Diversão e Arte

Mussum é referência para nova geração de comediantes e está por toda parte

postado em 14/03/2010 10:05
Hoje pode parecer incrível, mas naqueles tempos politicamente incorretos (;ui, ui, uuui!”), Mussum falava o tempo todo em ;muié; e cachaça (;cadê o mé?;) e vivia satirizando a condição de negro (;negão é teu passadis;, ;quero morrer pretis se estiver mentindo;) . ;Imagina isso num programa infantil de agora! Na época dos Trapalhões, o politicamente correto não fazia parte do humor;, compara Welder Rodrigues, 40 anos, integrante da Cia. de Comédia Os Melhores do Mundo. ;A influência de Mussum no nosso humor é gigantesca. É meu trapalhão favorito.; E não é que todo mundo ama Kid Mumu?

O ator Fred Braga em frente à parede pichada na Via S2: Fred Braga, do grupo G7, é outro que acha o ;Da Mangueira; o mais engraçado dos Trapalhões. ;Ele nunca fazia um personagem. Era o Mussum. Não tentava esconder isso. Era um cara original e essa era a virtude que o fazia tão simpático;, acredita o ator. ;Isso mostra que é possível fazer graça sendo você mesmo. E também que um humorista consegue fazer humor se ele se divertir enquanto o fizer. A alegria na vida é captada pela plateia, que se diverte junto. Isso é essencial e nós, no G7, tentamos copiar.;

Sim, para Fred, ser fã é querer ;copiar; a pessoa, fazer o que ela faz. ;E tem coisa mais legal do que querer ser ;igual; ao Mussum? Como não ser fã de um cara gente boa, que gosta de cantar samba e tomar cerveja? Cacildis!”, brinca o ator, que a toda ;horis; repete um bordão do ídolo. ;Esse lance de colocar o ;is; no fim das palavras é demais! O cara ;sacaneia; a língua falada e transforma o português em brasileiro! É uma apropriação da língua culta e sua transformação em popular, a língua do morro, das pessoas mais pobres, do Brasil. É também uma forma sutil de fazer outras pessoas rirem. Imagina você chegar no bar e pedir uma ;geladis;? Na hora o garçom vai rir e trazer a mais gelada do bar!”

O malandro vive
Pelas ruas da cidade, é comum ver o sorriso largo de Mussum em camisetas, acompanhado das mais variadas frases. Está entre as estampas mais procuradas em lojas do Conic, como Ka-traca, Negro Blue, Verdurão e Kingdom Comics. Pertinho dali, o malandro ; que inspirou até o título do segundo disco dos Raimundos (Só no forévis, de 1999) ; aparece num muro da Via S2, que dá acesso aos anexos dos ministérios, numa pichação que fizeram: ;Mussum vive! Salve a Mangueira;.

No Twitter, ele também está vivinho da silva no ;Mussum Alive;, perfil falso criado por Leandro Santos, técnico mecânico de 27 anos. Leandro diz que inventou o twitter fake no começo de 2009, depois de tentar, sem sucesso, ganhar seguidores com seu perfil verdadeiro. ;Não tinha muitos amigos e, na época, estavam na moda os twitters falsos, como o do Vitor Fasano. Então pensei em criar um twitter fake para ver se eu interagia mais. Mussum foi o primeiro personagem que me veio à cabeça;, conta. Com a popularidade do ídolo, em um mês o perfil falso já tinha 43.500 seguidores. Leandro conheceu tanta gente que acabou criando um blog de ;humor etílico; (bebidaliberada.com.br).

Língua solta
Lauro Montana, 31 anos, professor de história, ator e DJ, nasceu no mesmo dia em que Antonio Carlos Bernardes Gomes: 7 de abril. E sempre curtiu o cara. ;Era o melhor trapalhão que existia. Quando morreu, acabou tudo;, afirma. ;Grandão e tosco; como o ídolo, Montana cai na gargalhada só de lembrar o jeito de falar engraçado, rápido, ;aceleradis;, que sempre vinha quando Mussum ficava irritado no programa. ;É um personagem que não teria nos dias atuais. Naquela época, havia liberdade para fazer o que desse na cabeça. Hoje em dia, a comédia é cheia de frescura, de politicamente correto.;

Para Érico Monnerat, produtor de tevê, 29 anos, essa liberdade de falar de temas tabus é um dos motivos que fazem a figura de Mussum persistir por tanto tempo ; e virar mania nacional. Além do carisma gigante, claro. ;Ele era um dos poucos negros na tevê naqueles tempos. Ele e o Tião Macalé. E eles ironizavam a questão do preconceito. Eram tipos bem brasileiros ; malandros do morro, figuras que acabaram sumindo;, comenta Érico, que é fã do Mussum (e do Didi) desde pequeno, inclusive como sambista. ;O trabalho como humorista acabou ofuscando o de cantor, mas antes ele tinha Os Originais do Samba, com discos muito interessantes, uma musicalidade bem legal. Era uma figura muito natural, por isso a gente tem essa referência alegre.;

Érico Monnerat gosta de Mussum desde pequeno: Memória
De mecânico a palhaço
Carioca do Morro da Cachoeirinha (em Lins de Vasconcelos, subúrbio do Rio), Antonio Carlos Bernardes Gomes nasceu em 7 de abril de 1941. ;Diplomado em mecânica de precisão, ajustagem;, como ele dizia, foi militar por oito anos, ;cabo especializado datilógrafo;. Mangueirense ; antes de ganhar de Grande Otelo o apelido que o faria famoso, era chamado de Carlinhos da Mangueira ;, ele fundou nos anos 1960 Os Originais do Samba, conjunto que tocava desde E lá se vão meus anéis (de Eduardo Gudin e Paulo César Pinheiro) até Aniversário do Tarzan (de Bidi, J. Carioca e Bonsucesso).

E foi por achar muito engraçado aquele cara dos Originais do Samba, que tocava fazendo trejeitos e arregalando os olhos, que Renato Aragão chamou Mussum para participar de Os Trapalhões. Ele agradou de cara. Era o malandro carioca que Renato queria para fazer companhia a Didi, o nordestino que tentava ser esperto para sobreviver, e Dedé, o galã da periferia paulista (Zacarias entraria depois, como o mineirinho ingênuo).

Mussum conciliou a agenda dos Trapalhões com a dos Originais até quando pôde. No fim da década de 1970, com o quarteto no auge na tevê e no cinema, deixou o grupo de samba. Com os amigos ritmistas, gravou 12 álbuns e ganhou três discos de ouro ; o primeiro, de 1969, fez muito sucesso com Cadê Tereza? (Jorge Ben) e foi relançado há cinco anos pela BMG, na série Essential Classics. Com os amigos de pastelão, foram 27 filmes.

O mais alegre dos Trapalhões se pirulitou na madrugada de 29 de julho de 1994, aos 53 anos, 17 dias depois de um transplante de coração. Ele tinha uma miocardiopatia dilatada e, inicialmente, reagiu bem ao transplante. Mas 10 dias depois, foi tomado por uma infecção no pulmão. Morreu? Morreu, nada! Está aí, por toda parte, nos muros, nas camisetas, no sorriso largo dos fãs. Forevis.

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