Diversão e Arte

Escritor homenageia um dos personagens mais conhecidos das tramas sobre detetives

postado em 20/01/2010 08:14
As únicas coisas que ainda o estimulam a se levantar da cadeira são as abelhas e o antigo cachimbo. Aos 89 anos, ele passa boa parte do tempo no apiário, construído na casa simples em Sussex Downs, cidadezinha no sul da Inglaterra. Há muito deixara o lendário endereço de Londres. Estudioso, como sempre, entende o mecanismo das abelhas: observa os favos, as rainhas, retira o mel. E aguarda a morte, temendo um fim indigno. Vencedor do prêmio Pulitzer, Michael Chabon reúne um papagaio misterioso, um menino mudo e um  detetive no fim da vidaEle, o velho, é personagem de A solução final - Uma história de investigação, livro de ficção policial do escritor norte-americano Michael Chabon, que chega às prateleiras pela Companhia das Letras. Vencedor do prêmio Pulitzer de 2001 (por As incríveis aventuras de Kavalier e Clay), o autor homenageia, em 112 páginas, um dos personagens mais conhecidos das tramas sobre detetives. A obra foi publicada originalmente em 2003 na revista Paris Review. A história é ambientada no período da Segunda Guerra Mundial. O velho vê através da janela uma cena tão inusitada quanto interessante: um menino com um papagaio no ombro caminha pela ferrovia. Vencendo a própria inércia, o senhor se aproxima da dupla e descobre que a criança, chamada Linus, é muda. Mais: o papagaio cinzento fala "pelos cotovelos". Em especial, números, proferidos em sequências (aparentemente) sem nexo. Essa combinação de ingredientes desperta a verve policial, há tempos esquecida pelo velho. Ainda mais quando um detetive da região pede a sua ajuda para solucionar um crime. Linus, o garoto alemão judeu e refugiado, morava com o papagaio Bruno na casa da família Panicker. O espaço, uma espécie de hospedaria, abrigava gente esquisita. Entre eles, o senhor Shane, morto em circunstâncias misteriosas. Além do assassinato, o desaparecimento de Bruno, o animal prodígio, teria de ser explicado. É aqui, mais ou menos na metade do livro, que a leitura fica envolvente. Talvez por uma ironia. O mesmo poder de descrição apontado por muitos como uma grande qualidade de Michael Chabon embaralha a cabeça do leitor. É claro que a maior parte das descrições funciona, instiga a imaginação - como a do "vidro antigo, cheio de ranhuras e bolhas que distorciam e brincavam com o mundo lá fora". No entanto, há algumas que parecem fazer sentido apenas na língua original da obra. Além disso, em que pese os 89 anos do personagem, fica a impressão de que o famoso detetive perdeu a manha. Com o seu cachimbo, ele continua descobrindo pistas inimagináveis e mantendo a racionalidade e o mistério que lhe são peculiares. Mas falta uma "pimenta". Parece que ser detetive não é mais elementar para Sherlock Holmes. Pelo menos para o de Michael Chabon. A SOLUÇÃO FINAL - UMA HISTÓRIA DE INVESTIGAÇÃO De Michael Chabon. Tradução de Alexandre Barbosa de Souza. Companhia das Letras, 112 págs. R$ 32,50.

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