postado em 25/10/2009 19:58
Grandes temporadas, casa cheia, sucesso de público. Quando essas expressões são ouvidas, logo se imagina um teatro com centenas de pessoas a aplaudir de pé o fim do espetáculo. Essa, no entanto, é a realidade de casas com menos de 100 m;, situadas, em geral, nos subsolos de comerciais, desconhecidas do grande público brasiliense. Os teatros de bolso, com capacidade para até 100 pessoas, têm pipocado pelo Distrito Federal nos últimos cinco anos. Oferecem uma experiência diferenciada: contato do público com a criação teatral, em espetáculos das companhias locais e envolvimento em atividades culturais. ;Os espaços mantidos por grupos pequenos são muito interessantes;, acredita o dramaturgo Plinio Mósca, que administrou um teatro de bolso por sete anos e hoje procura parceria para estabelecer outro projeto. Com 25 anos de carreira, Plínio Mósca acredita na força da geração de cultura por meio da programação variada e com longas temporadas proporcionadas pelo formato. ;Quando se mantém um teatro de bolso com ensaios, oficinas e espetáculos, proporciona-se uma agenda maleável. Você pode ter uma peça infantil pela manhã e uma mais adulta e audaciosa no fim da noite;, complementa.
Negócio rentável? Nem tanto. Grande parte dos grupos que abriu o próprio teatro oferece ingresso gratuito e busca sustentação por meio de políticas públicas ou aulas de atuação, figurino, cenografia. Em grande parte, os teatros de bolso do DF estão ligados às associações de artistas, com objetivo de desenvolver atividades junto à comunidade. ;É uma forma de incentivar a participação e promover a inclusão cultural por meio do teatro;, explica o bonequeiro Aírton Maciano. Após 23 anos de teatro popular, ele decidiu montar o Espaço Cultural Bagagem, em 2004, por exigência do público infantil que acompanhava o seu trabalho no Gama e cobrava apresentações frequentes.
Desde então, o Bagagem recebe pessoas de todo o DF no pequeno espaço no subsolo, que serve como escritório, teatro e camarim. ;O ator tem de se vestir, maquiar e concentrar antes da entrada do público. Quando a sala atinge a lotação, com 60 pessoas, o espetáculo se torna extremamente intimista. Ainda mais quando voltado para crianças, que desconhecem o limite do palco;, destaca. No andar térreo, funcionam a oficina de bonecos e a recepção ao público ocasional, que passa pelo local em busca de bate-papo e descontração.
A atividade junto aos moradores locais rendeu frutos em Taguatinga e chegou a extrapolar a capacidade do Ponto de Cultura Invenção Brasileira, fundado por Chico Simões, em 2005, com patrocínio do Fundo de Apoio à Cultura (FAC). A sede escolhida fica em loja no Mercado Sul de Taguatinga, comprada com as economias do artista. A partir dos recursos públicos para fomentar programação, Chico fortaleceu o trabalho desenvolvido com a companhia Mamulengo Presepada. ;Foi possível desenvolver cursos regulares, produzir revistas e vídeos. A vizinhança, altamente marginalizada, transformou-se com o trabalho coletivo;, conta Chico Simôes.
Com o fim do convênio com o governo, a companhia se mudou mais uma vez de sede para voltar a atuar junto à comunidade de Taguatinga. O teatro de bolso, entretanto, continua mais que vivo e no mesmo local.
Financeiramente estáveis na Europa, onde os teatros de bolso são reconhecidos pelo governo como centros de pesquisa e, por isso, subsidiados, o formato é recente no Brasil e não possui políticas públicas asseguradas. Em Brasília, eles começam a ser vistos pela nova geração como uma forma de vivência cênica. Aberta no início deste ano em uma comercial da W4 Norte, a Escola Teatral Confins-Artísticos (Etca) garante a manutenção do espaço próprio com aulas de teatro e o aluguel do local, composto por salas de aula, lanchonete, estúdio para gravação musical e um pequeno teatro de 30 lugares, com iluminação e sistema de som. ;Começamos a trabalhar na Universidade de Brasília (UnB),em 2002, e vimos que seria vantajoso ter sede para dar continuidade aos projetos autorais;, conta o proprietário, Gustavo Rainecken.
