postado em 09/12/2009 08:23
Em seu novo e décimo livro, A natureza humana, Eudoro Augusto faz uma revisita à sua própria poesia e seleciona textos de três volumes já publicados: O desejo e o deserto (1989), Olhos de bandido (2001) e Um estrago no paraíso (2008). Cada obra, respectivamente, dá nome aos três primeiros capítulos. No último, de título homônimo ao do livro, Eudoro apresenta poesia inédita.
Os versos do escritor, jornalista e professor, nascido em 1943, em Portugal, e desde 1953 residente no Brasil, falam sobre emoções e relacionamentos humanos com bom humor, um lirismo delicado e um erotismo espontâneo, como nos versos de Valsa suburbana e A natureza humana. "Meu conceito de arte, em particular, envolve a ironia, a brincadeira. Gosto muito de confundir o leitor, a ponto de ele não saber quando estou falando sério e quando estou brincando", comenta.
Valsa suburbana
O poderoso farol de milha
persegue um vestido estampado
que desceu do trem noturno
sem dizer aonde vai
sem dizer de onde vem.
Com a alma apertada
suando entre as pernas
o incógnito poeta
assobia uma valsa secreta
Amor febril
Eudoro também escreve poemas românticos cortantes, carregados de densidade e observações sobre desespero, saudade e separação. O amor é descrito como algo febril, nas vezes em que a pessoa amada está perto. E como algo dilacerante, quando as recordações são a única coisa que restou de um relacionamento alegre e prazeroso. Os extremos podem ser identificados claramente em O passar das horas e No meio da noite.
O passar das horas
No âmago da madrugada
ela abre os braços e estende o tapete
que nos conduzirá sem demora
ao palco circense de seu ventre.
Ali eu viro palhaço e ela cantora
eu viro leão e ela domadora
e ninguém mais parece sentir
o ronco do tempo e o passar das horas
No meio da noite
Acordo tremende de frio.
Logo depois ardo em calor.
Outra vez essa febre. Outra vez você
Acelerado
Os poemas curtos, de ritmo veloz e conteúdo sincero, explicitam a habilidade de Eudoro em falar sobre o que sente em um espaço tão pequeno, de uma maneira tão bem-humorada, objetiva e sensível. "Minha fonte mais direta de inspiração é a possível poesia do cotidiano ou a falta de poesia do cotidiano. Os poemas são como polaroides da vida urbana", explica o autor. Em A natureza humana, vê-se que a arte precisa de muito pouco para definir sentimentos que parecem precisar de muito para serem conhecidos. Eudoro faz isso em até duas linhas, a exemplo de Clique: Em caso de dúvida / fique com a vida.
A NATUREZA HUMANA
De Eudoro Augusto. Edições do Sudoeste, 280 páginas, R$ 30. O livro será lançado hoje, a partir das 20h, no Beirute (109 Sul, Bl. A).