Diversão e Arte

Com o espírito dos velhos fanzines, sites de rock criam poderosa rede de informações sobre a música independente de Brasília

postado em 10/04/2010 11:50
Entender a gramática dos acordes, riffs e notas musicais não é essencial para quem decide escrever sobre rock na internet. Em muitos casos, no entanto, criar um site de música pode ser tão trabalhoso quanto manter uma banda independente. As revistas eletrônicas de Brasília defendem uma filosofia de origem punk: faça você mesmo. Sem grana - mas com fã-clubes -, elas resistem às idas e vindas da web graças ao carinho pela cena alternativa da cidade (e, em alguns casos, do país). A maioria enfrenta, é claro, obstáculos típicos do underground: falta de patrocínio, divulgação modesta. Mas nada que esfrie a disposição de quem aposta em um mercado cada vez mais organizado. Mário Pacheco, da revista eletrônica Do Próprio Bolso, publica fanzines desde a década de 1980: O ramo acompanha o crescimento da música independente no país. Mesmo quando produzidos em esquema doméstico, os sites mais conhecidos rejeitam o amadorismo e criam uma rede eficiente de informações sobre bandas locais, novidades e eventos culturais. "As bandas nos procuram pedindo para avaliarmos os CDs que elas lançam. Isso é bacana, ajuda a girar a roda", observa Cristiano Porfírio, 37 anos, que criou em 2007 o Na Rota do Rock. O jornalista, que atualiza o site quatro vezes por semana, comenta shows e faz ensaios fotográficos caprichados. "É um público fiel. Os leitores mandam e-mail, me encontram no Twitter e em eventos. É gratificante", afirma. Uma das metas de Cristiano é montar uma seção para bandas novatas. Na era dos blogs e das redes sociais (como Orkut, Twitter e Facebook), muitas revistas optam por um caminho parecido. Mapear a produção musical é um objetivo do Rock Brasília, criado em 2008. O catálogo de bandas locais já agrega 200 nomes - e só faz crescer. "Comecei o site como um hobby. Hoje, parece até uma microempresa", compara a DJ Penny Lane, 34 anos, que divide as atribuições no site e a carreira de médica. "Crescemos muito. Empresas e produtoras nos procuram para anunciar, recebemos convites para participar de júris em festivais", conta. Ampliar o alcance também está nos planos de dois sites veteranos da cidade. Na web, o Cult 22 não pode mais ser tratado como uma varanda do programa transmitido pela Cultura FM. "Temos uma média de 50 mil acessos por mês. Para um site específico de rock, é um aumento expressivo", afirma o apresentador e produtor Marcos Pinheiro, que coordena a página com Abelardo Mendes Jr. Outro pioneiro, o produtor Fernando Rosa pretende transformar o site Senhor F (no ar desde 1999) em um polo de música independente da América do Sul. "O surgimento de um número grande de blogs regionais nos obrigou a fazer duas mudanças: virar um site sul-americano e oferecer mais conteúdo de revista, sem tanta preocupação com o imediatismo das notícias", afirma Fernando. Força underground Na contracorrente do mercado, os sites com aparência de fanzines cumprem o papel de dialogar com um público segmentado. À frente da página Do Próprio Bolso, o servidor público Mário Pacheco, 45 anos, cria uma colagem de informações e opiniões para quem se cansa da polidez dos portais "caretas". "Tenho uma auréola de maldito. Nunca entendi a mídia, não sei como ela funciona. Faço antimarketing", diz Mário, que publica fanzines e produz shows desde os anos 1980. "Tenho o site porque recebo discos do Brasil inteiro. Divulgo downloads, links, blogs. Acho o maior barato. Mas não tem como ganhar dinheiro. O importante é ficar perto dos fãs", resume. A indignação, porém, tem limites. Para deixar o site mais acessível, Mário prefere evitar os palavrões. O jornalista Tomaz André da Rocha, 40 anos, tomou uma atitude parecida. A própria filha, de 13 anos, lê o site do Zine Oficial, guia incontornável para fãs de rock pesado (a edição impressa já vendeu 71 mil exemplares). Depois de vencer a birra