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"Não se pode brincar com a estrutura tributária", diz Rebeschini

Resultado são R$ 5 bilhões de inadimplência e sonegação e uma dívida ativa de R$ 60 bilhões, cujo histórico de recebimento é de 1%

Correio Braziliense
Correio Braziliense
postado em 05/09/2018 06:00

Hélvio Roberchini Ao mesmo tempo em que é absolutamente robusto, o setor de combustíveis tem fragilidades enormes. Como é uma atividade muito tributada, tem alto índice de sonegação, revela o diretor de Planejamento Estratégico e Mercado da Associação Nacional das Distribuidoras de Combustíveis, Lubrificantes, Logística e Conveniência (Plural), Hélvio Rebeschini. ;Há um lado negro no ramo de combustíveis: não se pode brincar com a estrutura tributária de setores de alta tributação;, alerta. O resultado são R$ 5 bilhões de inadimplência e sonegação e uma dívida ativa de R$ 60 bilhões, cujo histórico de recebimento é de 1%. ;Todo mundo perde, eu, você, a escola, o país;, afirma.


Ao defender a monofasia na tributação de combustíveis ; a aplicação de alíquota uniforme do Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) em todos os estados brasileiros ;, Rebeschini diz que isso ;não é reinventar a roda;. ;A monofasia está prevista na Constituição;, declara. O engenheiro defende que, para reduzir os índices de sonegação e fraudes tributárias, é preciso unificar essa taxa em todos os estados e simplificar o processo de arrecadação, de forma que todo o imposto do setor recaia sobre um único grupo de agentes no início da cadeia de circulação, os produtores, estratégia chamada de tributo monofásico.

"O segmento mexe com muito dinheiro, é fácil lavar, e eliminando a competição saudável, fomenta a corrupção. É a equação do crime organizado;

Hélvio Rebeschini, diretor de Planejamento Estratégico e Mercado da Plural


De acordo com Rebeschini, o Brasil conta com um setor de combustíveis e biocombustíveis muito bem estruturado, com 150 distribuidoras autorizadas, das quais 120 são operantes regionais ou nacionais, e 42 mil postos espalhados por todo o território, sendo 24 mil com marcas próprias ou regionais e 18 mil sem marcas, com livre opção de compra de combustível. ;É um mercado extremamente competitivo, são poucos os lugares do mundo que possuem essa quantidade de agentes operando;, afirma.

Segurança

O especialista destaca que o Brasil é um país de dimensões continentais. ;Nada fácil de suprir, mas que tem uma segurança de abastecimento brutal. Dois, três meses atrás, com a greve dos caminhoneiros, isso foi testado e aprovado: quando os terminais das distribuidoras foram desobstruídos de fato, em três dias, o Brasil estava irrigado e, em cinco dias, 95% dos postos tinham recebido combustível;, completa.

Toda essa estrutura coloca o setor como segundo mercado mundial de energia e o primeiro na lista de arrecadação nacional, com estimativa de R$ 147 bilhões em impostos para este ano. No entanto, o diretor de Planejamento Estratégico da Plural alerta para a questão tributária como um ponto de extrema fragilidade. ;O funcionamento tributário do setor de combustíveis é um dos mais complexos. Esse é o lado negro que muita gente desconhece;, revela.

Vulnerabilidade

Segundo Rebeschini, ;a vulnerabilidade do setor se dá num aspecto extremamente relevante;. ;Por exemplo, no caso da gasolina, os tributos somados, federais e estaduais, são quase três vezes as margens brutas do setor de distribuição, mais que toda a revenda dos postos, mais que todos os custos de logística;, diz.

Ao apresentar um gráfico do Banco Mundial, Rebeschini aponta que uma empresa de médio porte no Brasil leva em torno de 2.600 horas para tratar das suas exigências tributárias, sendo o país com o sistema tributário mais complexo do mundo, enquanto, no México, segundo da lista, o tempo gasto é de 334 horas. ;Desde a Constituição Federal de 1988, quando todos os impostos foram criados, a correção de alíquotas (índices aplicados) aumentou a carga tributária do setor em R$ 57 bilhões;, afirma.

