Ciência e Saúde

Médicos da USP usam smartphones para cirurgias no cérebro

A nova opção os custos são reduzidos ao preço de um iPhone - a marca de smartphone utilizada no estudo - e do adaptador que integra o endoscópio ao celular, que custa cerca de R$ 1 mil

Agência Estado
postado em 13/03/2018 17:55
Uma equipe de médicos brasileiros demonstrou que smartphones podem facilitar e baratear as neurocirurgias. Os pesquisadores, do Hospital das Clínicas (HC) da Universidade de São Paulo (USP) adaptaram smartphones ao endoscópio - o instrumento utilizado para observar o interior do organismo. O novo recurso foi descrito em um artigo publicado nesta terça-feira, (13/3), na principal revista científica internacional de neurocirurgia, Journal of Neurosurgery.

[SAIBAMAIS]A neuroendoscopia é um procedimento neurocirúrgico pouco invasivo utilizado em alguns casos para corrigir hidrocefalia, remover tumores, tratar doenças vasculares e outros problemas no cérebro. No novo estudo, os cientistas demonstraram a aplicação do novo recurso em neurocirurgias realizadas em 42 pacientes no HC.

De acordo com o autor principal do estudo, Maurício Mandel, do HC-USP e do Hospital Israelita Albert Einstein, a ideia inicial era apenas baratear os procedimentos de neuroendoscopia, mas o recurso acabou mostrando diversas vantagens em relação aos métodos convencionais.

Segundo ele, um sistema de neuroendoscopia custa de R$ 200 mil a R$ 300 mil. A nova opção os custos são reduzidos ao preço de um iPhone - a marca de smartphone utilizada no estudo - e do adaptador que integra o endoscópio ao celular, que custa cerca de R$ 1 mil.

"Com essa redução de custos, é muito provável que esse recurso possa ser utilizado no SUS, em várias escalas, com aplicação em outros tipos de cirurgia. Mas ao desenvolver o novo sistema, descobrimos que o trabalho do cirurgião também se torna mais seguro e mais simples", disse Mandel ao jornal O Estado de S. Paulo.

De acordo com Mandel, com o método convencional, o cirurgião introduz um neuroendoscópio em uma pequena incisão no crânio, no nariz ou no céu da boca do paciente. O neuroendoscópio inclui uma fonte de luz para iluminar o campo de cirurgia, lentes de aumento e uma câmera, que envia as imagens a um monitor na sala de operação, além de canais para inserção de instrumentos cirúrgicos.

"Com o smartphone, o cirurgião não precisa virar a cabeça para olhar o monitor. Em vez disso, ele utiliza o celular como uma tela de alta definição bem na frente do endoscópio. Com isso, ganhamos a enorme vantagem de podermos olhar para o campo cirúrgico enquanto trabalhamos. Isso facilita a manobra do equipamento, porque a tela se move junto com o endoscópio, tornando o procedimento muito mais intuitivo e seguro", explicou Mandel.

Além disso, segundo Mandel, o método permite gravar e transmitir em tempo real - por wi-fi ou bluetooth - todas as imagens da neurocirurgia. Elas podem ser enviadas, por exemplo, a um monitor onde outros cirurgiões podem acompanhar o procedimento. "Com o celular acoplado, temos a possibilidade de transmitir a cirurgia ao vivo para um colega em qualquer parte do mundo."

"O recurso abre portas para algumas possibilidades que nem imaginamos ainda. Às vezes, na medicina, há casos difíceis ou raros que mesmo um cirurgião muito experiente pode nunca ter encontrado em sua carreira. Se temos a oportunidade de compartilhar a cirurgia ao vivo com um colega mais experiente, isso pode ser muito bom para os pacientes", disse Mandel.

Recurso pedagógico


Segundo Mandel, o estudo descreve o uso do smartphone adaptado ao neuroendoscópio em cirurgias realizadas em 42 pacientes, mas a equipe do HC já utilizou o recurso em mais de 150 casos - incluindo tratamento para hidrocefalia, aneurismas e a retirada de hematomas provocados por trauma. De acordo com ele, como todos os passos da cirurgia são gravados, o conteúdo está sendo utilizado também para fins pedagógicos.

"Mostramos também no estudo que a integração de smartphone e neuroendoscópio proporcionou que nossos residentes aprendessem muito mais rápido a realizar neurocirurgias."

O acoplador utilizado pelos pesquisadores para integrar smartphone e neuroendoscópio já existia no mercado e era utilizado especialmente para facilitar a entubação de pacientes. "Tivemos a ideia de utilizar o acoplador para a neurocirurgia. Foi preciso fazer algumas adaptações", contou Mandel.

Durante as cirurgias descritas no estudo, os pesquisadores utilizaram iPhones modelos 4, 5 e 6, combinados com diversos tipos de neuroendoscópios. As imagens foram enviadas por Wi-Fi diretamente a um monitor de vídeo que permaneceu na sala de operação, para o caso de ser necessário utilizar o procedimento convencional. Mas não foi preciso recorrer ao monitor externo nenhuma vez.

Todas as cirurgias foram bem sucedidas e não houve nenhum tipo de complicação relacionada ao uso do smartphone, de acordo com o estudo. Uma das conclusões do artigo é que o baixo custo do novo recurso permite sua utilização em áreas onde a infraestrutura médica não é suficiente para a aquisição e manutenção de equipamentos caros.

Além de Mandel, os demais autores do artigo são Carlo Emanuel Petito e Rafael Tutihashi, também do HC-USP e do Hospital Albert Einstein, Wellingson Paiva, Fernando Gomes Pinto, Almir Ferreira de Andrade, Manoel Jacobsen Teixeira e Eberval Gadelha Figueiredo - todos do HC-USP - e Suzana Abramovicz Mandel, do Hospital Albert Einstein.

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