Ciência e Saúde

Coronavírus: pesquisa de Tóquio aposta em remédio contra a pancreatite

Em experimentos laboratoriais, o mesilato de nafamostato consegue evitar que o Sars-Cov-2 se replique em células humanas e cause complicações respiratórias. Testes clínicos devem ser iniciados ainda neste mês

Correio Braziliense
postado em 01/04/2020 06:00
ilustração de pílulasCom a explosão de casos de infecção pelo novo coronavírus pelo mundo, o redirecionamento de medicamentos — testar a eficácia de uma droga desenvolvida para outra doença — é uma das apostas da ciência para combater o Sars-Cov-2. É o que vêm fazendo institutos de pesquisa com a cloroquina e a hidroxicloroquina. Agora, pesquisadores da Universidade de Tóquio acreditam que um remédio usado para pancreatite aguda, o mesilato de nafamostato, pode evitar que o vírus se replique no organismo e cause as condições respiratórias características da Covid-19. Eles pretendem fazer testes clínicos, com humanos, neste mês.

Os estudos preliminares com a droga demonstraram que ela é capaz de bloquear um mecanismo essencial para a entrada do vírus na célula. O mesilato de nafamostato age semelhante a um medicamento também desenvolvido para a pancreatite, o mesilato de camostato, que, recentemente, foi identificado por um grupo alemão como inibidor do novo coronavírus. Porém, no caso do primeiro, a concentração necessária para a eficácia é menos de um décimo da exigida pelo segundo para impedir que o Sars-Cov-2 adentre a membrana celular. Nos testes com humanos, os cientistas de Tóquio vão incluir e comparar os dois medicamentos, ambos desenvolvidos no Japão e prescritos no país há muitos anos.

“A infecção por Sars-Cov-2 já está se espalhando por todo o mundo, por isso, o redirecionamento de medicamentos, prática que procura por tratamentos entre os medicamentos existentes com registros de segurança estabelecidos, parece valer a pena”, diz Jun-inchiro Inoue, professor do Centro de Pesquisa de Doenças Infecciosas Asiáticas da Universidade de Tóquio. “Mesmo após a declaração da Organização Mundial da Saúde de que temos uma pandemia, nenhum medicamento demonstrou ser eficaz no tratamento da Covid-19. O desenvolvimento de terapêuticas eficazes é uma questão urgente”, ressalta.

O mesilato de nafamostato age impedindo o envelope que recobre o material genético do vírus de se fundir com a membrana celular humana. Com isso, ele é incapaz de entrar nas células e se replicar, causando a doença (veja infografia). Em 2016, o grupo de pesquisadores liderados por Inoue já havia relatado que o medicamento para pancreatite inibe a entrada, na membrana, do coronavírus responsável pela síndrome respiratória do Oriente Médio (Mers), que causou uma epidemia na Ásia quatro anos antes.

Baixa concentração
Para tanto, os cientistas rastrearam uma biblioteca composta por 1.017 medicamentos aprovados pela Food and Drug Administration (FDA), órgão de registro de remédios norte-americano. O resultado da triagem os levou a pesquisar, em laboratório, a ação do Nafomastat (nome comercial do remédio japonês) em células das vias aéreas humanas em contato com o vírus Mers-Cov, causador da Mers.

Agora, em um novo teste com linhagens de células humanas, os pesquisadores descobriram que, em uma concentração baixa, o remédio impediu a fusão da proteína spike, presente no envelope do Sars-Cov-2, com os receptores da membrana celular humana.

A equipe também comparou os efeitos do mesilato de nafamostato e do mesilato de camostato (testado por cientistas alemães) e descobriu que, no caso do segundo, para impedir a entrada do vírus na célula, era preciso uma concentração muito maior do medicamento. Por isso, a equipe acredita que o mesilato de nafamostato é o remédio mais promissor entre os já utilizados na prática clínica e testados. “Ambos os medicamentos podem ser usados sozinhos ou em combinação com antivirais direcionados a diferentes mecanismos necessários para a produção do vírus, como replicação de RNA ou processamento de proteínas virais”, afirma Inoue.

EMA: vacina em um ano
A Agência Europeia do Medicamento (EMA) voltou a reafirmar, ontem, que não será imediato o surgimento de uma imunização contra o novo coronavírus. De acordo com o órgão, pode passar “pelo menos um ano até que uma vacina contra a Covid-19 esteja pronta para sua aprovação e que haja quantidades suficientes que permitam seu uso estendido”. No cálculo foram considerados dados atuais da pandemia e o tempo que levou o desenvolvimento de outras fórmulas protetivas. A EMA lembrou ainda que há duas vacinas que entraram na primeira fase de testes clínicos, realizados com voluntários sadios. No entanto, “os prazos para o desenvolvimento de produtos medicinais são difíceis de prever”, ponderou.

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