Diversão e Arte

Aos 85 anos, Pernambuco do Pandeiro, um dos criadores do Clube do Choro, continua em plena atividade

Pernambuco do Pandeiro acompanhou estrelas como Orlando Silva, Nelson Gonçalves, Aracy de Almeida e Dalva de Oliveira

Irlam Rocha Lima
postado em 06/01/2010 07:00 / atualizado em 22/09/2020 15:12

Uma lenda da música popular brasileira vive, anonimamente, num modesto apartamento da 410 Sul. Morador em Brasília desde 1959, Inácio Pinheiro Sobrinho, conhecido e reconhecido nacionalmente como Pernambuco do Pandeiro, teve seus tempos de glória na era de ouro do rádio, quando integrou os mais famosos conjuntos regionais, sob a batuta de maestros famosos como Radamés Gnattali, Severino Araújo, Guio de Moraes, Francisco Mignone e Eleazar de Carvalho. Pernambuco acompanhou os maiores astros e estrelas da época, nomes como Francisco Alves, Orlando Silva, Carlos Galhardo, Sílvio Caldas, Nelson Gonçalves, Aracy de Almeida, Dalva de Oliveira, Ângela Maria, Isaurinha Garcia e as irmãs Dircinha e Linda Batista. Ele próprio teve o seu conjunto, que, em 1955, acolheu um acordeonista recém-chegado ao Rio de Janeiro, vindo de Recife, chamado Hermeto Pascoal. Pernambuco do Pandeiro acompanhou estrelas como Orlando Silva, Nelson Gonçalves, Aracy de Almeida e Dalva de OliveiraDuas décadas depois, morando na capital, o pandeirista viria a ser um dos pilares do Clube do Choro, nos primeiros anos de funcionamento. Atualmente, aos 85 anos, mantém-se - como sempre - em atividade frenética, criando novos grupos e marcando presença numa roda de choro todas as tarde de sábado, na QI 13 do Lago Norte, ponto de encontro de veteranos instrumentistas. Nascido em Gravatá de Bezerro (PE), em 1924, antes de completar um ano, o menino Inácio mudou-se com a família para Lagoa de Roça (PB), onde ficou até o começo da adolescência. Junto com a mãe e dois irmãos, foram de navio para o Rio. "Fomos morar no Morro de São Carlos e depois no Morro de Santo Antônio. Aos 14 anos, ganhei meu primeiro instrumento, um cavaquinho, presente da minha irmã. Logo aprendi a tocar e passei a frequentar a roda de choro na casa do professor Waldemar, no Catumbi, e lá conheci o Pixinguinha, já uma figura respeitabilíssima", recorda-se. Apaixonado por passarinhos, Pernambuco trocou o cavaquinho por um casal de canários da terra. "Eu era engraxate e sem o cavaquinho vivia triste. Aí meu irmão mais velho, que era barbeiro, me deu um pandeiro, ganhado de uma dívida. Com menos de um mês já estava tocando bem, e passei a acompanhar os instrumentistas da gafieira Flor do Abacate, no Largo do Machado", lembra. Regionais Oficialmente, a carreira do músico teve início aos 15 anos, depois de ser aprovado no programa de calouros Na hora do pato, comandado por Heber de Bôscoli e Iara Sales, na rádio Mayrink Veiga. "Depois de me classificar em primeiro lugar no programa, fui convidado para tocar no regional de César Faria (pai de Paulinho da Viola), na Rádio Ipanema, em 1942; e depois no regional de Claudionor Cruz, na Rádio Globo. Passei, também, pelos regionais de Abel Ferreira e de Canhoto. Até que em 1949 criei meu próprio regional, já na Rádio Mauá. Ali trabalhei até 1959. Em 1955 mandei buscar no Recife o Hermeto Pascoal, a quem já conhecia, para substituir Edinho do Acordeon." Com o seu conjunto, ou sozinho, Pernambuco, durante vários anos, acompanhou em gravações ou em apresentações ao vivo, os maiores nomes do rádio, na fase áurea. "Além de estar ao lado de artistas nas rádios, em shows e estúdios, tocava em dancing, gafieiras e em festas, tanto no Rio como em outras cidades. %u201CEm Belo Horizonte, certa vez, Juscelino Kubitschek, então governador de Minas Gerais, me ouviu e gostou. Já presidente, no Rio, passei a tocar em festas na casa dele", revela. Brasília estava sendo construída quando, em 1959, JK o convidou para morar na cidade. "O presidente chegou para mim e perguntou: 'Escute, Pernambuquinho, você tem coragem de ir comigo para Brasília?'. Aí disse que o pedido dele era uma ordem. Vim para ser músico da Rádio Nacional, mas não deu muito certo e aí fui fichado na Novacap, da qual sou aposentado", conta. Sem parar com a atividade musical, ele criou o grupo Pernambuco do Pandeiro, suas Mulatas e seus Batuqueiros, que, entre a segunda metade da década de 1960 e segunda de 1970, animou lugares como o Clube Previdenciário, Fina Flor do Samba (Centro Comercial Gilberto Salomão) e Casarão do Samba (que existia próximo ao Brasília Palace Hotel). "Ali, por volta de 1974, o jornalista Raimundo de Brito começou a promover uma roda de choro no apartamento dele na 105 Sul. Foi lá que conheci o clarinetista Celso Cruz, de quem me tornei amigo, e me reencontrei com Waldir Azevedo, dos tempos do Rio. Waldir veio com Dona Olinda morar em Brasília, acompanhando uma filha." Foi a Pernambuco que Waldir recorreu quando resolveu formar um regional. "Foram várias as formações até que chegasse a que contava comigo, Hamilton Costa e Carlinhos Sete Cordas (violões), Eli do Cavaco e Valdeci (percussão). Aconteceram muitas rodas de choro na casa do Waldir, shows na capital e em outras cidades, além de gravação de dois discos. Estivemos com o Waldir até o final da vida dele", lembra, emocionado. O Clube do Choro é um capítulo importante na memória de Pernambuco do Pandeiro. Ele, um dos fundadores, busca deixar claro que, embora o movimento para a criação da entidade tenha ocorrido no apartamento da flautista Odete Ernest Dias, a ideia partiu de Celso Cruz. %u201CEle começou a falar disso quando as reuniões no apartamento do Raimundo de Brito começaram a ficar muito concorridas.%u201D Gente boa Um dos pontos altos das apresentações do recém-criado Clube do Choro era o duo do pandeirista com o flautista Bide da Flauta, interpretando o choro Urubu malandro (Pixinguinha, Loro e João de Barro). %u201CPelas rodas passou muita gente boa. Dos veteranos, havia nomes como Bide, Eli, Dedé do Violão, Dudu Sete Cordas, Nilo Costa, Tio, Avena de Castro, que foi o primeiro presidente, e Francisco de Assis, que viria depois a assumir o comando. Entre os mais jovens tinha o atual presidente do Clube, Reco do Bandolim, e os meninos do Dois de Ouro, Fernando César e Hamilton de Holanda. Aliás, o nome do grupo foi dado por mim%u201D, diz, orgulhoso, o eterno mestre do pandeiro, que, depois de uma longa temporada em Uberaba (MG), voltou a morar em Brasília há três anos. Ouça música Delirando e veja galeria de fotos de Pernambuco do Pandeiro

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