Diabetes

Diabetes é mais fatal que o vírus HIV, o câncer de mama e a tuberculose

Entre pessoas de 51 a 69 anos diagnosticadas com diabetes, um terço morre em decorrência de derrames e, um quarto, de doenças coronarianas

Correio Braziliense
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postado em 16/08/2018 06:00

As doenças cardiovasculares em pacientes com diabetes matam mais no mundo do que o vírus HIV, a tuberculose e o câncer de mama, segundo levantamento do ;Movimento Para Sobreviver;. O estudo acrescenta que a incidência de doenças cardiovasculares aumenta com a idade. Entre pessoas de 51 a 69 anos diagnosticadas com diabetes, um terço morre em decorrência de derrames e, um quarto, de doenças coronarianas.

Para o presidente da Associação Nacional de Atenção ao Diabetes, Fadlo Fraige Filho, evitar o diabetes e as complicações da doença exige educação e melhorias no atendimento, além do oferecimento de novos fármacos. Militante da causa, ele diz que, há 35 anos, luta pela melhoria de medicamentos, pelo acesso facilitado e pela qualidade de vida das pessoas com diabetes, principalmente contra as doenças cardiovasculares. O mal atingiu o avó dele e, na família da mãe, sete irmãos morreram em decorrência de complicações do diabetes.

Fadlo afirma que, independentemente dos cuidados, a massa de diabéticos aumenta progressivamente por conta do envelhecimento da população. ;Em 2005, a população idosa era de 20 milhões. Em 2030, serão 40 milhões, 15% do total de brasileiros. Atualmente, estamos com quase 23% de diabéticos na população. O total de hipertensos chega a quase 60% e, à medida que se envelhece, aparece o diabetes. Essa é a doença do idoso e pode causar outras mais graves, como as cardiovasculares;, ressalta.

O especialista lembra que, com o diabetes saindo do controle, a superlotação na rede hospitalar aumenta. Ele calcula que, em um hospital com 1.000 leitos, 440 pacientes, em média, estão ocupados por pessoas com hiperglicemia. ;Não se interna com diagnóstico de diabetes, interna-se com infarto, AVC (acidente vascular cerebral), trombose, pneumonia, infecção urinária, hipertensão. A hospitalização é o mais alto custo na saúde pública;, afirma.

É preciso avançar

Apesar do quadro de epidemia, Fadlo reconhece que houve avanços no tratamento do diabetes. O ano de 2000 foi marcado pela troca de insulinas animais para o DNA recombinante. Em 2001, começou a distribuição de medicamentos orais para diabetes e pressão alta. Em 2004, houve o lançamento da Farmácia Popular. Em 2006, a Lei n; 11.347 obrigou a distribuição gratuita de medicamentos contra o diabetes.

É preciso, porém, avançar mais. Segundo o presidente da Associação Nacional de Atenção ao Diabetes, a medicação oferecida pelo Sistema Único de Saúde (SUS) para o tratamento do diabetes consiste em insulinas NPH e regular, que não são tão efetivas. ;A Insulina NPH e regular são medicamentos ultrapassados. Não tratam do diabetes tipo 1. As que tratam são as basais e as ultrarrápidas. Precisamos da agilização na incorporação delas na rede pública. A Sulfonilureia oferecida pela Farmácia Popular está praticamente em desuso. A Gliclazida tem pouca distribuição e a Glibenclamida piora as doenças cardiovasculares. A metformina é excelente;, observa.

Outro desafio descrito por Fadlo são as doenças crônicas não transmissíveis. ;Elas vão predominar em todo o mundo e podem afundar o orçamento dos governos, se não houver a devida atenção. As complicações do diabetes trazem doença nos rins, acidente vascular cerebral, doença arterial coronariana, retinopatia e amputações;, diz. Ele defende que vivemos um ;tsunami; de complicações que deveriam ter sido tratadas há 20 anos. A boa notícia, acrescenta o especialista, é de que os pacientes pré-diabéticos podem prevenir a doença. ;Estudos mostram que, com dieta, emagrecimento, exercício físico e, dependendo do caso, a metformina, pode-se reverter esse mal.;

Falta conhecimento

Para o presidente da ADJ Diabetes Brasil (integrante do Movimento Para Sobreviver), Gilberto Soares Casanova, o país precisa avançar no combate ao diabetes. ;O que faria a diferença frente ao atual cenário seria o acesso a informações para os profissionais que, muitas vezes, não conhecem a doença;, diz. Na opinião dele, também é necessário informação adequada aos pacientes sobre o diabetes e a utilização correta da medicação. ;A informação em saúde sai mais barato do que a hospitalização. Conseguimos a inclusão da insulina análoga na Relação Nacional de Medicamentos Essenciais (Rename), mas tem a burocracia. Já vinha sendo adiado, e agora, prometeram para setembro, estamos receosos. A ação dessa insulina é mais rápida que as outras e mais próxima à resposta natural do organismo. É essencial;, avisa.

