Nahima Maciel
postado em 20/09/2009 08:00
Quando se trata do grande cubo branco ; expressão usada pelos artistas para definir a galeria ; tudo é muito confortável. O espaço destinado a receber obras de arte oferece a segurança de que ninguém vai pisar ali com outra intenção além de contemplar os trabalhos dos artistas. Permite-se um certo grau de ousadia e, às vezes, até uma excentricidade considerada por muitos como maluquice. Foi para questionar exatamente a segurança e o conforto da galeria que um grupo de 10 artistas fez o movimento contrário.Orientados por Gê Orthof e Karina Dias, eles conceberam obras para espaços privados e ocuparam 10 residências escolhidas com ajuda de anúncio de jornal. Motivados pela curiosidade de observar como suas obras se comportariam dentro de uma casa, montaram instalações entre camas, mesas, fogões, geladeiras e sofás. Durante um mês, apenas os moradores e seus amigos puderam conhecer as obras. Agora é a vez de levar o conjunto para o conforto da galeria e disponibilizar os trabalhos para o público em geral. Moradas do íntimo, em cartaz no Espaço Cultural Marcantonio Vilaça, reproduz parte da experiência e serve de ilustração para acompanhar o que se passou em cada uma das residências escaladas para o projeto.
A artista Cecília Mori se encantou pela casa da psicóloga Rosa Paiva, um apartamento no Sudoeste cheio de cantos propícios à instalação construída com fios de lã e sombras ;A experiência é muito diferente. Na casa dos outros você fica um pouco tenso, meu trabalho precisava de furos na parede e fiquei preocupada se ela ia gostar. A ideia foi bacana por isso. Meu trabalho é mais formal, faz uma tipologia do espaço;, conta Cecília. ;Foi excelente, aproveitei que tinha acabado de mudar e aproveitei para receber os amigos. Todo mundo veio conhecer a obra;, garante Rosa, que acabou ganhando a instalação de presente. ;É engraçado como cada pessoa tem uma percepção. O trabalho mexe com luz e sombra e, como ficou na minha casa, pude ver como mudava durante o dia.;
Com sensores encontrados em aparelhos de odorização de ambiente, vendidos em supermercado, Milton Marques fez máquina que registrava movimento dos moradores da casa. ;A ideia era que o progresso do trabalho ocorresse de acordo com a presença das pessoas que habitam a casa.; As imagens acabavam impressas em um rolo de papel. Na galeria, Marques mostra o equipamento desativado e um conjunto de 150 fotografias realizadas durante o período em que a obra esteve numa casa no Lago Norte.
Construir a instalação na casa de uma pessoa pode ser tão fascinante para certos artistas que se torna quase impossível imaginar a obra em outro lugar. Aconteceu com Gê Orthof. ;Meu trabalho foi feito em função da casa;, diz. ;E estou até trazendo uma mesa que encontrei lá. Não consigo mais imaginar a obra sem essa mesa.; Intitulada Escuta, a obra é uma reflexão sobre as diferenças entre o falar e o escutar. ;Foi uma aprendizagem perceber algumas coisas. Sabemos do efeito do famoso cubo branco e pudemos perceber como é radicalmente diferente a obra no espaço mercadológico e na casa.;
A versão de Moradas do íntimo para a galeria tem também um vídeo montado com imagens realizadas durante a execução do projeto nas residências. Uma espécie de making of mostra as etapas da concepção e adaptação dos trabalhos aos espaços íntimos e privados. ;É interessante ver como a cidade aparece na exposição. Podemos ver todos os cantos de Brasília dentro da galeria. É como se fosse um tour pela cidade por dentro das casas;, compara Orthof.
MORADAS DO ÍNTIMO
Visitação até 24 de outubro, de segunda a sexta, das 10h às 19h, e sábado, das 14h às 18h, no Espaço Cultural Marcantonio Vilaça (TCU, SAF Sul Q. 4 Lt. 1; 3316-5221 e 3316-5036).