Ciência e Saúde

Pesquisa mostra como doentes crônicos reagem ao Covid-19 e cuidados médicos

Doentes crônicos, como diabéticos e hipertensos, estão entres os mais vulneráveis à Covid-19 e os com a maior taxa de mortalidade em decorrência da doença. Pesquisas têm mostrado como o corpo desses pacientes reage ao coronavírus e aos cuidados médicos

Correio Braziliense
postado em 12/04/2020 08:00
Doentes crônicos, como diabéticos e hipertensos, estão entres os mais vulneráveis à Covid-19 e os com a maior taxa de mortalidade em decorrência da doença. Pesquisas têm mostrado como o corpo desses pacientes reage ao coronavírus e aos cuidados médicosAs pessoas infectadas pelo vírus da Covid-19 podem ser afetadas de formas diferentes, desde não apresentar sintomas a enfrentar o nível máximo de gravidade da doença, com a necessidade de tratamento intensivo. Especialistas e estatísticas têm sinalizado que o risco de enfrentar as complicações mais críticas aumentam quando o paciente sofre com outras enfermidades, como pressão alta e diabetes. Por isso, pesquisadores de diferentes partes do mundo têm se dedicado a entender essas relações com mais profundidade, investigando, principalmente, registros médicos das primeiras vítimas da enfermidade em Wuhan, cidade chinesa onde começou a epidemia.

Em um estudo publicado na revista American Journal of Respiratory and Critical Care Medicine, cientistas americanos e chineses estudaram, até o momento, o maior grupo de pacientes mortos em decorrência da doença. A equipe examinou os registros médicos de 85 pessoas que perderam a vida em Wuhan e considerou uma série de informações, como exposições a coronavírus, ocorrência de doenças crônicas adicionais (comorbidades) e de sintomas, resultados de exames laboratoriais e de tomografia computadorizada, além de gerenciamento clínico ao longo do tratamento.

Por meio das análises estatísticas, os cientistas identificaram a idade média dos pacientes que sofreram a forma mais grave do vírus e não sobreviveram. “O maior número de mortes se deu entre homens com mais de 50 anos e doenças crônicas não transmissíveis”, afirma Yingzhen Du, pesquisador do Departamento Respiratório do Centro Nacional de Pesquisa Clínica de Doenças Geriátricas, em Pequim.

Os principais sintomas apresentados pelas vítimas foram febre, falta de ar e fadiga. Hipertensão, diabetes e doença coronariana somaram-se às comorbidades mais comuns. “Esperamos que esse estudo transmita a seriedade da Covid-19 e enfatize os grupos de risco de homens acima de 50 anos com condições crônicas comórbidas, incluindo hipertensão, doença coronariana e diabetes”, reforça Yingzhen Du.

Os pesquisadores também observaram que uma combinação de medicamentos antimicrobianos (antivirais e antibióticos) não ajudou significativamente esses pacientes. A maioria dos indivíduos estudados morreu de falência de múltiplos órgãos. “Nosso estudo identificou certas características que podem servir como alerta para os riscos dessas doenças relacionadas. É claro que a genética pode desempenhar um papel na resposta à infecção, e o curso da pandemia pode mudar à medida que o vírus sofre mutação. Mas acreditamos que a comunidade médica pode se beneficiar desses e de outros dados futuros, já que mais estudos estão sendo realizados”, diz o pesquisador


Defesa comprometida


Um segundo estudo feito por cientistas da China analisou 113 pessoas que morreram e 161 que sobreviveram à Covid-19 também na cidade de Wuhan. Os pacientes que faleceram tinham, em média 68 anos, e os curados, 51 anos. Os fatores de risco mais detectados no primeiro grupo foram hipertensão arterial (48%) e diabetes (21%). Entre os sobreviventes, as incidências foram de 24% e 14%, respectivamente.

No estudo publicado na revista especializada BMJ, os autores enfatizam que as complicações cardíacas influenciaram consideravelmente o tratamento das vítimas. “Indivíduos com comorbidade cardiovascular foram mais propensos a desenvolver complicações cardíacas. Independentemente da história de doença cardiovascular, lesão cardíaca aguda e insuficiência cardíaca foram mais comuns nos pacientes que faleceram”, detalharam os autores, liderados por Tao Chen, pesquisador do Instituto de Doenças Infecciosas, do Hospital de Tongji.

David Urbaez, infectologista e diretor científico da Sociedade de Infectologia do Distrito Federal, explica que as comorbidades observadas em pacientes que morreram com a Covid-19 acabam atrapalhando a resposta natural de combate ao vírus. “Quando o organismo começa a viver com um agente infeccioso, ele busca eliminá-lo. Com isso, são produzidos vários produtos biológicos, e eles vão circular pelo corpo. Se você não tem comorbidades, essa atividade ocorre de forma mais tranquila. Mas isso pode gerar uma série de distorções de resposta caso a pessoa já tenha algum problema, como a pressão alta. Nesse caso, as reações dos vasos sanguíneos podem não ser adequadas devido à sobrecarga que eles já sofrem”, detalha.

O médico destaca ainda que, além de problemas cardíacos e diabetes, que estão relacionados ao sobrepeso, indivíduos com problemas no sistema imune podem ter dificuldades em enfrentar a Covid-19. “Se você já tem uma imunidade comprometida, as inflamações provocadas pelo coronavírus podem não ser contidas da maneira esperada”, explica.

Segundo Urbaez, entender as comorbidades que mais agravam a reação do corpo à  Covid-19 por meio das pesquisas científicas pode contribuir para a forma como os pacientes têm sido tratados nos hospitais. “No caso dos problemas cardíacos, temos a hipótese de que usar a heparina, que é um tipo de anticoagulante, ajuda no tratamento, aumentando as chances de ter um resultado mais positivo no combate à infecção em pacientes com problemas cardíacos”, ilustra. “Mas isso é algo que ainda não foi provado, até porque os cientistas precisam de muito mais tempo para entender melhor como tratar o vírus, que ainda é algo muito novo.”


O fator desigualdade
Um relatório feito por uma pesquisadora da Universidade de São Paulo (USP), divulgado na semana passada, mostra que a baixa escolaridade e as desigualdades sociais são fatores determinantes para as altas taxas de transmissão da Covid-19 e sua severidade. O trabalho, assinado pela economista e professora da instituição Laura Carvalho, em parceria com outras pesquisadoras, mostra que os casos mais severos da doença são mais presentes na população de baixa renda, e que isso pode ter ocorrido pela alta incidência de doenças crônicas nessa parcela de pessoas. Por conta das conclusões, as pesquisadoras defendem que sejam postas em prática políticas públicas para a população mais carente. 

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