Ciência e Saúde

Terapia sem medicamentos pode ajudar a aliviar os sintomas da menopausa

Cientistas e especialistas têm mostrado como abordagens alternativas podem amenizar os sintomas da menopausa. Novos medicamentos, mudanças de hábitos e a prática de meditação estão entre as opções com resultados promissores

Vilhena Soares
postado em 23/12/2019 06:00
Iliana Cannof passou a praticar ioga e meditação no climatério: A menopausa é o período da vida da mulher em que muitas mudanças geradas no organismo podem causar complicações, tanto corporais quanto emocionais. Por muito tempo, a terapia de reposição hormonal foi a única saída para amenizar esse estágio. Mas graças à ajuda de pesquisas recentes e ao avanço da tecnologia, remédios mais eficazes e novas formas de terapia não medicamentosas têm contribuído para melhorar a qualidade de vida durante todo o período do climatério.

Um dos problemas enfrentados por mulheres que passam pela terapia hormonal é o surgimento de efeitos colaterais provocados por esses medicamentos. Isso ocorre porque o estrogênio não pode ser usado sozinho, devido ao risco de câncer.

Por isso, ele é aplicado em conjunto com a progesterona, mas essa molécula também aumenta a possibilidade de surgimento de câncer de mama, de alterações metabólicas e de aumento do colesterol.

Para resolver esse problema, cientistas desenvolveram uma nova classe de remédios, chamados complexo estrogênico tecido seletivo (TSEC). Eles não usam a progesterona e conseguem, em parceria com o estrogênio, acabar com os sintomas do climatério sem causar efeitos adversos. ;Se o estrogênio é usado sozinho, aumenta-se o risco de problemas como sangramentos. Esses novos medicamentos têm o hormônio, mas são usados em combinação com compostos que agem de forma seletiva, como um alvo mais direcionado;, explica Lúcia Costa, diretora da Divisão de Ginecologia do Hospital da Mulher da Universidade de Campinas (Unicamp) e chefe do Ambulatório de Menopausa.

Segundo a cientista, essa forma mais direcionada de ação dos TSECs é responsável pela menor possibilidade de efeitos adversos ao corpo da mulher. ;Isso evita risco de câncer do endométrio, por exemplo, uma ação extremamente importante;, diz. Lúcia Costa frisa ainda que não é possível ter acesso a esses novos remédios no Brasil, esse cenário, porém, deve mudar. ;Já temos uma marca aprovada, mas, ainda assim, a comercialização não teve início. Como essa classe de remédios é usada em outros países, podemos esperar que logo ela esteja acessível. E isso seria muito positivo, pois é uma terapia bem mais segura e que pode ser uma opção para mulheres que não se dão bem com as terapias atuais;, detalha.

Cristiane Moulin, endocrinologista da clínica Metasense, em Brasília, também destaca que mais opções medicamentosas para mulheres na menopausa têm surgido nos últimos anos. ;Há muitos sintomas que não são sanados com a terapia hormonal padrão e casos em que ela é contraindicada, como mulheres com osteoporose. Para esse grupo, já temos alguns medicamentos específicos. Já para os calores, por exemplo, temos usado alguns antidepressivos que mostraram bons resultados apenas com doses baixas;, diz.

Apesar desses avanços, Costa acredita que muito ainda precisa ser feito para que as mulheres possam viver o climatério com mais tranquilidade. ;Nem todas têm ondas de calor, por exemplo, mas, quando mais velhas, muitas sofrem com a secura vaginal. Hoje, nos tratamos esse problema com pomadas, mas já existe, no mercado internacional, uma medicação oral, que é mais eficaz e mais cômoda. Temos também adesivos para terapia hormonal, que, em doses únicas e baixas, são de uso mais fácil;, detalha.

Para Lúcia Costa, outro avanço que pode trazer ganhos significativos é o uso do laser. ;Ainda é algo polêmico, mas existe o laser vaginal para tratar a atrofia. Precisamos analisar melhor, já temos pesquisas na Unicamp sobre esse tema;, relata a médica. ;Sabemos que a atrofia prejudica muito a vida sexual feminina, mas é claro que não é só ela, pois a libido é algo mais complicado. Então, nesse ponto, já consideramos também outros fatores psicológicos, por exemplo.;

Atenção plena

Um dos fatores mais relacionados à menopausa é o estresse. Para lidar com essa e outras alterações comportamentais, cientistas internacionais resolveram testar o uso da meditação. O estudo analisou 1.744 mulheres, com idade entre 40 e 65 anos, e mostrou que uma maior atenção plena se correlaciona com menores escores de sintomas da menopausa e de estresse. Nas mulheres mais estressadas, os benefícios foram ainda mais significativos.

