postado em 22/12/2009 08:06
Foi o poeta Ferreira Gullar quem disse, citando a influência do arquiteto francês Le Corbusier na obra de Oscar Niemeyer, na arte, tudo é "herança e transformação". Máxima que se encaixa, com perfeição, à biblioteca do poeta, escritor, crítico literário e conferencista Cassiano Nunes, morto em outubro de 2007. Atualmente, esse acervo se encontra em poder da Biblioteca Central da Universidade de Brasília (UnB). São aproximadamente 17 mil títulos - livros (alguns raríssimos), obras de consultas, como dicionários e enciclopédias, além de revistas, que hoje poderão ser usufruídos por leitores de todo o país. O espaço homenageia o autor de poemas, como Alta noite e Sacrário. "A importância de ter esse acervo na UnB é de dar mais oportunidade de acesso aos usuários. É uma coleção muito valiosa, que enriquece a biblioteca. Havia títulos que não tínhamos", avalia a professora Sely Maria de Souza Costa, diretora da Biblioteca Central.
Doado pela família, poucos dias depois da morte do artista, o vasto material não poderia estar em lugar mais apropriado. Fora ali, durante 25 anos, de 1966 a 1991, que Cassiano Nunes dedicou seu tempo a ensinar literatura a várias gerações. A doação para a Biblioteca Central da UnB é a materialização de um desejo do próprio poeta santista. "Fui depositária desse desejo dele, realizado pela família poucos dias depois da sua morte", lembra a professora aposentada Maria de Jesus Evangelista, curadora da obra e uma das grandes amigas de Cassiano. "Minha amizade com Cassiano vinha desde 1966, quando o recebi no Instituto de Letras da UnB. Nossa relação evolui de professor para aluna à companheira e, depois, biógrafa", comenta a professora, que trabalha numa biografia sobre o poeta. "Só falta, eu sentar e escrever", adianta.
Pelos menos 75% do acervo já passou por processo de higienização e catalogação, esforço que ocupa quatro estantes das seis que fazem parte da Sala Cassiano Nunes. Esse material já está disponível aos visitantes. Devido à raridade da coleção, os livros não podem ser retirados do espaço. "É só para consulta local", esclarece a bibliotecária Ana Jesuína, desde junho de 2008, uma das integrantes da equipe do espaço. "A procura pelo acervo tem sido bastante diversificada, desde a comunidade universitária, passando pelos alunos do 2º grau, até gente que só encontra o que precisa na coleção de Cassiano."
A expectativa é de que, até o fim do primeiro semestre de 2010, o restante do material esteja completamente disponível virtualmente no sistema da Biblioteca Central. "A próxima etapa é a restauração de alguns títulos que se encontram em péssimo estado", adianta a curadora Maria de Jesus, a guardiã da obra do poeta
Pequenos tesouros
Desde que as bibliotecárias do Espaço Cassiano Nunes começaram a trabalhar no vasto acervo do poeta, um dado curioso tem chamado atenção: a quantidade de artigos de jornais e revistas guardadas por ele entre as páginas nos livros. "Geralmente, são recortes relacionados ao autor ou à obra propriamente dita. Alguns recortes, com pequenas anotações feitas à mão", observa a bibliotecária Ana Jesuína. "Estamos recolhendo essas preciosidades e arquivando com as informações contidas ali", acrescenta.
Ano de homenagens
Para reverenciar o poeta que amou os livros como ninguém, uma série de atividades será desenvolvida em 2010. Além da biografia, a editora da UnB prevê a reedição do livro Sedução da Europa, lançado originalmente em 1958. "É uma obra que fala dessa sedução que o velho mundo exerce sobre os escritores", antecipa a curadora Maria de Jesus Evangelista. O outro projeto seria um livro de ensaios críticos e história literária envolvendo textos sobre teatro e poesia. "Cassiano era um homem que tinha uma cultura vasta, lendo em alemão, francês, italiano, inglês e espanhol. Ele não deixava nenhuma criatura sem resposta", destaca.
Um terceiro livro reuniria 103 trabalhos do primeiro concurso nacional de poesia, realizado em abril deste ano e que contou com 300 candidatos inscritos. "Além dos três vencedores, selecionamos outras 100 poesias que participaram do concurso", detalha a professora, que tem ideia para uma exposição com os objetos pessoais do poeta, como os mais de 100 quadros e telas, desenhos, esculturas, prêmios, mesa, máquina de escrever, relógio, óculos. "Até outro dia, o relógio dele funcionava", lamenta a curadora. "O meu desejo é que a minha programação de 2010 sobre a obra de Cassiano Nunes chegue mais ao conhecimento do público", torce.
Como pesquisar
Espaço Cassiano Nunes, localizado ao lado da diretoria da Biblioteca Central da UnB. Horário de funcionamento, das 7h às 18h. Informações no site: www.bce.unb.br