Ciência e Saúde

Área do cérebro é responsável por ingestão excessiva de alimentos calóricos

Diminuir a atividade mental em área ligada ao autocontrole aumenta a ingestão de alimentos calóricos, mostra estudo canadense com 28 voluntárias. A descoberta poderá ajudar na criação de tratamentos contra a obesidade e a bulimia

Vilhena Soares
postado em 01/09/2018 07:00
Ilustração de homem pensando em comida

Um dos maiores esforços de cientistas é encontrar maneiras de evitar o consumo de alimentos calóricos e, de quebra, as consequências geradas por esse hábito. Seguindo esse objetivo, pesquisadores canadenses descobriram que o uso da estimulação magnética transcraniana (EMT) aumenta temporariamente o desejo por alimentos gordurosos em humanos. Segundo eles, o resultado do experimento feito com mulheres aprofunda o conhecimento sobre os mecanismos cerebrais ligados a complicações como obesidade e compulsão alimentar e poderá ajudar no desenvolvimento de abordagens terapêuticas.

Participaram da pesquisa 28 jovens saudáveis, mas que relatavam sentir desejo frequente por consumir alimentos com alto teor calórico. Quando, usando a EMT, foi diminuída temporariamente a atividade no córtex pré-frontal dorsolateral ; a rede cerebral responsável pelo autocontrole ;, 89% das participantes passaram a consumir mais alimentos calóricos, se comparado ao resultado das sessões de estimulação placebo.

As mulheres também foram convidadas a avaliar uma série de refeições após serem submetidas à EMT. A maioria classificou lanches altamente calóricos de forma positiva, prestou mais atenção a imagens atraentes desses alimentos e relatou impulsos maiores para comê-los. ;Isso resultou também em mais consumo quando lhes foi dada a oportunidade de experimentá-los;, complementa Peter Hall, professor na Universidade de Waterloo e um dos autores do estudo.

Hall conta que ele e a equipe têm estudado os processos cerebrais em autocontrole há anos e que a intervenção experimental foi o passo lógico do trabalho. ;Nossos estudos anteriores usaram a mesma técnica para suprimir a atividade cerebral no córtex pré-frontal dorsolateral antes de um indivíduo se alimentar, mas o estudo atual foi o primeiro a incluir uma técnica de imagem cerebral para examinar as respostas neurais à estimulação e a imagens de alimentos;, diz.

De acordo com o cientista, o experimento pode ajudar no desenvolvimento de terapias, já que traz novos dados sobre o funcionamento do cérebro e sobre como lidar com a fome. ;Os resultados podem não informar diretamente os tratamentos médicos. No entanto, entender como o cérebro processa informações sobre alimentos altamente calóricos e como os sistemas de autocontrole modulam isso pode ser importante para determinar como podemos ajudar pessoas que sofrem de transtornos da alimentação impulsiva, por exemplo, bulimia, compulsão alimentar e obesidade;, ressalta Hall.

Mais pesquisas ajudarão a entender como a EMT pode ser usada para interferir no controle cerebral, segundo os autores. Mas eles destacam que essa não é a única possibilidade de influenciar a funcionalidade do córtex pré-frontal dorsolateral. ;Vários fatores relacionados ao estilo de vida afetam a função dele ; por exemplo, a prática de exercícios aeróbicos. Por outro lado, a falta de sono e o estresse podem prejudicá-lo;, ilustra Cassandra Lowe, principal autora do estudo e professora da Escola de Saúde Pública da Universidade de Waterloo.

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Cláudio Carneiro, coordenador de Neurologia do Hospital Santa Lúcia, em Brasília, e membro titular da Sociedade Brasileira de Neurologia, avalia que o trabalho da equipe canadense enriquece uma área da medicina bastante promissora que tem gerado expectativa na sociedade, cada vez mais atingida pelo excesso de peso. ;O consumo de alimentos calóricos em excesso é um grande problema. Acredito que especialistas que conseguirem combater esse comportamento vão ganhar um grande destaque na área, no nível Prêmio Nobel.;

Usar a EMT em intervenções é uma possibilidade, diz o médico. ;Seria uma maneira de intervir usando uma técnica que já é usada na área médica para tratar enfermidades;, justifica. ;Também acredito que possam ser criadas substâncias que alterem esse funcionamento cerebral. Porém, ainda é cedo para dizer. Esse estudo foi feito com uma quantidade reduzida de pessoas, uma análise mais ampla é necessária para confirmar as descobertas.;

O próximo passo da equipe, porém, terá uma abordagem mais coletiva. ;Examinaremos maneiras pelas quais o ambiente social torna a implementação do autocontrole mais ou menos provável de ser bem-sucedida, com foco em alguns desses mesmos sistemas cerebrais;, adianta Hall.


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