Jornal Correio Braziliense

Ciência e Saúde

Ioga ajuda a reduzir inflamação reumatoide, mostra nova pesquisa

Cento e vinte minutos semanais de exercícios melhoram níveis inflamatórios em pacientes já submetidos ao tratamento medicamentoso para a artrite, mostra pesquisa indiana com 72 voluntários

Na tentativa de amenizar os sintomas da artrite reumatoide (AR), cerca de dois terços dos pacientes recorrem a abordagens alternativas, como acupuntura e meditação. Há evidências científicas de que essas práticas geram efeitos mais subjetivos, como melhora da sensação de bem-estar. O resultado de uma pesquisa indiana poderá ampliar a lista de benefícios. Ao acompanhar 72 pacientes, cientistas identificaram que a ioga tem potencial para diminuir significativamente a gravidade dos sintomas físicos e psicológicos da doença inflamatória crônica.

;Nossos resultados mostram melhorias mensuráveis (;) Fornecem evidências de que a ioga modifica positivamente a patobiologia dessa doença autoimune em níveis celulares e moleculares, visando às comunicações mente e corpo;, ressalta, em comunicado, Rima Dada, professora do Instituto de Ciências Médicas da Índia e principal pesquisadora do estudo, divulgado, nesta semana, na revista científica Restorative Neurology and Neuroscience.

Rima Dada e a equipe detectaram os efeitos benéficos em voluntários submetidos a um programa de 120 minutos de prática de ioga, divididos em cinco dias por semana. Todos os 72 participantes tinham a doença inflamatória e foram orientados a manter o tratamento medicamentoso ao longo das oito semanas da pesquisa, sendo que metade deles conciliou os remédios com a abordagem alternativa.

Ao comparar os dois grupos, os cientistas identificaram que o da terapia combinada apresentou melhora em biomarcadores sistêmicos de inflamação e nas avaliações do estado funcional e da atividade da doença, entre outros benefícios. ;Esse estudo oferece uma nova opção. Os tratamentos farmacológicos poderão ser complementados com intervenções alternativas, como a ioga, para aliviar os sintomas nos níveis físico e psicossomático;, destaca a cientista.

Para Licia Mota, coordenadora da Comissão de Artrite Reumatoide da Sociedade Brasileira de Reumatologia, os dados mensuráveis obtidos pelos pesquisadores indianos são o grande destaque do trabalho. ;Estudos mostram que abordagens alternativas, como ioga e acupuntura, melhoram aspectos subjetivos, como qualidade de vida, sono e sensação de fadiga dos pacientes. Agora, o fato de haver parâmetros objetivos mostrando a redução da inflamação é promissor e bastante interessante;, explica.

A médica, que também é orientadora do programa de pós-graduação em ciências médicas da Faculdade de Medicina da Universidade de Brasília (UnB), acredita que os pesquisadores indianos devem ter criado algumas adaptações para as sessões de ioga a que os voluntários foram submetidos. Isso porque a AR afeta as articulações das mãos e dos pés, causando dor, inchaço e rigidez. Dessa forma, pacientes podem encontrar dificuldade para fazer algumas posturas da ioga.

Depressão

Os cientistas também identificaram que os voluntários que combinaram o tratamento tradicional com a ioga intensiva apresentaram melhora na saúde psicológica, ficando mais dispostos e capazes de realizar tarefas diárias. Segundo Rima Dada, o regime intensivo de exercícios reduziu a gravidade da depressão, promovendo a neuroplasticidade. ;A ioga facilita a capacidade da mente de afetar a função corporal e os sintomas das doenças, além de trazer tolerância imunológica natural;, complementa.

As comorbidades psiquiátricas da artrite reumatoide, como ansiedade, depressão e síndrome do pânico, têm grande impacto no enfrentamento à doença. Pacientes com a saúde mental comprometida são mais suscetíveis, por exemplo, a abandonar a rotina de ingestão diária de medicamentos. Até então, a meditação e outras abordagens complementares funcionavam como uma medida para evitar esse tipo de complicação.

;Técnicas de interação mente e corpo, como a proposta pelos pesquisadores indianos, são muito importante nesse sentido;, ressalta Licia Mota. ;Além disso, a relação entre esses fatores parece ser mais complexa. Estudos começam a mostrar que a depressão pode ser um fator causal da artrite reumatoide.;

A médica dará início a um projeto de pesquisa na Rede Sarah em que será avaliado o efeito da meditação em pacientes com AR. Ela aposta que eles chegarão a efeitos semelhantes ao do estudo indiano, indicando a possibilidade de um novo controle da atividade inflamatória. Ainda assim, Licia Mota reforça que não se pode trocar o tratamento tradicional por métodos alternativos. ;É uma combinação de abordagens. As complementares podem trazer vantagens quando aliadas ao tratamento medicamentoso, assim como aconteceu na pesquisa indiana;, frisa.

;Os tratamentos farmacológicos poderão ser complementados com intervenções alternativas, como a ioga, para aliviar os sintomas nos níveis físico e psicossomático;
Rima Dada, professora do Instituto de Ciências Médicas da Índia e principal pesquisadora do estudo

Até o cérebro

Pesquisadores do Michigan Medicine (EUA) descobriram que a inflamação causada pela artrite reumatoide atinge as articulações e também o cérebro. Ao analisar imagens de 264 áreas cerebrais de 54 pacientes, a equipe identificou padrões de conectividade funcional aumentados no início da pesquisa e seis meses depois, o que não é comum em exames do tipo. Para a equipe, o fenômeno pode explicar por que, mesmo com o avanço no tratamento medicamentoso, pacientes ainda enfrentam problemas como disfunção de humor e outras complicações psicológicas. As vias inflamatórias identificadas poderão ser exploradas em novas pesquisas em busca de terapias mais eficazes. O estudo foi publicado, em junho, na Nature Communications.