Em dias comuns, você encontra a assistente de paisagismo Geísa Costa, 56 anos, por aí pela estrada, dirigindo carro abarrotado de plantas. Em época do Cena Contemporânea - Festival Internacional de Teatro de Brasília, ela pode ser vista em outro tipo de maratona. Em vez de ziguezaguear de jardim em jardim, pega o veículo e peregrina pelos teatros do Distrito Federal. Ano passado, atingiu o máximo da produtividade. Viu 17 espetáculos em 13 dias de festival. Agora, está com 16 ingressos em mãos para acompanhar a décima edição da mostra brasiliense, que começa nesta quarta (2/9) e segue até o dia 13.
- Fui a primeira a comprar na bilheteria. Há dois anos, fui eleita a espectadora-padrão do Cena, conta orgulhosa.
O título foi dado pelo próprio Guilherme Reis, curador e idealizador do Cena Contemporânea. De tanto ver Geísa nos foyers dos teatros, ele resolveu publicamente homenageá-la. Foi um dia especial na memória dessa mineira que chegou a Brasília em 1991.
- Estava subindo a rampa da Sala Martins Pena quando ele abriu os braços e me agradeceu por prestigiar os espetáculos. Depois, me presenteou com a camisa que guardo até hoje, lembra.
Nas memórias de Geísa, há grandes espetáculos que ainda se movimentam em lembranças. Um deles é K.I de Crime e castigo, interpretado pela atriz russa Okasana Myssina, em 2006. Em estrutura construída no Espaço Cultural Renato Russo (508 Sul), o diretor Kama Ginkas levantou poderosa montagem a partir da obra-prima de Fiodor Dostoievski.
- Era um espaço reservado para poucos espectadores. Eu estava lá com aquela atriz bem perto de mim, dizendo coisas numa língua que misturava russo com português, suspira Geísa, que elegeu para ver, neste ano, os espetáculos internacionais (sobretudo Kiss Bill) e os nacionais.
Oficial de projetos da Unesco, Adauto Cândido Soares, 45 anos, faz cuidadosamente o planejamento para conferir os espetáculos do Cena Contemporânea. No entanto, com a experiência amadurecida no festival, aprendeu que tudo pode mudar no burburinho das filas. Ali, atento, descobriu, no boca a boca, montagens imperdíveis como A história de Jerry e o cachorro.
- Aí, nessa hora, corro, troco e vendo os ingressos para ver aquele espetáculo comentado, conta.
Adauto, que nunca vai esquecer o espetáculo japonês Kagemi (2007), gosta de acompanhar o teatro feito na cidade, e o Cena tem ajudado ele nessa empreitada.
- Depois do Festival de Cinema, o Cena Contemporânea é o principal evento da cidade. A gente não tem tanta opção durante o ano e, de repente, vem uma quantidade grande de bons espetáculos do mundo, do Brasil e de Brasília. É tanta festa em todas as salas de teatro, observa.
E justamente esse alinhamento entre as produções locais, nacionais e estrangeiras que anima a publicitária Cláudia Pereira a participar ativamente do Cena Contemporânea. Nesse tempo de festival, a oportunidade é única para ela observar tendências estéticas (luz, figurino, cenário). Ela lembra, por exemplo, que ficou abismada com a montagem 666, do grupo espanhol Yllana, cujos atores saíam com serra elétrica sobre a plateia da Martins Pena.
- Esses espanhóis tinham um senso de humor que me impressionou profundamente ao falar de temas como violência e morte. Nesse sentido, acredito que o Cena Contemporânea entende o papel de Brasília como capital do país ao promover a interação da cultural local, nacional e internacional. Eis a maravilha desse festival, aponta Cláudia Pereira, que nesta primeira semana, vai conferir Rainha(s), Kiss Bill, The hobo grunt Cycle e Aprirs pas corps.