Diversão e Arte

Livro-reportagem de Lucas Figueiredo confronta as versões do best-seller Brasil

postado em 13/07/2009 07:59
Clara Arreguy Publicação: 13/07/2009 07:59 A guerra aberta entre militantes de esquerda e setores ligados aos órgãos da repressão não se esgotou com o fim do regime militar (1964-1985) - na verdade, nem começou com ela. É o que comprova o novo livro-reportagem do jornalista Lucas Figueiredo, premiado por investigações que fez inclusive como repórter do Correio. Olho por olho - Os livros secretos da ditadura conta duas histórias ocorridas pouco depois da redemocratização. De um lado, o best-seller Brasil: nunca mais. De outro, o pouco conhecido Orvil. Brasil: nunca mais condensa o levantamento dos casos de tortura e violência cometidos pelos órgãos de repressão nos 21 anos da ditadura. Foi produzido ao longo de cinco anos, desde que o Superior Tribunal Militar (STM) autorizou o acesso de advogados a processos de seu arquivo, após a anistia (1979). Daquele momento em diante, um grupo pequeno e praticamente clandestino se mobilizou para tirar das dependências do órgão, em Brasília, um a um, todos os registros referentes a presos e desaparecidos por ação do regime, inclusive com depoimentos que denunciavam torturas. O Conselho Mundial de Igrejas, que reúne denominações de todo o mundo, foi o financiador do projeto. Durante anos, por intermédio do pastor Jaime Wright, cristãos de vários países mandaram dinheiro para ajudar em algo que só sabiam ter a ver com direitos humanos. O patrono de tudo era o bispo católico dom Paulo Evaristo Arns. O resultado: calhamaços de documentos organizados, com dados tabulados, editados e publicados, tornando-se sucesso editorial e comercial ao longo de anos. Do lado oposto, militares ligados ao combate à subversão ficaram indignados ao ver os inimigos de ontem tratados como heróis nos novos tempos. Igualmente de forma clandestina, montaram um grupo para produzir sua versão, contando os crimes cometidos pelos "terroristas", fossem ações armadas que implicaram na morte de policiais, militares, inocentes e empresários acusados de financiar a repressão, fossem os justiçamentos em que organizações de esquerda condenaram à morte companheiros tidos como traidores. Sem apoio para sua publicação, o Orvil, como foi batizado (a palavra livro ao contrário, em direta alusão ao Brasil: nunca mais) passou anos como manuscrito secreto, até jornalistas terem acesso a partes dele ou ao documento inteiro. Lucas Figueiredo foi o primeiro a lê-lo na íntegra e a descobrir que, para além de "contar sua versão", o Orvil respondia a questões e até assumia a morte e a destinação de corpos de militantes (como alguns da Guerrilha do Araguaia), com as quais o Exército sempre negou qualquer ligação. Tornou-se, portanto, assim como seu oposto, documento fundamental para entender o país. Recuperar esses dois episódios complementares da recente história do Brasil é o principal mérito de Olho por olho. Mais uma vez, Figueiredo usa as fontes e o texto direto e bem escrito para dar sua contribuição para a democracia brasileira.

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