Diversão e Arte

Em plena forma, Bibi Ferreira volta à cidade para cantar os clássicos de Edith Piaf

As apresentações são nesta quarta (11/11) e quinta (12/11), na Sala Villa-Lobos

postado em 11/11/2009 08:10
Papai Procópio Ferreira (1898 ; 1979) não titubeou quando começou a perceber que a filha Bibi, ainda na tenra idade, já dava sinais de grande talento e, num golpe de orgulho extremo, vaticinou: ;Através de você, viverei duas vezes;. A história, quem conta, com esgar de emoção na voz, é a própria artista, em Brasília para duas apresentações de Bibi canta e conta Piaf, hoje e amanhã, na Sala Villa-Lobos do Teatro Nacional Claudio Santoro. É a segunda vez que a atriz, cantora, diretora e compositora brasileira desembarca na capital com orquestra, na montagem que, desde 1983, homenageia a cantora francesa. A última foi em agosto do ano passado. ;Vou continuar fazendo Piaf; enquanto o público pedir;, diz, animada.

Bastante disposta e bem-humorada, Bibi recebeu a imprensa para coletiva, na última segunda-feira, no Churchill Lounge Bar do Hotel Nacional. Aos 87 anos, mas com uma disposição de dar inveja a muitos jovens, a artista falou sobre a importância dos musicais na sua trajetória, de como a intérprete francesa Edith Piaf entrou em sua vida e da relação carinhosa que tem com Brasília, um lugar, segundo, ela, exótico. ;É uma cidade curiosa, diferente de qualquer outra lugar do mundo, e acho que de qualquer outro planeta também. Mas é uma cidade linda;, brinca. Também comentou, orgulhosa, da homenagem recebida no Tribunal de Contas da União (TCU), na semana passada, quando recebeu o Grande Colar do Mérito do TCU. Evento que contou com a presença do vice-presidente, José Alencar. ;Foi uma comemoração digna e patriótica, me senti orgulhosa de ser brasileira;, comenta.

As apresentações são nesta quarta (11/11) e quinta (12/11), na Sala Villa-LobosNo palco da Sala Villa-Lobos, a dama do teatro brasileiro divide as atenções com o coral da UnB e o maestro Nelson Melim. Quem teve a oportunidade de ver a apresentação da artista no ano passado sabe que a empatia da diva com o público é intensa. Sempre animada, ela aproveita para contar, entre o intervalo de clássicos como La vie en rose, La ville inconnue e Je ne regrette rien (também vertida para a voz de Cássia Eller), histórias de uma mulher que ;teve muitos amores e amou com uma paixão sem igual;. ;Eu sou muito disciplinada para cantar. E Piaf não precisava ser disciplinada para cantar porque ela tinha um talento tão grande que, para ela, cantar era fácil;, comenta Bibi, que se diz admirada com o espanto das pessoas com os seus 87 anos. ;As pessoas se espantam com o fato de como ando bem e com a qualidade vocal que tenho até hoje;, detalha. ;Outro dia, participava de evento em homenagem aos médicos e eles disseram que sou um fenômeno vocal porque a primeira coisa a envelhecer é a voz. De modo que faço parte de uma elite biológica. Gostei dessa;, ri.

; Depoimento: Bibi encantada
Irlam Rocha Lima

;Tenho acompanhado a trajetória de Bibi Ferreira nesse espetáculo maravilhoso em que celebra Piaf, desde a estreia em 25 de maio de 1983, no teatro do Clube Ginástico Português (hoje Sesc Ginástico). Por sorte, estava no Rio de Janeiro naquela época e pude aplaudi-la, interpretando, de forma irrepreensível, canções e momentos da vida e da carreira desse mito da arte na França.

Em fevereiro de 2004, quando Bibi canta Piaf comemorou 20 anos, com pequena temporada no Teatro Maison de France, testemunhei, ao final da apresentação, Fernanda Montenegro, Natália Thimberg e Eva Todor (outras três divas do teatro e da televisão brasileira) reverenciarem essa baixinha magistral, que se agiganta em cena.

