Nahima Maciel
postado em 15/04/2010 10:36
A Brasília do fim da década de 1950 foi intensamente fotografada. Profissionais não se cansavam de apontar suas câmeras para a cidade nascente, motivados talvez pela necessidade de fazer o mundo acreditar que, sim, no meio do Brasil, nascia um sonho. De lá para cá, Brasília continuou a atrair câmeras, mas também se tornou sujeito da produção artística local, e o cinquentenário serve de gancho para exposições que celebram a cidade a partir desta quinta-feira (15/4). Na Câmara dos Deputados, as fotografias do sueco Äke Borglund revelam o início da construção, enquanto na Expoarte é a Brasília moderna que motiva a fotografia do francês Guy Blanc. A Galeria Fayga Ostrower, na Funarte, será o abrigo da pintura brasiliense contemporânea com uma mostra de 35 artistas da cidade. Com curadoria de Bené Fonteles, a exposição faz parte da série de comemorações Brasília - Outros 50.
COORDENADAS POÉTICAS:
BRASÍLIA, ENTRE EIXOS E ENTRELINHAS
Guy Blanc primeiro se encantou com o Brasil. Trocou a França pelos trópicos aos 25 anos e chegou por aqui como assistente de direção de cinema. Instalou-se primeiro no Rio. Conheceu Brasília em 1979, enquanto produzia um documentário sobre Oscar Niemeyer. "Fiquei muito sensibilizado pelas linhas da cidade", conta o francês, que se instalou definitivamente na cidade em 2004 e produziu, desde então, uma série de ensaios que valorizam a arquitetura brasiliense. "Fiquei muito atraído pelos contornos humanos da cidade, mas durante dois anos fotografei mais as linhas de Oscar do que as pessoas. Estava obcecado por essa vontade de expressar o charme da cidade em imagens", conta Blanc. Nas 20 imagens selecionadas (entre elas, as duas acima) para Coordenadas poéticas, Blanc investe na presença humana. Em vez de focar apenas a arquitetura, como fez nos primeiros ensaios, agora o fotógrafo volta sua curiosidade para os seres que ocupam o concreto. "Quero mostrar a presença das linhas e das pessoas, mas de maneira muito discreta, frequentemente com silhuetas dos personagens de longe", conta.
# Abertura hoje, às 18h. na Expoarte Galeria (SRTV Q. 701, Edifício Brasília Design Center). Visitação até 30 de abril.
BRASÍLIA PRAZER DE PINTURA
Os 35 artistas selecionados pelo curador Bené Fonteles têm em comum o sentimento de pertencer a Brasília e a constante atuação na cena da cidade. Para separar as gerações, Fonteles criou um núcleo histórico fundador no qual inseriu obras de Rubem Valentim, Athos Bulcão, Douglas Marques de Sá e Glênio Bianchetti. No entanto, a exposição não se limita aos nomes históricos e agrega exemplos da produção brasiliense de 1970 a 2000. Fonteles escolheu obras representativas de todos os momentos das artes plásticas na cidade. Galeno, Ralph Gehre, Luiz Gallina, Elder Rocha, Wagner Hermuche, Rômulo Andrade, Nelson Maravalhas, Fernando Madeira e outros respondem por uma geração já consolidada. A produção mais jovem aparece em trabalhos de Polyanna Morgana, Matias Monteiro, Moysés Crivelaro, Marta Mencarini, Raquel Nava, Clarice Gonçalves e outros. " A escolha dos artistas foi feita pela qualidade e coêrencia da trajetória e também pelo compromisso que eles têm com a cidade e com a proposta da mostra de construir uma outra Brasília, livre da corrupção e com uma arte mais cidadã", explica o curador. A cidade é o fator que une esses artistas, embora não apareça citada em todas as obras. "Brasilia é mais o sentido da união de todos querendo uma outra forma de vê-la e senti-la, refletir sobre ela e traçar rumos mais interativos e responsáveis com a comunidade. Acho que o fato de as obras serem feitas aqui já reflete o meio ambiente, está tudo na subjetividade poética/estética", acredita Fonteles, que também reservou um espaço para homenagear a pintora Cândida Xavier da Costa, que acompanhou e cuidou de Athos Bulcão durante 35 anos. "Ela tem um trabalho original e extraordinário muito próximo da escola naif."
# Abertura em 20 de abril, às 20h, na Galeria Fayga Ostrower (Complexo Cultural da Funarte). Visitação até 30 de maio, de segunda a sexta, das 9h às 21h.
BRASÍLIA 57: UMA SAGA DO SÉCULO 20
Äke Borglund esteve em Brasília pela primeira vez no fim dos anos 1950. Fotografou a cidade e foi recebido pela argentina Mercedes Urquiza, que deixara Buenos Aires em companhia do marido para viver na cidade recém-nascida. Borglund fotografou muito, voltou para a Suécia e mandou para Mercedes um lote de 50 imagens em agradecimento à receptividade. "De uns cinco anos para cá, Mercedes divulgou essas fotos. Depois, ela acabou indo à Suécia e descobriu que ele tinha várias outras imagens. E ele cedeu um outro lote de fotos, todas inéditas, que estavam guardadas em uma mapoteca e nunca tinham sido mostradas", conta o curador Evandro Salles, responsável pela montagem das 111 imagens no corredor do anexo 2 na Câmara dos Deputados. "Tem algumas parecidas com as anteriores, do mesmo filme. E outras totalmente novas. São de um momento muito inicial da cidade. Tem o começo da construção das casas da W3, a construção do Brasília Palace. São fotos raras que revelam, de alguma maneira, um clima de renovação e crença em outro país." O curador também destaca os contrastes revelados nas imagens. Um Brasil agrário típico do Centro-Oeste convive com a modernidade recém-chegada. Outro detalhe das fotos de Borglund é a presença da figura humana, fartamente documentada nas imagens da mostra.
# Visitação até 30 de abril, de segunda a sexta, das 9h às 18h30, no corredor de acesso ao plenário da Câmara dos Deputados, Anexo 2.