postado em 24/04/2010 07:00
Para a família do maestro Marcelo Lehninger seria uma verdadeira excentricidade se ele optasse por ser médico, engenheiro ou mesmo advogado, profissões almejadas por boa parte das pessoas. Com pai violinista e mãe pianista, o caminho escolhido só poderia ser um: a música. Hoje, aos 30 anos, ele faz parte de uma leva de regentes brasileiros que vem se destacando no exterior e acaba de ser selecionado para o cargo de regente assistente da Orquestra Sinfônica de Boston (1) (The Boston Symphony Orchestra), uma das mais importantes dos Estados Unidos. É a segunda vez na história que um brasileiro vai reger essa tão prestigiada orquestra. O primeiro, ainda no fim da década de 1940, foi o cearense Eleazar de Carvalho, que na época dividia o posto com ninguém mais do que o norte-americano Leonard Bernstein.Na semana que passou, Lehninger esteve em Brasília pela primeira vez. Veio conhecer a capital e visitar o pai, o spalla da Orquestra Sinfônica do Teatro Nacional Claudio Santoro, Erich Lehninger, e conversou com o Correio sobre a nova e ousada experiência profissional.
;O interessante é que o Eleazar foi justamente a figura inspiradora da minha vida com meu pai, que também é maestro. Lembro que quando tinha 11 anos, ia visitar meu pai, que era o spalla da Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo, e Eleazar de Carvalho, o maestro. Acabei acompanhado todo aquele universo dos músicos, as conversas, e passei a me interessar muito por aquilo tudo, o que acabou me despertando para a questão da regência. Tudo contribuiu para a minha formação. Brinco que não me bastava apenas 88 teclas de piano para tocar, eu precisava de 88 músicos para reger;, conta.
Oficialmente, Lehninger só vai ocupar o cargo em Boston no começo de 2011, mas, já em outubro, está convidado para reger um concerto na temporada oficial no Symphony Hall e outro em Tanglewood, em Boston. Desde fevereiro, ele é maestro assistente de Fabio Mechetti, na Orquestra Filarmônica de Minas Gerais.
Anteriormente, Lehninger atuou como regente substituto da Orquestra Sinfônica Nacional de Washington, e foi quando estava se preparando para voltar ao Brasil que recebeu a notícia da seleção para maestro assistente na Sinfônica de Boston. ;As minhas malas já estavam no navio e eu tinha só duas semanas para me preparar para a audição. Foi uma loucura e um período curto, mas de estudos bastante intensos;, lembra.
Ele era o único brasileiro entre os sete concorrentes. Os demais eram todos norte-americanos. O presidente da banca, o maestro James Levine, diretor do Metropolitan Opera e da Sinfônica de Boston, foi quem anunciou o resultado. Por mais que estivesse preparado, Lehninger confessa que ficou surpreso. ;Logo após a audição, esperamos umas duas horas pelo resultado final. E foi quando ele anunciou de supetão. Confesso que fiquei até meio chocado. Até porque eles anunciariam dois nomes e só tinham chegado ao consenso em um deles que era eu. É claro que quando você entra em uma disputa, você não entra para perder. Você se prepara o máximo, e eu me concentrei 100% na música. Não fiquei pensando nos outros candidatos. Foquei na música, em reger a orquestra, e acho que isso foi fundamental;, revela.
Como é maestro assistente, ou seja, responsável por substituir o maestro principal e convidados quando necessário, Marcelo Lehninger pretende conciliar a agenda do grupo norte-americano com a filarmônica mineira. Para ele, o país vive um bom momento de safra de regentes, mas ainda falta estrutura por aqui e mais oportunidades. ; Temos grandes maestros que não só atuam aqui como fora do Brasil. Mas a maioria vai trabalhar no exterior por uma questão de oportunidades mesmo. Na Europa, por exemplo, você tem milhares de orquestras e isso facilita, especialmente para os mais jovens. Falta investir mais no ensino da regência, mas material humano, e de qualidade, é o que não falta;, acredita.
1 - Tradição
The Boston Symphony Orchestra é considerada uma das cinco mais importantes dos Estados Unidos. Fundada em 1881, a Sinfônica se apresenta, na maioria das vezes, no Boston Symphony Hall e no Centro de Centro de Música Tanglewood. Atualmente, seu diretor musical é o norte-americano James Levine. A reputação da orquestra cresceu durante a direção musical do russo Sergei Koussevitzky, que assumiu o cargo em 1924, permanecendo até 1949. Na temporada de 1947, ele contava com a assistência de Leonard Bernstein e do brasileiro Eleazar de Carvalho.