Diversão e Arte

Nova fase do Museu da Imagem e do Som do Rio deixa de lado seu fundador

postado em 16/08/2009 14:04
Uma ausência em especial foi percebida pela maioria dos presentes na festa do anúncio do projeto arquitetônico vencedor do concurso para a construção do novo Museu da Imagem e do Som (MIS) do Rio de Janeiro, na última segunda-feira (10).

Entre dezenas de convidados ilustres, não compareceu Ricardo Cravo Albin, responsável pelo MIS por 18 anos e construtor da engenharia política que garantiu a sobrevivência da memória da mais autêntica cultura popular brasileira, durante o pior período da ditadura militar.

"Não quero entrar numa discussão sem sentido. Muita gente tem me ligado para perguntar e falar bem e mal, mas eu não vou falar mal do meu filho [o museu]", diz, diplomático, entre goles de café depois do almoço. "As pessoas não têm que se atrelar a outras pessoas, mas, sim, a ideias, isso é o que interessa: a manutenção da essência do museu."

O MIS do Rio de Janeiro, pioneiro no país, foi fundado em 1965 pelo governador do estado da Guanabara, Carlos Lacerda, e, em alguns meses, passou s mãos de Cravo Albin, não fundador, mas estruturador do MIS, como se considera.

"Hoje me orgulho de ter fundado 18 museus da imagem e do som pelo Brasil afora. O primeiro foi o de São Paulo, entregue a Rudá de Andrade [filho de Oswald de Andrade] e que, hoje, é um dos principais do país", relata Cravo Albin, advogado por formação, mas que não pratica a profissão, e também jornalista, que se dedicou ao registro do passado e não do presente.

Cravo Albin disse estranhar a maneira como vem se dando a evolução do MIS carioca e não esconde que a mudança não lhe agrada. "Copacabana não precisa de museu, de movimento. Já é muito movimentada. Além disso, o novo museu vai destoar de toda a arquitetura da Avenida Atlântica", comenta.

Ele critica o concurso promovido para a nova sede do MIS. Na terra de Niemeyer, promove-se um concurso internacional e vence um escritório americano! Isto para não falar que já existe um projeto, do arquiteto Glauco Campello, para a construção do prédio anexo do MIS, ao lado da sede na Praça XV.

A sede é um prédio histórico, construído para abrigar a exposição comemorativa do centenário da independência, em 1922. No livro Rastros de Memória, em que conta a história do museu, Cravo Albin incluiu a foto da maquete baseada no projeto de Campello.

O natural seria construir o anexo ao prédio histórico, adverte. Inclusive, fico muito preocupado com o destino que se dará ao prédio do Pavilhão de Exposições. Espero que seja preservada sua importância histórica e cultural.

O memorialista lembra que, ao assumir o MIS, ele era um museu sem dinheiro e quase se acervo, numa época em que o país começava a sofrer a asfixia política e cultural da ditadura militar. Era preciso muito engenho e arte para levar adiante o projeto. "As pessoas chegavam para mim perguntando por que fazer um museu do cinema. Eu explicava que era um museu para a imagem e o som, mas não havia nada parecido no Brasil, nem no mundo", completa.

Assim, Cravo Albin inventou a série Depoimentos para a Posteridade, aberta com o depoimento de João da Baiana, de repercussão imediata na grande imprensa. Para determinar quem deveria gravar sua história, criou vários conselhos, cada um com 30 a 40 membros escolhidos entre artistas, estudiosos, jornalistas, professores, músicos.

Além de indicar as personalidades, os conselheiros davam aulas no próprio museu para turmas abertas aos interessados, nos temas dos cursos, de música erudita a esportes, passando por literatura, cinema, teatros, artes plásticas e cinema.

Cobrava-se barato, o museu ficava com 80% e o professor com 20%, mas mesmo assim não havia dinheiro nem para as fitas de gravação Em nome do MIS, eu pedia as gravações da Aliança para o Progresso, apagava as fitas e gravava os depoimentos, ele revela citando Elizeth Cardoso, Jacob do Bandolim, entre tantos que gravaram suas vozes e histórias para a posteridade, em fitas originais do programa norte-americano de propaganda ideológica.

No governo do general Ernesto Geisel, Cravo Albin chegou a desviar material da representação da Sunab no Rio (Superintendência Nacional de Abastecimento), onde trabalhava como assessor de imprensa, e, por isto, quase foi preso. "Fui pessoalmente ao general João Batista Figueiredo, chefe do SNI [Serviço Nacional de Informação], e expliquei que desviava papel higiênico, lápis, coisas de escritório, para ajudar o museu. Ele me ouviu e disse: Pode ficar tranquilo que eu conheço bandido há muito tempo. Você não está roubando, é um cara honesto. E eu escapei do inquérito e da cadeia", conta.

Com o tempo, ele criou o Golfinho de Ouro, para destaques na vida cultural, e o Estácio de Sá, para os mecenas da área, dois prêmios anuais entregues pelo governador em solenidades que mereciam cobertura de toda a imprensa.

Pelo que fez não só no Rio, mas nos 18 estados onde disseminou os museus da imagem e do som, Cravo Albin esperava ser ouvido agora, sobretudo porque considera-se amigo de Sérgio Cabral, até mesmo pai do governador, que eu peguei no colo, veja você, e também porque sua consultoria é solicitada até no exterior, como no futuro MIS de Angola, projeto da construtora Odebrecht.

Mas não vou apequenar a questão. O importante mesmo é que o museu será enriquecido com novas tecnologias e mais espaço, finaliza.

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