Diversão e Arte

Sebo de livros no Conic vira local de referência para a poesia local e de compra, venda e troca de livros

postado em 11/08/2009 08:15
[SAIBAMAIS]No coração de Brasília, Ivan da Silva ergueu seus sonhos, a Livraria Presença e, depois, o Café Belas Artes. Não foram sonhos de uma noite só, duraram anos, mas hoje fazem parte do passado. Quis o destino que ele continuasse por ali. Sua vocação de livreiro se confunde com sua resistência pela cultura em Brasília. Há uma década, Ivan da Presença (como é mais conhecido), 60 anos, se dedica ao Quiosque Cultural.

Localizado na praça central do Conic, o sebo é muito mais que uma livraria. Virou um ponto de encontro onde pessoas de todos os tipos se esbarram. "É como a Praça da Alegria, do Carlos Alberto da Nóbrega", compara Ivan. "Mas de alegrias e tristezas", continua, acendendo um cigarro. É também um lugar para se ouvir histórias. Não demoram 10 minutos para alguém parar e começar um papo sobre literatura, política, cultura ou apenas conversa fiada. E não precisa nem ser amigo de Seu Ivan (e eles são muitos). O simpático carioca é bom de prosa. Enquanto o atendimento nas livrarias está cada vez mais impessoal, Ivan representa o atendente à moda antiga. "Ele tem uma relação umbilical com livros", comenta o poeta Zé Edson, 54 anos. "Quem gosta de livros tem que passar pelo Quiosque Cultural(1). Aqui você encontra gente com essa identidade".

Em Brasília por ocasião de um seminário de psicologia, a sergipana Taísa Belém, 32 anos, foi até o Quiosque seguindo indicação de um amigo brasiliense. "Eu queria saber o que fazer no meu tempo livre na cidade e meu amigo disse que eu precisava conhecer o lugar", relata. No Quiosque, a psicóloga achou fascículos da coleção de arte Valor inestimável, sobre pintores famosos. "Estava atrás disso há muito tempo", comemorou. "Em Aracaju, é difícil encontrar um cantinho assim, com coisas interessantes."

Quando Ivan não sabe onde está um dos mais de 12 mil itens de sua loja, procura no catálogo, no computador. Maurício Steiguer, 18 anos, se ofereceu como voluntário para digitar o nome dos livros. "Assim ocupo o meu tempo quando não estou estudando. Gosto daqui. Mexer com livros é legal, dá pra conhecer vários títulos que eu desconhecia", explica. "Acima de tudo, o Ivan ajuda a perpetuar um credo contra o ceticismo que o livro enfrente nos dias de hoje. A internet é imediatista, não te faz pensar. O livro está ali, é um documento, causa uma reflexão", filosofa Chico Porto, advogado e poeta com quatro décadas de Brasília.

O aposentado Roberto Garcia, 52 anos, é um frequentador assíduo. "Conheço o Ivan da época da Presença. Eu venho garimpar vinis todas às sextas. Tem que ter paciência para procurar, mas já encontrei muita coisa boa." Para ele, uma visita ao Quiosque vale mais que uma passada nas grandes livrarias dos shoppings. "Os preços de lá são absurdos", reclama.

O ambiente acolhedor também é um atrativo para a professora Cláudia Amado, 35 anos: "Gosto de sebo. O preço é mais acessível e o Ivan sabe onde estão os livros, conhece o acervo", comenta ela. "É possível procurar livros nos sites das livrarias. Aqui é diferente, existe o contato. Aqui, os livros têm história", observa Lucas Guimarães, 15 anos, filho de Cláudia.

[SAIBAMAIS]A poesia, aliás, tem espaço garantido ali. Toda segunda segunda-feira do mês, poetas da cidade - novatos ou veteranos - têm a oportunidade de declamar sua produção no projeto Poesia de Segunda. Entre um cigarro e outro, Ivan comenta os próximos planos. "Eu e o Reinaldo, da Berlin Discos, vamos organizar uma feira de troca de LPs". E lá se vão 10 anos do surgimento do Quiosque Cultural, cada vez mais, fazendo jus ao nome que lhe batiza.


1 - HISTÓRICO
O Quiosque Cultural surgiu em 1999 a partir de um convite da prefeitura do Conic. "Queriam revitalizar esta área, que antes ficava cheia de mendigos", conta Ivan. Hoje, no local (que se assemelha a uma banca de jornal), ele compra, vende e troca livros. "Como não tenho capital de giro, prefiro trocar. Quando querem vender, eu ofereço um valor. Se a pessoa topar, beleza". Atualmente, mais de 10 itens entre livros, CDs, DVDs, histórias em quadrinhos, fitas cassetes e VHS estão expostos em estantes, prateleiras e caixotes de madeira. Apreciador e defensor da literatura brasileira, o livreiro conta que os títulos mais procurados são os de filosofia. "Mas os de autoajuda são os que o pessoal mais traz pra vender. E o pior é que vende muito", diverte-se.

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