postado em 09/04/2010 08:31
Ainda na adolescência, o barbudo Patrick Stickles anotou a lição: nada mais rock 'n' roll do que uma boa aula de história. No disco mais recente do Titus Andronicus, o roqueiro de Nova Jersey vai à Guerra Civil norte-americana (1861-1865) para falar sobre um país que, ainda hoje, soa dividido. É um álbum de inspiração punk. Mas a paisagem não difere daquela estampada nas canções de Born in the U.S.A., de Bruce Springsteen, nos faroestes de John Ford ou nas tragédias mais sangrentas de Shakespeare, autor da peça violentíssima que inspirou o nome deste quinteto. The Monitor é um épico. Eis a palavra.
Uma definição que, por si só, coloca o Titus Andronicus numa posição solitária dentro do indie rock americano. Taí uma banda que não mede as próprias ambições. Quem mais teria a coragem de conceber um projeto conceitual na tradição de Tommy, do The Who, e The wall, do Pink Floyd? Eles têm. Não à toa, The Monitor, lançado no início de março, já é tratado como uma resposta (nada ingênua, e menos teen) à ópera-punk American idiot, do Green Day.
O cenário dos discos é o mesmo - a América pós-11 de setembro. Os alvos, parecidos (o comodismo e a intolerância made in U.S.A.). Mas a tese defendida por essa pequena banda, ainda pouco conhecida, é mais complexa do que todo o repertório de Billie Joe Armstrong. As canções narram a aventura de um herói anônimo (alter ego de Stickles), que, de mudança para Boston, descobre uma nação abandonada, sem espírito comunitário. Na saga, esse gladiador pobretão enfrenta a fúria do "inimigo": qualquer um que tente proibir o direito à liberdade.
O título do disco faz referência a um navio de guerra. Mas, apesar do discurso irascível (e das guitarras quase sempre estouradinhas), The Monitor não tem sede de sangue. A moral dessa história é uma defesa do espírito de camaradagem e da importância de lutar por um país justo. As melhores intenções, portanto. O curioso é como o Titus Andronicus faz conexões entre fatos históricos e situações do cotidiano. Um discurso de Abraham Lincoln é costurado à paranoia do protagonista. "O inimigo está em todo canto", a banda avisa.
"No cérebro humano, todos os dias existe guerra entre a razão e a emoção", observou Stickles ao site Aversion. Esse conflito é a base da sonoridade do Titus, que usa a matriz ruidosa do punk para sedimentar um rock de porte monumental. No primeiro disco, The airing of grievances (2008), eles criaram uma suíte de três longas canções. Em The Monitor, expandem o escopo com melodias ainda mais espaçosas, cheias de surpresas. "Gosto de músicas que nos levam numa viagem, como Bohemian rhapsody, do Queen", afirmou o vocalista ao site Tiny Mix Tapes.
Com convidados como as bandas Hold Steady e Vivan Girls, o disco celebra o companheirismo. Mas não termina exatamente com um happy end. No fim da jornada, o herói descobre que não consegue viver bem sem se sentir ameaçado pelo "inimigo". "Se é um final triste? Não sei. Mas nosso herói vai continuar seguindo em frente", contou Stickles. Se depender do apelo dessa fábula, que já conquista fãs até na revista Rolling Stone (que elegeu a banda como uma das 10 revelações de 2010), não seria surpreendente se eles sacassem um The Monitor - A vingança. A guerra continua%u2026
Titus Andronicus
Conheça a banda de Nova Jersey em www.myspace.com/titusandronicus. O segundo disco do grupo, The Monitor, foi lançado pela XL Recordings. Importado. ****
Conheça quatro grupos valentes que fazem participação no disco novo do Titus Andronicus
Vivian Grils
Com apenas três anos de carreira, o trio feminino de Brooklyn, Nova York, já abriu shows do Sonic Youth. Com dois bons discos (Vivian Girls, de 2008, e Everything goes wrong, de 2009), elas se destacam no novo noise pop americano. E tome barulho. Ouça em www.myspace.com/viviangirlsnyc.
Ponytail
O quarteto de art rock, formado em Baltimore (Maryland) desmonta as fórmulas do rock independente com tanto espírito de aventura que já é comparado a bandas como Deerhoof e Battles. Em 2008, lançou o enigmático Ice cream spiritual. Ouça em www.myspace.com/ponytailtunes.
Wye Oak
O indie folk é praia deste duo de Baltimore, composto por um baterista (Andy Stack) e uma guitarrista e vocalista (Jenn Wasner). Com elementos de noise, a banda assinou contrato com a Merge Records, um dos maiores selos independentes dos Estados Unidos. Ouça em www.myspace.com/wyeoak.
Spider Bags
O trio da Carolina do Norte faz uma versão envenenada de rock setentista (com um quê de country rock) que acena para uma das principais referências do Titus Andronicus: Bruce Springsteen. Ouça em www.myspace.com/spiderbags.