
mãe acaricia barriga grávida mão dominante

A mão que uma pessoa utilizará com maior frequência nas tarefas cotidianas, como escrever e pegar objetos, é determinada ainda na barriga da mãe. Mais precisamente na 18; semana de gestação, segundo uma pesquisa italiana. Os investigadores chegaram a essa conclusão após analisar o desenvolvimento de 29 fetos por meio de uma técnica avançada de imageamento. Segundo eles, a descoberta poderá auxiliar na identificação precoce de problemas caracterizados por assimetrias cerebrais, como o Parkinson e o autismo. Os achados foram publicados na revista americana Scientific Reports.

A equipe partiu de resultados de estudos anteriores em que se buscou maneiras de identificar pistas relacionadas a possíveis problemas de saúde em bebês antes do parto. ;Pesquisas mostraram que a frequência de movimentos fetais realizados com a mão direita ou a esquerda (em particular, o ato de sugar o polegar) poderiam ser observados por meio de técnicas de imagem e que, talvez, esse tipo de avaliação seria um bom preditor de danos pós-natal;, conta ao Correio Valentina Parma, pesquisadora da Escola Internacional de Estudos Avançados (SISSA, em italiano) e autora do novo estudo.

No experimento, Parma e sua equipe, em parceria com cientistas da Universidade de Pádua e do Centro Lincean Beniamino Segre, em Roma, estudaram toda a gestação de 29 fetos. ;Nos concentramos na dominância das mãos, analisamos o padrão de velocidade aumentada e quais eram os seus alvos;, detalha a autora. Após nove anos, os investigadores compararam as previsões de lateralidade dominante construídas a partir dos exames de imagem com a preferência mostrada pelos mesmos meninos e meninas. A precisão foi de ao menos 89%.

Ao longo da gravidez das mães, análises mais apuradas dos fetos foram feitas durante a 14;, a 18; e a 22; semanas por meio de uma ecografia 4D, que permite a visualização da imagem tridimensional em tempo real e em movimento. Cada sessão do exame durou até 20 minutos. Os investigadores consideraram principalmente três tipos de movimentos: dois de maior precisão, direcionados aos olhos e à boca, e um direcionado à parede uterina.


Pelos detalhes percebidos, a equipe conseguiu identificar o período exato em que ocorreu a determinação da dominância da mão dos bebês. ;Os resultados mostraram que, a partir da 18; semana, os fetos executam significativamente mais rapidamente os movimentos que requerem precisão, o que se tornará a mão preferida;, explica Valentina Parma.

Esse processo, segundo a cientista, mostra o elevado nível de maturação e especialização do sistema motor já no útero. Ela destaca ainda que a precisão do método utilizado poderá trazer novas perspectivas para o uso das constatações no campo clínico, já que a preferência das mãos ocorre devido à prevalência de um hemisfério cerebral sobre o outro. ;Essa característica já foi associada, algumas vezes, a patologias que envolvem uma assimetria cerebral, como depressão, esquizofrenia e distúrbios do espectro autista;, explica Parma.

Aplicação médica


Dessa forma, a observação dos fetos poderia ser usada, por exemplo, para identificar novos marcadores, o que permitiria uma intervenção precoce contra a doença. ;Considerando a precisão que tivemos com essa análise inicial e que ela pode identificar fatores da vida pós-natal, esperamos que esse seja um caminho para procurar os marcadores motores de transtornos nos quais as questões de lateralização do cérebro são evidentes. Doenças do espectro do autismo e esquizofrenia podem ser modelos candidatos;, ressalta Parma. ;O próximo passo que consideramos é exatamente essa aplicação médica: usando o estudo do movimento no útero para avaliar inicialmente a presença de distúrbios do desenvolvimento.;

[SAIBAMAIS]Cláudio Roberto Carneiro, coordenador de Neurologia do Hospital Santa Lúcia, em Brasília, e membro titular da Sociedade Brasileira de Neurologia (SBN), avalia que a pesquisa se destaca pela eficácia do método usado. ;Por meio dessa análise cerebral, podemos ver se a pessoa será destra ou canhota, mas o mais importante é que essa tecnologia poderia ser usada, posteriormente, para analisar possíveis traumas, como o Parkinson e a epilepsia, e prever a ocorrência dessas doenças;, diz.

Apesar dos resultados promissores da pesquisa italiana, o especialista ressalta que ainda é cedo para determinar se os achados poderão ser usados na área médica ;É necessário fazer mais análises, pois ainda temos poucos dados, e saber quais doenças poderiam ser vistas com essa tecnologia, além de pensar em quais melhoras poderão surgir com o uso dessa técnica;, justifica Carneiro.

"Esperamos que esse seja um caminho para procurar os marcadores motores de transtornos nos quais as questões de lateralização do cérebro são evidentes. Doenças do espectro do autismo e esquizofrenia podem ser modelos candidatos;, Valentina Parma, pesquisadora da Escola Internacional de Estudos Avançados e autora do novo estudo

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