Diversão e Arte

"Metendo o pé na lama: os bastidores do rock in rio de 1895" ganha nova edição

postado em 11/03/2010 07:00
Capa do CD dos Paralamas: época da redemocratização do paísLançado em 2008, sob o selo da editora Scortecci, Metendo o pé na lama: os bastidores do Rock in Rio de 1985, relato do publicitário Cid Castro, ganhou nova edição em 2010, agora pela Tinta Negra Bazar Editorial. A reedição marca as bodas de prata do primeiro festival musical Rock in Rio, realizado em 10 dias de um janeiro chuvoso (daí a alusão do título ao terreno enlameado do local dos shows) na Cidade do Rock, erguida em Jacarepaguá, e que atraiu cerca de 1,3 milhão de pessoas. Cid, autor do logotipo do festival (as silhuetas do mapa da América do Sul ganharam o corpo de uma guitarra), narra desde a concepção do evento, idealizado por Roberto Medina, da agência de publicidade Artplan, até o último dia do festival.

Cid não foi escolhido para trabalhar na marca, mas tratou de tentar esboçar alguma coisa, sempre com a ajuda de muito rock ;n; roll. O empurrão veio de Nizan Guanaes, que mostrou os esboços do jovem ilustrador aos diretores da agência. E pronto: a identidade visual do Rock in Rio tinha dono. As experiências do criador são contadas em tom vibrante e irreverente e também revelam os bastidores da série de shows que inauguraram uma nova era na cena musical brasileira. ;A democratização pós-Rock in Rio é isso aí: funk, cantos religiosos, sertanejos, clássicos, bossa nova, axé music, rock, samba e tudo o mais, convivendo juntos em harmonia ; isso não foi um trocadilho;, comenta.

Metendo o pé na lama: os bastidores do Rock in Rio de 1985 
De Cid Castro. Tinta Negra Bazar Editorial, 264 páginas. Preço médio: R$ 39,90.O próprio festival, apesar da hegemonia de bandas de rock, tinha uma proposta de reunir públicos de diferentes gostos musicais no mesmo espaço. Shows de Elba Ramalho, Moraes Moreira, Alceu Valença, que fizeram o público roqueiro vibrar tanto quanto nas apresentações de Paralamas do Sucesso e Barão Vermelho, também sinalizavam mudanças políticas e econômicas importantes. No quinto dia de festival, 15 de janeiro, o país ficou sabendo da vitória de Tancredo Neves nas eleições: era o primeiro presidente civil eleito em 20 anos. Atrações internacionais de peso (Queen, Iron Maiden, Yes e outras) mostraram ao mundo o potencial do país para receber os melhores músicos do mundo.

A paixão de Cid pelo rock, revelada no diário de todos os dias do festival, se repete na descrição detalhada e bem-humorada do ambiente de criação publicitária. ;Esse modelo de agência não existe mais. Estamos falando de uma empresa com sete andares e um departamento de criação que trabalhava em duplas, que usava coisas do século passado, mas que tem menos de 20 anos! O jovem que não tem ideia de como isso funcionava vai se surpreender;, descreve. O publicitário saiu da Artplan no fim dos anos 1980 e se mudou para a Europa há 21 anos. Atualmente, trabalha como free-lancer em Portugal.

Metendo o pé na lama é um convite para viajar na história recente da música nacional, acompanhado do relato vigoroso de quem participou e viveu intensamente um de seus capítulos mais notáveis.

Leia trechos do livro

"Carlão me apresentou o diretor de arte Valter Vicente, ou melhor, Falcon, como era conhecido, por ser a cara do boneco dos brinquedos Estrela que fazia o maior sucesso entre a criançada. Ele me passou um trabalho que era o maior rabo de foguete: uma ilustração difícil, com prazo de entrega estourado. Passei todo o fim de semana fazendo o desenho, mas não consegui terminá-lo.

Segunda-feira chegou e, no caminho até Artplan, pensei em me suicidar várias vezes. No entanto, achei que seria mais profissional ser assassinado pelo diretor de arte quando lá chegasse. Depois de quarenta minutos de esporro, ele disse que eu não sairia vivo dali sem o trabalho pronto. Conduziu-me ao estúdio repleto de profissionais e me pôs sentado na única prancheta vazia, desejando-me boa sorte. Virei a noite trabalhando e dei os retoques finais na manhã seguinte. Olhava para minha obra para quem olha para uma mulher conquistada. Justamente nesse momento de intimidade, ouço uma voz por cima do meu ombro fazendo o seguinte comentário:

; Tá razoável, mas falta brilho, contraste entre as cores e a perspectiva tá errada.

Eu me virei bruscamente para ver quem era o cretino que falava assim do meu filho recém-nascido, depois de tantos dias sofrendo com o parto. A minha cara congelou quando aquela voz se compôs num rosto familiar, dizendo:

; Desculpe, estou criticando o seu trabalho, mas nem sequer me apresentei. Prazer, José Luís Benício.

Comecei a me encantar pelas ilustrações do Benício na infância, com os cartazes dos filmes dos Trapalhões. Já na adolescência, seus desenhos e sensualidade me seduziam nas pornochanchadas. Escolhia as revistas Homem e Status pela mulher da capa e pelos desenhos dos contos eróticos, feitos pelo mestre."

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