Remédios estão ultrapassados

Odiabetes crescerá de forma assustadora na América Latina nos próximos anos. Segundo a presidente da Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD), Hermelinda Pedrosa, até 2045, os casos notificados aumentarão 62%, tornando a região foco de atenção das autoridades. A situação será mais grave do que na África e na Ásia. Se não houver uma ação coordenada dos agentes públicos, sobretudo com a incorporação de novos medicamento, a situação poderá sair do controle, com pesados custos econômicos para o país.


Na avaliação de Hermelinda, é possível dizer que o diabetes se tornou uma epidemia, e os governos terão de se preparar para custear os tratamentos. ;Nos Estados Unidos, em 1996, o custo com o diabetes era de US$ 13 bilhões (R$ 49 bilhões em valores de hoje) e atingiu, em 2013, a faixa expressiva de US$ 101 bilhões (R$ 380 bilhões). Isso se deve à prescrição farmacêutica, já que pessoas são identificadas precocemente com diabetes. Aumentam também os custos ambulatoriais. O desembolso maior é com a população acima de 65 anos, o nicho populacional em que a doença mais ocorre;, diz.

A presidente da SBD não esconde a preocupação. Ela, que também participa do ;Movimento para Sobreviver;, formado por oito organizações que combatem o diabetes, afirma que um dos problemas mais sérios a serem enfrentados é a obesidade, que traz a piora na função do pâncreas, responsável pela fabricação da insulina. Essa deficiência, somada ao envelhecimento, aumenta o nível de mortalidade e leva a maiores riscos de complicações. Isso faz com que o Brasil ocupe a quarta posição no ranking dos 10 países com mais casos de diabetes.

Amputações

Para o bom controle do diabetes, Hermelinda explica que o ideal é que a taxa de glicemia esteja abaixo de sete. No entanto, no caso de pessoas idosas, o mesmo patamar de controle não pode ser adotado por conta dos riscos de hipoglicemia (queda da glicose no sangue), que se associam a complicações cardiovasculares, como derrame, hipertensão e doenças do coração. Os piores controles com base na hemoglobina glicada estão nas regiões Norte e Nordeste.

Segundo a presidente da SBD, é necessário que haja um controle da doença com atenção voltada à glicose, ao colesterol, à pressão arterial, aos olhos, aos pés e ao coração, descrito como o grande vilão nos casos de mortes. Para a redução das complicações. ;O que mais mata a pessoa com diabetes e que não se controla é a complicação cardiovascular. Questões genéticas, como raça, estilo de vida e hipertensão também podem levar à doença. As pessoas com diabetes têm o risco aumentado para problemas cardíacos em torno de duas a cinco vezes;, frisa.

As características de pessoas com diabetes e maior risco cardiovascular são claras: idade acima dos 60 anos, doenças renais, colesterol alto e tabagismo. O diabetes também pode estar associado à hipertensão, que colabora para o surgimento de doença coronária (angina), infarto do miocárdio, acidente vascular cerebral (derrame) e insuficiência cardíaca. Ela chama ainda a atenção para a amputação de membros devido ao diabetes, o que, no Brasil, é bem frequente. Hermelinda, contudo, ressalta que faltam pesquisas e levantamentos seguros sobre esses procedimentos, que não têm tratamento adequado na rede de saúde.

;Não temos dados precisos sobre amputação, porque são poucos os estudos. Mas podemos dizer que o mau controle de glicemia leva à neuropatia, à má circulação e, como as feridas não cicatrizam, levam à infecção e constitui o pé diabético;, assinala. Para ela, as amputações ocorrem, na grande maioria, por tratamento inadequado. Se todos os diabéticos fizessem pelo menos uma vez por ano um exame dos pés, com avaliação de sensibilidade, saberiam dos riscos e poderiam procurar auxílio. ;Infelizmente, cerca de 65% das pessoas com diabetes tipo 2 nunca tiveram os pés examinados;, critica.

Novas terapias

Hermelinda ressalta ainda a necessidade de adoção de novos medicamentos para combater o diabetes. Há, no entender dela, drogas mais eficientes que estão disponíveis no mercado, mas ainda não foram incorporadas à lista do Sistema Único de Saúde (SUS). ;Infelizmente, a realidade é de um arsenal muito pequeno, que precisa ser revisto. Entre as drogas novas se destaca a Empagliflozina, que diminuiu o risco de infarto e de derrame, além de promover a redução na progressão da doença renal do diabético. Há, também, a Canagliflozina e as Glicazidas. Elas são as melhores drogas e as mais seguras para a prevenção de complicações;, diz.

A presidente da SBD propõe, ainda, mudanças no quadro de tratamento do diabetes no Brasil, enfatizando a prevenção com atenção primária, mudança no estilo de vida, educação sobre a doença envolvendo pacientes, profissionais e escolas, acesso a medicamentos e atualização da Relação Nacional de Medicamentos Essenciais (Rename). ;Essa é uma oportunidade de melhorar e alterar a atual terapia. Assim, as pessoas com diabetes terão maiores chances de sobrevivência.;

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