contra a internet, Tomaz tomou lições de HTML e descobriu os poderes da web: a revista ganhou contato com os adolescentes. É ele quem faz o layout, com aspecto de zine. "O site pode ser mais dinâmico, com um portal de bandas que funcione como o MySpace. Mas não quero que ninguém faça isso para mim. A ideia é dominar a linguagem da web", avisa. Nada mais punk. CULT 22 www.cult22.com Nem os fãs do programa de rádio - transmitido às sextas-feiras (às 22h) na Cultura FM - devem lembrar que o site do Cult 22 estreou na rede em 1997. Mas foi a partir de 2002 que a página deixou de ser mera vitrine do conteúdo radiofônico e passou a reunir coberturas de shows, entrevistas, resenhas, agenda cultural e notícias sobre a cena brasiliense. Com a criação do blog, em 2008, ganhou mais agilidade. "Hoje, a audiência do blog deve ser maior do que a do programa", observa o jornalista, produtor e apresentador Marcos Pinheiro, diretor da Rádio Cultura. DO PRÓPRIO BOL$O www.dopropriobolso.com.br Há 28 anos no front da contracultura do DF, o servidor público Mário Pacheco desenvolveu 22 fanzines desde o início dos anos 1980. O site, criado em 2003, não nega uma filosofia que tem origem nas publicações underground. "Dos zines, levei a colagem. Uso o mouse como tesoura. É a formatação do caos", explica Pacheco. Com a ajuda dos amigos, que enviam textos até de Londres, o "webmaster" escreve sobre Beatles, Led Zeppelin, Ozzy Osbourne, Cidadão Kane e outros clássicos. Notícias sobre shows em Brasília e revistas em quadrinhos também entram nesse mural de outsiders. SENHOR F www.senhorf.com.br Uma das principais revistas online do rock independente brasileiro está pronta para um salto: depois de se desdobrar em um selo (Senhor F Discos) e agência de notícias (desde 2005), o site criado em 1999 quer virar referência sul-americana. "É um projeto para 2011. Queremos produzir conteúdo mais equilibrado entre países da América do Sul", explica o produtor gaúcho-brasiliense Fernando Rosa, que atende por Senhor F. Na web, uma ótima dica é a seção Senhor F Virtual, com discos para baixar de graça, em MP3. ROCK BRASÍLIA www.rockbrasilia.com.br Há dois anos, o site defende com bravura uma ideia ambiciosa: mapear o rock candango. Criado pela médica e DJ Penny Lane, 34 anos, o catálogo virtual já cadastrou 200 bandas da cidade. Mas não se trata de um simples mostruário de talentos locais: o site observa a cena musical com resenhas de shows, colunas, textos de colaboradores (alguns deles, universitários) e notícias. "O objetivo é colaborar para o crescimento da cena. Em três anos, ela cresceu muito. Hoje, na agenda cultural, são cerca de 10 shows por semana", afirma Penny. Para o futuro, a ideia é transmitir shows ao vivo. NA ROTA DO ROCK www.narotadorock.com O jornalista Cristiano Porfírio, 37 anos, investe 15 horas semanais para atualizar um site, que combina textos opinativos com informações sobre artistas e eventos da cidade. Criada em 2007, a página se destaca nas coberturas de shows, com bom material fotográfico. "A leitura na internet está cada vez mais sem aprofundamento de ideias, o que é uma pena. Não dou crédito aos sites que postam só por postar. Leitura rápida é diferente de conteúdo vazio", afirma Cristiano. Em dezembro de 2008, com o Rock Brasília e o Cult 22, organizou o festival Na Rota do Rock Brasília, com 19 bandas. ZINE OFICIAL www.zineoficial.com.br Impresso desde 2006, o Zine Oficial já se consagrou como o reduto brasiliense do hardcore e do metal. Inicialmente, a ideia de levar o fanzine para a internet não parecia muito atraente aos ouvidos do jornalista Tomaz André da Rocha, 40 anos. Mas, derrubado o preconceito, o site engatou em 2007 com um layout todo particular e uma cobertura mais ampla da cena. "O zine impresso é nosso carro-chefe. Mas a internet é uma arma muito poderosa. Queremos ampliar o site para que as próprias bandas atualizem informações, como no MySpace", planeja Tomaz.

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