Diversão e Arte

Mostra sobre o artista plástico Andy Warhol está em cartaz na Estação Pinacoteca em São Paulo

Luciano Milhomem
postado em 12/04/2010 08:53
E se o mundo fosse um gigantesco supermercado? Se, em vez de florestas, montanhas, cânions, rios, mares, houvesse prateleiras repletas de produtos diversos, prontos para o consumo? Nesse centro de compras, haveria lugar para mulheres e homens, de preferência celebridades do show business e da política - vivos ou mortos. O mal e a dor também estariam presentes, mas sempre sob o disfarce do espetáculo. Esse mundo existe. Está na obra de Andy Warhol, artista plástico norte-americano morto em 1994. Parte dela integra a mostra Andy Warhol, Mr. America, em cartaz na Estação Pinacoteca em São Paulo até 23 de maio.

A clássica recriação da imagem de Marylin Monroe: close em diferentes tons e coresSão 58 gravuras, 26 pinturas, 39 fotos, duas ilustrações e diversos filmes, que traduzem o essencial de Warhol. A exposição permite ao apreciador de arte brasileiro ver de perto obras como as mais famosas sequencias do artista: a de latas de sopa Campbell;s, pintadas em quadros gigantes, e a do retrato de Marilyn Monroe, um mesmo close da atriz retocado em diferentes tons e cores. Todo o conjunto revela a fixação de Warhol pela imagem e seus efeitos. Sem deslumbramento, porém. Ao contrário. Com suas pinturas e fotografias - adulteradas ou não - ele expõe o encantamento cego da sociedade de consumo diante da reprodução artificial de pessoas e objetos. O papa da pop art explicita, assim, o quanto, no grande shopping center da atualidade, gente vira coisa e coisa quase vira gente.

Ao longo da exposição, o visitante vai descobrindo, simultaneamente, a obra e a personalidade do artista. Warhol tinha como referência os Estados Unidos, mas sua visão crítica pode estender-se a toda a cultura ocidental (e ocidentalizada) na medida em que o próprio american way of life estendeu-se a significativa parte do mundo. Em uma de suas declarações, em destaque na mostra, Warhol deixa claro que ama seu país, ainda que não o poupe de sua perturbadora iconoclastia. A verdade é que poucos escapam do radar desse artista. Seu olhar, armado de uma câmera, capturou de Richard Nixon a Arnold Schwarzenegger, muito antes de este último tornar-se um político. Aliás, Warhol tinha mesmo algo de profeta. É dele a hoje surrada afirmação de que, um dia, todo o mundo teria ao menos quinze minutos de fama. Alguém ainda duvida?

As antenas de Warhol também captaram, em cores quentes, as ondas da Guerra Fria - Lênin, Mao Tse Tung e Nixon merecem enormes retratos coloridos. O artista registrou ainda, em painel, o triste fim de John Fitzgerald Kennedy, e admitiu, em declaração também em destaque na mostra, que sua maior comoção não se deu pela morte do ex-presidente americano, que ele admirava, mas pela maneira como os meios de comunicação esforçavam-se para produzir a comoção de todos. E o Sr. América captou também as inevitáveis contradições de uma sociedade consumista: Suicídio e Cadeira Elétrica são obras emblemáticas nesse sentido.

Pode-se gostar ou não do trabalho de Warhol - como o de qualquer artista, aliás. Mas é preciso reconhecer que o americano soube, como poucos de sua geração, reler a própria herança, interpretar seu tempo e fazer projeções que hoje se confirmam. Visitar "Mr. America" é olhar para a história e dar-se conta de que a sociedade de consumo e seus bezerros de ouro sobrevivem, como sinais de sua própria decadência. Isso faz de Warhol um artista atual, e, por isso mesmo, sua fama sobreviveu a muito mais que 15 minutos.

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