A programação do teatro de bolso ainda é tímida, com apresentações dos alunos a cada três meses e algumas montagens desenvolvidas pela equipe espalhadas ao longo do ano. ;Apesar da boa recepção, ainda não existe uma tradição consolidada entre o público. É insustentável deixar uma temporada em cartaz por muito tempo;, afirma Rainecken. Para atrair audiência, os espetáculos da companhia têm abordagem diferenciada ; são apresentados em encontros com música e degustação.
Conquistar público também representa um desafio para o diretor Cláudio Chinaski, que abriu o Espaço Cultural Mosaico em 2008. ;Costumo brincar que Brasília tem 500 pessoas interessadas em teatro. O restante da população não busca esse tipo de entretenimento, apenas quando há divulgação pesada. Apesar disso, a casa enche em função do público que acompanha o nosso trabalho.; Além da administração, Cláudio atua como produtor cultural e convida grupos de outras cidades a se apresentarem no local, como o paulistano Club Noir, que está em cartaz hoje com a peça Comunicação a uma academia.
Cursos
Apesar das dificuldades, alguns grupos mais antigos provam que manter teatro de bolso e escola é uma realidade possível e rentável. A Companhia da Ilusão, instalada há 15 anos na 510 Sul, mantém um curso de formação com duração de dois anos que atende a 14 turmas por semestre, todas agendadas com montagens de comédia, tragédia grega, teatro do absurdo e drama realista. Uma área específica da companhia se responsabiliza pela produção e pesquisa para novos espetáculos.
No Mapati, os 20 anos de teatro de bolso mostram uma trajetória de adaptações ; antes, o lugar fazia parte da residência da proprietária, Tereza Padilha, até a transferência, em 1995, para a 707 Norte. ;É muito difícil manter um espaço pequeno porque tudo custa caro. Há demanda com limpeza de cortina, segurança, ventilação. Quando a coisa apertava, fazíamos festas para levantar fundos;, lembra Tereza, que ampliou a atuação do Mapati para abrigar colônia de férias e projetos sociais, mas continua as aulas de teatro, com 10 turmas.
Criado em 2005 como uma extensão do Cena Contemporânea, o Espaço Cena é um caso à parte entre os teatros do bolso. Sem cursos na programação, parte dos recursos de escritório é mantida pelo projeto permanente do festival junto ao Fundo de Apoio à Cultura (FAC). O orçamento se complementa com o aluguel do espaço, a R$ 180 por apresentação. ;Dessa forma, podemos manter o Cena aberto ao público durante todo o ano para pesquisas em nosso material de arquivo, ciclos de leitura e exibição em vídeo de espetáculos de todo o mundo;, detalha o idealizador do projeto, Guilherme Reis.
Onde assistir
Caleidoscópio
(CLSW 102 Bl. C, Galeria; 3344-0444)
A partir de 30 de outubro, Estação Felicidade, direção de Túlio Guimarães. Não recomendado para menores de 14 anos.
Companhia da Ilusão
(SCRS 510, Bl. C, Entrada 18; 3242-3544)
Espetáculos a partir de 17 de novembro.
Espaço Cena
(205 Norte, Bl. C, Lj. 25; 3349-3937)
Hoje, às 20h, Preso entre ferragens, direção de João Antônio. Ingressos: R$ 20 e R$ 10 (meia). Não recomendado para menores de 14 anos.
Espaço Cultural Mosaico
(714/715 Norte, Bl. D, Lj. 16; 3032-1330)
Hoje, às 20h, Comunicação a uma academia, adaptação de texto de Franz Kafka com direção de Roberto Alvim. Entrada franca. Não recomendado para menores de 14 anos.
Escola Teatral Confins-Artísticos
(SCLRN 711, Bl. C, Lj. 5; 3274-8160)
Programação aberta.
Mapati
(707 Norte, Bloco K, Lj. 5; 3347-3920)
Espetáculos a partir de 20 novembro.
Invenção Brasileira
(Mercado Sul de Taguatinga, QSB 13, Bl. B; 3352-5054)
Programação aberta.
Espaço Cultural Bagagem
(Setor Central do Gama, Qd 40, Lt. 16; 3556-6605)
Dias 30 e 31, às 20h, El titiriteiro de Banfield, com o bonequeiro argentino Sergio Mercurio. Entrada franca e classificação indicativa livre.