Ciência e Saúde

Pesquisas americanas tentam combater fatores que agravam a covid-19

A forma como as células de defesa se organizam interfere na reação do corpo a infecções. Cientistas americanos identificam três respostas diferentes aos Sars-CoV-2. Descoberta pode ajudar médicos a prever o avanço da doença e escolher o melhor tratamento

Correio Braziliense
postado em 16/07/2020 06:00
Outros fatores, como idade e incidência de doenças crôStephanie Keith/AFPnicas, também influenciam na evolução da infecçãoDesde o início da pandemia, ninguém sabia explicar, com certeza, o motivo pelo qual o Sars-CoV-2 provoca reações tão diferentes nos pacientes graves de covid-19. Enquanto alguns responderão bem a determinados medicamentos, outros necessitarão de terapias diferenciadas, sem contar os que, apesar do tratamento, não resistem. Embora idade e condições preexistentes, como algumas doenças crônicas, justifiquem parcialmente essa discrepância, só agora os cientistas conseguiram uma resposta mais detalhada. Em dois estudos publicados na revista Science, pesquisadores da Universidade da Pensilvânia esclarecem que a resposta do organismo à infecção depende do imunotipo do paciente.

Imunotipo é um conceito relativamente novo. O sistema imunológico humano consiste em tipos diferentes de células brancas do sangue que coordenam sua ação para combater infecções. “O balanço entre essas populações celulares é determinado por interações diretas e fatores como as citocinas, que agem como mensageiras entre as células”, explica um artigo do Instituto Karolinska, publicado na revista Pnas, que define as diferentes respostas imunológicas humanas. Como as mais de 100 células desse sistema vão se organizar depende de diversos fatores, incluindo a idade, e pode determinar as melhores estratégias de tratamento. Embora seja um perfil individual, é possível, segundo os pesquisadores, agrupar os pacientes em determinados grupos.

No par de estudos publicados ontem, os cientistas da Universidade da Pensilvânia identificaram três respostas diferentes ao Sars-CoV-2 que, segundo eles, pode “ajudar a predizer a trajetória da doença em pacientes com covid-19 grave e, por fim, nos informar a melhor a forma de tratá-los”. “Estamos esperançosos que consigamos ao menos inferir os diferentes padrões imunológicos de um paciente, baseado em seus dados clínicos. Isso permitiria pensar em encaixar diferentes pacientes em diferentes tipos de ensaios clínicos sobre tratamentos”, diz E. John Wherry, diretor do Instituto de Imunologia Penn e principal pesquisador dos estudos.

Para chegar aos três imunoperfis, os pesquisadores investigaram a resposta individual de 163 pacientes ao longo da doença. Além de 90 pessoas internadas no Hospital Universitário de Pensilvânia, entraram pacientes não hospitalizados, com uma forma menos severa da doença, embora tenham desenvolvido sintomas. As amostras sanguíneas dos pacientes de covid-19 passaram por um exame chamado citômetro de fluxo, que permitiu identificar quais células imunológicas foram ativadas para combater a doença.

Os cientistas contaram a quantidade de células B de cada indivíduo. Essas estruturas, se ativadas de maneira adequada, produzem os anticorpos certos para combater o vírus. Também foram medidos vários tipos de células-T, que desempenham funções distintas, como organizar as defesas do corpo e destruir as infectadas, evitando que o patógeno se reproduza dentro delas. Por fim, cada um dos soldados do sistema imunológico foram categorizados por assinaturas moleculares, e os pesquisadores definiram os três perfis.

Um deles tem como características principais forte atividade das células-T CD4%2b e ativação modesta das CD8 . Essas células têm função de exterminar o vírus. Também faz parte do perfil uma fraca atuação dos linfócitos (responsáveis por identificar e destruir o invasor) do sangue periférico. O segundo imunoperfil é caracterizado por um conjunto de células conhecidas como EM e EMRA e pouca ativação das CD8 , das B e dos linfócitos. Por fim, o terceiro tipo mostrou pouca ou nenhuma evidência de reação natural à infecção. De forma resumida, o primeiro grupo teve uma reação exagerada, o segundo, demorou a reagir e o terceiro, apresentou pouca ou quase nenhuma reação.

Checagem clínica


Para entender como cada um desses perfis se traduz na resposta à presença do vírus no organismo, os pesquisadores pegaram os prontuários médicos e verificaram a evolução clínica dos pacientes, já classificados de acordo com o imunoperfil. Os do primeiro grupo foram associados à forma mais severa da doença, com ocorrências como inflamações dos tecidos, falência de órgãos e doença renal aguda.

O segundo perfil não se relacionou à gravidade da doença, mas a mortalidade desses pacientes foi maior. Já o terceiro grupo não interferiu nos sintomas ou na evolução da covid-19. “Essas descobertas representam o primeiro passo para identificar quais pacientes precisarão de agentes que reduzem a resposta imunológica e quais necessitarão de um tratamento que, ao contrário, estimule essa reação”, explica Wherry. “Você pode aumentar a ativação do sistema imunológico, diminui-lo ou mesmo desligá-lo.”

No segundo estudo publicado na Science, Michael R. Betts, que é coautor do primeiro artigo, examinou amostras de sangue de 42 pacientes com covid-19 severa e moderada. As respostas imunológicas também se mostraram diversas. Mas, além disso, Betts identificou que, nos casos mais graves, houve queda na contagem de moléculas que são importantes para estimular o corpo a lutar contra o vírus. Segundo Betts, essas moléculas são alvo potencial de tratamentos imunoterápicos, algo que ele está estudando agora.

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