Bibi, que já viera à capital com o musical em duas oportunidades, voltou à Sala Villa-Lobos em 20 de agosto ano passado e comemorou com o brasiliense os 25 anos de sucesso do Piaf, demonstrando como se mantinha em plena forma aos 82 anos.

Generosa, em entrevista ao Correio, foi toda elogios a Piaf, um hino ao amor, de Olivier Dahan ; em cartaz naquele momento ;, que classificou de ;primoroso; e , em especial, a atriz Marion Cotilard, cuja performance foi vista por ela como ;deslumbrante;. Rever Bibi em Piaf, em seu retorno ao Teatro Nacional, mais que uma obrigação de ofício, é algo ligado ao prazer, ao encantamento.;

; Memória: o teatro em pessoa
Sérgio Maggio

A ligação de Bibi Ferreira com Brasília é mesmo afetiva. Passa pela amizade de vida que constituiu com Dulcina de Moraes, ainda quando era uma menina que via o pai, um dos maiores atores deste país, aventurar-se na loucura de fazer teatro no Brasil do início do século 20. Vinda dessa escola de teatro feito por apaixonados, no verdadeiro sentido dos amadores, que em companhias cortavam o interior, Bibi Ferreira riscou uma das carreiras mais produtivas do país. Hoje, está absolutamente ativa revezando-se entre a direção diversificada de montagens e os musicais, como este, um marco que nunca deve sair de cena.

A amizade entre Bibi e Dulcina é comovente. Foi delicadamente relatada por Sérgio Viotti na biografia dedicada à criadora da Fundação Brasileira de Teatro (FBT). Amigas, as duas nunca se dissociaram, na alegria e na tristeza, quando Dulcina adoeceu e teve dias de dificuldade financeira. Sempre por perto, Bibi até hoje é a voz que se levanta para que a obra de Dulcina de Moraes se perpetue e jamais seja ameaçada pelo descaso. Frequentemente, Bibi Ferreira anuncia a necessidade de reformar o Teatro Dulcina de Moraes e de preservar o acervo da atriz e diretora, disponibilizando-o ao público.

Associada intimamente ao teatro, Bibi Ferreira sempre deixou fortes marcas quando pisou no palco como atriz. A interpretação de Joana, a Medeia carioca de Gota D;àgua, até hoje está na memória de quem ficou diante dela no palco. Nesses milagres tecnológicos do século 21, há trechos da montagem no YouTube. Num deles, Chico Buarque diz: ;É um espetáculo da Bibi. Feito para Bibi brilhar e ela brilha.;

Além desse musical Piaf, Bibi tem o show dedicado à dama do fado, Amália Rodrigues, tão poderoso quanto o dedicada à musa francesa. Em comum, há a preocupação da artista de não só emprestar a voz, mas, sobretudo, de encarnar a energia das homenageadas. No centro do palco, cercada por instrumentos, Bibi Ferreira é soberana não só pelo dom de cantar. Mesmo ali, no que parece cenicamente simples, ela põe o corpo de atriz em favor do objetivo maior de encantar a plateia.

É uma honra o Brasil ter uma artista do porte de Bibi Ferreira trocando de palco com o mesmo prazer de quando era uma menina encantada pelo teatro. A cada reverência que ela fizer, hoje e amanhã, na Sala Villa-Lobos, saibamos que estamos aplaudindo uma grande parte da história do teatro brasileiro.

Bibi canta e conta Piaf

Direção de Nelson Melim. Com Bibi Ferreira. Hoje e amanhã, às 21h, na Sala Villa-Lobos do Teatro Nacional Claudio Santoro. Ingressos: R$ 160 (inteira) e R$ 80 (meia para estudantes, professores, pessoas maiores de 60 anos e doadores de 2kg de alimentos não perecíveis). Não recomendado para menores de 12 anos.

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