Por conta disso, continua Rebeschini, o ICMS médio da gasolina está em 28%, com variação de 24% a 35%, dependendo do estado. Essas distorções acabam resultando na parcela de R$ 5 bilhões ao ano de sonegação e inadimplência e em uma dívida ativa na casa dos R$ 60 bilhões. ;Sendo que o histórico de recebimento desse valor é menor que 1%, um dinheiro que a União perdeu, a sociedade perdeu, você perdeu, eu perdi, a escola perdeu, o hospital perdeu;, conclui.

A alta carga com desbalanço tributário e toda a complexidade do sistema levam diretamente a uma concorrência desleal entre os agentes. ;Em setores assim, o mínimo de inadimplência pode tirar o concorrente do lado do jogo, não se brinca com setores de alta tributação: o segmento mexe com muito dinheiro, é fácil lavar, e eliminando a competição saudável, fomenta a corrupção. É a equação do crime organizado;, ressalta Rebeschini.

Ele aponta também para os impactos ao consumidor, que se torna indefeso diante de um mercado dominado por agentes corruptos, que podem vender produtos de baixa qualidade a preços altos e em horários irregulares. ;E o pior é que aqui o bandido vira mocinho e o mocinho vira bandido, porque o consumidor olha uma bomba R$ 0,60 mais barata e acha que quem cobra mais é ladrão, sendo que, na verdade, ele só está cobrando o imposto de maneira adequada;, lamenta.

Essa distorção que Rebeschini utiliza como exemplo é muito clara a qualquer motorista que sai de São Paulo e entra no Rio de Janeiro. Por conta da diferença na alíquota de ICMS entre os dois estados, o preço da gasolina fica até R$ 0,63 mais caro.

Convênio

As consequências são claras, segundo Rebeschini: ;Sempre quem perde é o consumidor. Mas o setor perde porque isso afugenta o investidor;. Para combater isso, a monofasia está prevista na Constituição. ;Existe uma previsão legal para que isso seja resolvido de uma forma melhor do que aprovar uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC);, sugere. Uma alternativa que o setor encontrou, confiável, conforme, seria por meio de convênio, repassando dos estados que ganham para aqueles que perdem, com a estipulação de uma alíquota monofásica. ;Podemos discutir outras sugestões, mas essa é uma ideia;, diz.

O engenheiro explica que a monofasia pressupõe o fim do diferimento de alíquotas nos estados. ;A paridade melhora a situação em 24 unidades da federação e está em linha com a ideia do governo de fomentar os biocombustíveis. Além disso, a monofasia elimina os riscos com o fim da substituição tributária;, explica. Para o especialista, a monofasia promove a concorrência saudável e reduz a sonegação. ;E é um passo para a reforma tributária;, resume.


Etanol competitivo

A unificação das várias alíquotas de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) praticadas pelos estados e o Distrito Federal em um índice para todo o território nacional, a chamada monofasia, simplificaria e corrigiria distorções tributárias. Conforme Helvio Rebeschini, diretor de Planejamento Estratégico e Mercado da Associação Nacional das Distribuidoras de Combustíveis, Lubrificantes, Logística e Conveniência (Plural), uma das vantagens seria a melhora significativa na paridade do etanol com a gasolina. Atualmente, essa paridade está acima de 70% em 22 unidades da federação (UFs). Com a monofasia do ICMS, melhoraria em 24. ;Além de ampliar a competitividade do etanol, melhora a compensação dos créditos de ICMS dos insumos, com impacto no aumento do capital de giro em torno de R$ 500 milhões por mês;, explica. A monofasia ainda pode eliminar riscos dos questionamentos judiciais, reduzir os custos com burocracia das empresas e diminuir a sonegação oriunda de simulações de vendas interestaduais. ;Com a aplicação de alíquota única, veremos a redução da inadimplência;, ressalta.

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