;Embora sejam necessárias mais pesquisas, esse estudo fornece um forte sinal para o papel potencial da atenção plena na melhoria dos sintomas psicológicos, em resposta emocional aos sintomas da menopausa e estresse nas mulheres durante a meia-idade;, afirma Richa Sood, principal autora do estudo e pesquisadora da Clínica Mayo, nos Estados Unidos. ;Esse estudo fornece resultados encorajadores, pois demonstra que as mulheres podem ter uma ferramenta para ajudá-las a controlar os sintomas do estresse e da menopausa e melhorar a qualidade de vida;, completa a autora do artigo, publicado em outubro, no Menopause: The Journal of the North American Menopause Society.

Foi o que aconteceu com Iliana Cannof, 52 anos. Ela conseguiu enfrentar os transtornos da menopausa com mais tranquilidade graças à prática de meditação e ioga. ;Minha menopausa chegou aos 45 anos e, antes dela, tive problemas com a minha menstruação. Por isso, precisei passar por reposição hormonal. Foi nessa época em que dei início a essas práticas, e elas me ajudaram bastante nas duas situações. Quase não senti os sintomas que são comuns;, relata a ex-servidora pública que, devido à paixão pela ioga, passou a dar aulas da prática milenar. ;Vejo o mesmo em algumas das minhas alunas que passam pelo climatério agora. Elas me falam que a qualidade de vida é maior e que se sentem com mais bem-estar;, conta.

A professora ressalta que o cuidado com a saúde que ela adotou a motivou a mudar outras áreas na vida. ;Quis mudar a minha alimentação e diminuí, aos poucos, o consumo de carne. Hoje, sou vegetariana e acredito que a alimentação também me ajudou quanto a esse processo hormonal. Também escrevi um livro em que falo sobre como as mulheres podem buscar práticas alternativas para ajudar a cuidar de sua saúde. Me sinto bem nesse processo de ajudar, me sinto feliz em contribuir e servir a coletividade feminina;, frisa Iliana.

Segundo o psicólogo Valdimir Melo, a pesquisa americana é oportuna ao apontar a meditação como uma estratégia para lidar com a menopausa, mas vale ressaltar que o estresse deve provocar uma reflexão sobre o estilo de vida da mulher na meia-idade. ;É importante também identificar as fontes de estresse e buscar mudanças na rotina que tragam melhorias. Além das estratégias para combater o estresse, esse estágio da vida costuma levar as pessoas a reavaliarem hábitos e escolhas. Para isso, é recomendável a psicoterapia.;

Palavra de especialista

Mais apoio

;A menopausa merece atenção e mais espaço porque pode causar mudanças profundas na vida da mulher, o que pode impactar toda a família. Atualmente, as mulheres atingem o auge da carreira na meia-idade e ainda precisam prestar suporte a filhos, pais e cuidar da casa. Esse cenário é decisivo para o surgimento do estresse. Por isso, a sociedade deve dedicar mais tempo e recursos para proporcionar um bem-estar maior a essas pessoas, especialmente nesse estágio da vida. As alternativas são cada vez maiores, sobretudo por meio de terapias que chegam do Oriente e se popularizam com bastante rapidez. Algumas dessas práticas, conhecidas como integrativas e complementares, são oferecidas gratuitamente no SUS. Entretanto, é importante também identificar as fontes de estresse e buscar mudanças na rotina que tragam melhorias para a qualidade de vida. Para isso, é recomendável a psicoterapia.;, Vladimir Melo, psicólogo.

Dieta ruim pode antecipar a menopausa

Uma dieta rica em nutrientes tem valor inestimável para a saúde do organismo e, de acordo com cientistas ingleses, pode também atrasar a chegada da menopausa. É o que mostram pesquisadores da Universidade de Leeds. Os investigadores analisaram dados alimentares de 14.150 mulheres, junto com histórico médico e dados relacionados à saúde reprodutiva. Quatro anos depois, refizeram o estudo.

A análise mostrou que a alta ingestão de peixe oleoso está associada a um início tardio da menopausa por quase três anos. Por outro lado, seguir uma dieta com muitas massas e arroz refinados pode antecipar o fim da menstruação em um ano e meio. ;A idade em que a menopausa começa pode ter sérias implicações na saúde de algumas mulheres. Uma compreensão clara de como a dieta afeta isso será muito benéfica para aquelas que já podem estar em risco ou ter um histórico familiar de certas complicações relacionadas à menopausa;, explica Janet Cade, professora de epidemiologia nutricional e saúde pública da Escola de Ciência e Nutrição Alimentar da Universidade de Leeds e autora do estudo, publicado em abril, no periódico Journal of Epidemiology and Community Health.

Patrícia de Castro Campos, nutricionista, destaca que, cada vez mais, as pesquisas revelam como a alimentação pode alterar efeitos relacionados ao envelhecimento. ;Muitos especialistas têm visto que a introdução da dieta vegetariana, por exemplo, pode retardá-lo. Também sabemos que o consumo da carne pode causar o envelhecimento das células;, diz. ;Isso é muito importante porque caso uma boa alimentação retarde a menopausa, ela entra no hall de outros benefícios às mulheres que estão envelhecendo, como menor risco de diabetes e de ocorrência de doenças cardiovasculares;, completa.

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