Diversão e Arte

LCD Soundsystem enfrenta as expectativas dos fãs com nove desabafos sobre o mundo pop

postado em 17/04/2010 12:03

Muito antes de chutar a porta do showbusiness, James Murphy era um fã de música pop. Daqueles obsessivos. A informação poderia parecer irrelevante, mas não quando se fala em LCD Soundsystem. Em uma entrevista recente à Rolling Stone, o produtor nova-iorquino definiu o projeto como uma espécie de testamento musical. ;Criei a banda para mostrar o que eu sinto a respeito da música. É uma explicação, um argumento;, afirmou. Ele próprio ainda não consegue explicar como esse despretensioso autorretrato se transformou em best-seller. Mas não há como minimizar os fatos: o terceiro capítulo dessa história, This is happening, é um dos lançamentos mais aguardados de 2010.

O excesso de expectativas em relação ao álbum, aliás, inferniza o cotidiano do ídolo. Semanas antes do lançamento (marcado para 17 de maio), Murphy reclama da crise de estresse que abalou a gravação. Já fala até em partir para aventuras mais modestas. ;Se a banda ficar mais conhecida, acho que vou acabar perdendo o interesse. Muitas pessoas gravam três bons discos e, depois, não conseguem fazer nada decente. Sinto que é hora de criar algo diferente;, provocou. Seria lamentável. Na mansidão do pop americano, o LCD Soundsystem ainda soa como um belo estrondo.

Nos palcos, o LCD é um septeto de rock. Uma banda de verdadeNos palcos, o LCD é um septeto de rock. Uma banda de verdade ; e quem assistiu ao show deles no Marina Hall, em novembro de 2007, sabe que não há nada fake na simplicidade de Murphy. Mas é no estúdio que esse sujeito comum se transforma em um inventor genial. A estreia (LCD Soundsystem), de 2005, mescla house, funk e disco. Mas foi a partir de 2007, com o excelente Sound of silver, que o músico combinou quase todos os sons que gosta de ouvir: pós-punk, glam rock e new wave ferveram a pista e apresentaram ao mundo um vocalista ora cínico, ora confessional, pronto a dividir com o público as angústias da idade adulta.

Com hits como Someone great e All my friends, a popularidade do LCD Soundsystem deu um salto. Mas nada que afetasse o dia a dia de um dos donos do selo independente DFA Records. No fim de 2009, porém, começaram os contratempos. Depois de alugar uma mansão em Los Angeles (onde o Red Hot Chili Peppers fez Blood sugar sex magik), o cantor se viu em um impasse. Que álbum gravar? O compositor ganhou tempo escrevendo canções para o filme Greenberg, de Noah Baumbach (A lula e a baleia). No auge da neura, Murphy, 40 anos, decidiu abandonar os planos e fazer um disco ainda mais diversificado do que Sound of silver. E que soasse como uma despedida.

;Acredito que, quando você grava pensando que é a última vez, as canções ficam melhores;, comentou ao semanário inglês New Musical Express. Logo que vazou na internet, há cinco dias, o disco entrou na lista dos assuntos mais quentes do Twitter. Não por menos: This is happening soa como uma continuação diabólica de Sound of silver, mais sujo, menos acessível (a faixa mais curta dura quase quatro minutos) e tão pessoal quanto. Poucos dias depois, a gravadora do cantor se rendeu ao falatório virtual e colocou o disco na íntegra, de graça, para ser ouvido na internet. Mas não melhorou o humor. Uma das músicas, chamada You wanted a hit, é malcriada. ;Você quer um hit, mas nós não fazemos hits;, afirma. E quem disse que música pop só traz alegrias?

Crítica
Crise saudável


Um dos males mais traiçoeiros do mundo pop, a tal ;síndrome do segundo disco; finalmente se instalou no organismo do LCD Soundsystem. Três anos depois de Sound of silver (o segundão ;oficial;), James Murphy exibe um dos principais sintomas da epidemia: medo de amarelar. A crise do vocalista envenena todas as nove faixas de This is happening.

Entre arriscar mudanças e repetir uma equação que deu certo, o disco opta por uma solução intermediária. O formato é semelhante ao de Sound of silver ; uma colagem sentimental de sons setentistas, do porão às discotecas ;, mas o espírito é de confronto: as faixas são longas (só Drunk girls e I can change têm cara de hit), ruidosas (All I want), às vezes até cansativas (caso de Pow pow, oito minutos). Mais ressaca, menos festa.

Até chegar a Home, a última canção, o LCD narra o desconforto de Murphy em relação ao sucesso. ;Você quer esperteza. Honestamente, eu não sou esperto;, admite, em You wanted a hit. Mas nada do estrelismo histérico de celebridades. O discurso soa tão franco (até autodepreciativo) quanto um texto de blog. É o que faz do LCD Soundsystem uma banda à altura dos ídolos de Murphy: o inventor de canções é brilhante, mas sobretudo humano. (TF)

Confira o clipe da música North American Scum, do LCD Soundsystem

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