postado em 19/10/2009 08:45
Qual o segredo de um homem de quase 70 anos, potência vocal mediana e nenhuma mobilidade no palco? Uma pessoa com boca de lábios finos, cabelos dominados por chapinha e que parece ser tão conservador quanto as ombreiras que insiste em usar. E ele ainda fala ;bicho;. Que homem é esse que, quando suspira ao microfone, o auditório vem abaixo?Na noite de sexta-feira, na área externa do Ginásio Nilson Nelson, as pessoas já estavam com a ansiedade alegre de quem vai para uma grande festa, como a dona de casa Maria do Rosário Soares, 58 anos. ;Gosto dele deste pequena e venho a todos os shows;. A funcionária pública Arlene Mascarenhas, 54 anos, foi mais explícita: ;Eu amo o Roberto Carlos desde os 12 anos;. Bem-vestidas, elas foram ocupando assentos na arquibancada, indicada pelo cartaz ;arquiplateia;, e no setor de cadeiras. Em pouco tempo, o ginásio lotou com 12,8 mil fãs.
Às 21h30, a banda subiu ao palco. Sinal de que o Rei tem respeito pelo seu público e não o deixa esperar. Sete minutos depois, com terno cor de areia e camisa branca, o cantor aparece e uma comoção toma conta do lugar. Mais do que isso: beira a devoção endereçada aos santos. O que esse homem tem? ;Meu pai levava a família para Litorânea, em São Luís do Maranhão, e a gente cantava ;um dia a areia branca teus pés irão tocar ;;, lembrou a cabeleireira Aldaci Souza Aragão, 45 anos, acomodada na arquibancada, com entrada a R$ 100.
Na quarta fila do Setor Azul, cor favorita do ídolo, com ingressos a R$ 700, estavam as amigas Francisca Lima e Leni do Espírito Santo. Haviam chegado naquele dia de Cuiabá só para ver o Rei. ;Ele é o amor da minha vida;, derreteu-se Francisca. ;Quando eu estou aqui, eu vivo esse momento lindo;. Bastam os acordes iniciais e os fãs logo identificam aquela música entre as cerca de 500 compostas ao longo de 50 anos e distribuídas em 56 álbuns. Ao violão, Roberto toca ;Não adianta nem tentar me esquecer;. ;Eu amo ele de paixão. Tenho a coleção completa em casa e minha filha vai me dar a viagem com ele no navio, meu maior sonho;, encanta-se a aposentada Regina Bianchi, 64 anos, ao lado da filha, feliz em ver a alegria da mãe.
O roteiro do espetáculo de 28 músicas inclui textos ditos com a maior simplicidade pelo Rei: ;Hoje, a gente não pode ver a novela, mas eu vou cantar pra vocês uma canção; e começa: ;A mulher que eu amo é o ar que eu respiro ; o chão que ela pisa se enche de flor;. Nessas alturas, vendo aquela multidão balançando pra lá e pra cá, como se fosse um pêndulo, fica fácil entender por que as pessoas gostam tanto do Roberto Carlos. Ele canta o que qualquer ser humano gostaria de ouvir, fazer, sonhar. ;É o amor;, resume Talita Cristino, de 22 anos. ;Ele sabe expressar em palavras o que todo mundo sente.;
Romance puro
Quando o show envereda pelas canções sensuais, então, é um êxtase só. No fundo do palco, surge um enorme coração felpudo e rosas vermelhas. Piegas? E daí? ;Eu te proponho te dar meu corpo, depois do amor, o meu conforto;. E emenda: ;Os botões da blusa que você usava;, para terminar a sequência quase sussurando: ;Amanhã de manhã, vou pedir o café pra nós dois;. Gritos, arrepios, delírio.
Às 23h, ele apresenta a banda, a RC 9, ;que me acompanha desde quando eu tinha topete;, o maestro Eduardo Lages, ;responsável pelos arranjos dos meus discos. Discos nem se diz mais, bicho;, conclui o Rei. Mas o show não acabou. A parte final é dedicada à Jovem Guarda (É proibido fumar, Quando etc.) e, na última música, Jesus Cristo, a frente do palco é liberada para os fãs disputarem as rosas jogadas pelo ídolo. Espremida lá na frente estava Adnélia dos Santos, 55 anos, que entrega, ao assistente de palco Maurício, um grande boneco que traz, na capa vermelha, a inscrição: RC, meu super-homem é você.
;Tenho mais de 200 rosas que ele me deu;, orgulha-se a assistente fiscal Lídia Aparecida Mendes, 47 anos, fã desde os 8 anos e que acompanha as turnês do cantor desde 2004. Vai a todos os shows ;no Brasil e no mundo;. Quando volta para casa, em São Paulo, coloca as rosas para secar e as acomoda num aquário seco, adormecidas em cima de uma areia azul e branca. Lídia protegia a flor com as mãos em concha, como se resguardasse um filhote de passarinho.
Aos maridos, resta acompanhar e cuidar dos efeitos colaterais de tanta paixão. Depois de entregar um cachimbo e porta-cachimbo ; com a inscrição Meu rei, como é grande o meu amor por você ;, a funcionária pública Fátima Amaral passou mal e teve de ser removida pelos brigadistas para a ambulância. ;Ela é hipertensa e muito emotiva;, disse o marido, Edivar de Paula, militar, 54 anos. Ao lado da primeira-dama do DF, na primeira fila do show, o governador José Roberto Arruda, anunciava: ;Queremos trazê-lo para o show dos 50 anos de Brasília;. Tomara, meu Deus, tomara!