Página central, o primeiro álbum da parceria de Marcos Valle e Celso Fonseca (sim, eles já pensam no volume 2), começa grandioso, com o tema instrumental que dá nome ao disco. Orquestra de cordas, naipe de sopros, baixo, bateria, Fonseca na guitarra, Valle no piano acústico e no elétrico fender rhodes, música para voar. O clima é de Jet-samba, o ótimo CD que Marcos Valle gravou em 2005, mas há outros, variados, ao longo das 11 faixas seguintes. Até porque não se trata de um disco todo instrumental, como o lançado pelo pianista quatro anos atrás. Aqui, das 12 músicas compostas pela dupla (todas são inéditas), sete ganharam letras de Celso Fonseca.
A dobradinha ; iniciada em 2006, quando Valle convidou Fonseca para participar de alguns shows ; funcionou de imediato. Como vinham dividindo o palco, eles já tinham algumas ideias para trabalhar juntos e, no primeiro dia em que se reuniram para compor, fizeram oito músicas numa leva só. ;Eu tinha umas coisas que ele terminava, e vice-versa, ele me mostrava um pedaço, eu completava;, conta Celso. ;Tudo fluiu de maneira impressionante. A ponto de a gente ouvir tudo de novo no dia seguinte, para ver se aquilo era bom mesmo (risos). Aí fizemos as outras em mais um dia e já era hora de combinar a banda;, diz Valle.
Letrista bissexto, Marcos Valle deixou essa função ao parceiro e foi cuidar dos arranjos de base. Para a orquestração, chamou Jessé Sadoc, trompetista e arranjador que já trabalha com ele há um bom tempo. A presença de orquestra era algo que eles queriam desde o início ; e estava prevista desde que quatro amigos ofereceram aos dois o financiamento das gravações. ;A ideia era fazer um disco como antigamente, quando orquestras eram contratadas pelos estúdios. Hoje em dia, é difícil ter orçamento para isso;, comenta Valle, que achou viável a parceria desde o dia em que ouviu o trabalho de Celso com Ronaldo Bastos. ;Temos influências abertas, não somos presos a nenhum estilo.;
Afinidades
Os dois têm muito em comum, sim, e não só pelo fato de serem chamados de ;pós-bossa-novistas; ; o que, apesar da boa referência, reduz (ou aprisiona) um pouco o trabalho de ambos. Eles bebem em várias fontes e têm muitas afinidades musicais. ;Nós dois gostamos de Caymmi, Gil, Caetano, Milton, Lulu Santos, Patife, Luiz Gonzaga, de frevo, de Miles Davis, Burt Bacharach, Steely Dan;, enumera Valle, o ;da segunda geração da bossa nova;, que também sempre foi referência para Celso, ;da terceira geração;. ;Ele tem a influência do baião, e eu do samba. Ouviu muito Beatles, eu também. A gente gosta de Stevie Wonder e adora Burt Bacharach;, completa Celso.
O trio Azymuth, também admirado pelos dois, é um dos convidados (1)especiais do álbum. Marcos Valle, que é padrinho do grupo (o nome do trio vem de uma música dele), achou que um dos temas instrumentais, Faz de conta, tinha a cara deles e chamou os três para a faixa. A ideia veio de Celso Fonseca, que no começo da carreira ; quando tinha uns 20 e poucos anos e tocava com Márcio Montarroyos ; participou de uma turnê do Projeto Pixinguinha ao lado deles. ;Sou fã do Azymuth, são três grandes músicos;, elogia o guitarrista, que, assim como o trio (e o próprio Marcos Valle), faz mais sucesso fora do Brasil do que aqui.
Desde 2003, Celso Fonseca cumpre turnês regulares na Europa, nos Estados Unidos e no Japão. No exterior, tem discos lançados pelo selo Ziriguiboom/Crammed (o mesmo de Bebel Gilberto), lota teatros de 1.200 lugares e, agora, vê Página central chegar ao mercado japonês. Marcos Valle, que esteve em Tóquio recentemente, espera voltar até o fim do ano com o novo show(2). Está, aliás, numa animação só: ;Ah, estou feliz, sim. Opa, mais um que deu certo! Vamos para o próximo!” E vem mesmo um volume dois? Quem responde é Celso: ;Claro! Até porque a gente não fez só essas 12 músicas. Foram umas 18 (risos);.
1 - O cello e a voz
Jaques Morelenbaum também participa de Página central, tocando violoncelo em Encantadas (;Essa música pedia um cello, pensei nele imediatamente;, conta Marcos Valle). Nas outras quatro faixas instrumentais do CD, ele aparece como um dos 16 integrantes da orquestra de cordas. Outra convidada do álbum é Patrícia Alví, que canta a sexta faixa, Ela é aquela (;Ela é aquela me faz sonhar/ Bela melodia me fez cantar;).
2 - Na estrada
Para a temporada brasileira, a ideia é estrear com banda grande (incluindo três metais e quatro violinos) no Rio de Janeiro e percorrer outras cidades com o grupo de base ; baixo, piano, bateria e dois metais ;, chamando músicos locais, o pessoal das orquestras, para subir ao palco. ;A gente chegaria uns dois antes, com as partituras, para ensaiar com eles;, diz Valle. ;Assim, além de diminuir os gastos, daria para manter uma sonoridade legal no palco."
Ouça trecho da música Página Central de Marcos Valle e Celso Fonseca