Diversão e Arte

Fotografias de Marcel Gautherot trazem uma Brasília recém-erguida do barro vermelho dos anos 1960

Nahima Maciel
postado em 03/05/2010 08:18
As imagens realizadas por Marcel Gautherot nos primeiros anos da construção de Brasília foram publicadas em jornais e revistas do mundo inteiro. No entanto, há um lote de imagens captadas logo após a inauguração pouco divulgado. Nesse conjunto, a cidade começa a tomar forma humana e os espaços monumentais adquirem, aqui e ali, um contorno menos futurista. As primeiras crianças, as primeiras superquadras, o Cine Brasília e um público ralo, pessoas à beira do Lago, Brasília começava a ser ocupada. Claro, o vazio e a arquitetura ainda persistiam, mas aos poucos passavam a conviver com os recém-chegados. Esse conjunto que vai desde o registro da paisagem virgem nos primeiros momentos da construção até a chegada dos habitantes integra o livro Brasília - Marcel Gautherot. Imagem da escultura Guerreiros, também conhecida como Os Candangos, do escultor Bruno Giorgi, do livro  livro Brasília - Marcel GautherotEditada pelo Instituto Moreira Salles (IMS), a publicação traz 150 imagens inéditas selecionadas entre as 3 mil do acervo mais completo de Marcel Gautherot sobre o Brasil. "Utilizamos alguns critérios. Primeiro o de percorrer os momentos que Gautherot registra a paisagem do cerrado e começa a incorporar no horizonte elementos da construção da cidade. Ele faz imagens que permitem situar esse projeto urbanístico e arquitetônico no espaço do Planalto. Depois existe uma documentação do acompanhamento da construção com o Congresso, a Praça dos Três Poderes, a Catedral. E aí ele fez os monumentos construídos. É uma fotografia de arquitetura excepcional, o projeto concretizado", explica Sérgio Burgi, curador das imagens do livro. "Pela luz e contraste, ele sabe encontrar os aspectos mais interessantes da arquitetura. É uma fotografia fortemente abstrata, com um rigor formal, a busca da melhor luz para delinear e registrar esses monumentos." Francês nascido em família operária, Gautherot chegou ao Brasil em 1939 a serviço do Museu do Homem de Paris, para o qual trabalhava no registro das culturas do mundo e onde tinha, como parceiro, o também fotógrafo Pierre Verger. Gautherot adentrou o Brasil pela Bahia. Havia lido Jubiabá, de Jorge Amado, e quis procurar em terras baianas o que encontrara no livro. Na década de 1940, se instalou no Rio de Janeiro e passou a circular pelo Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Sphan) e a realizar pequenos trabalhos de documentação, especialmente em Minas Gerais. Brasília entraria na vida do fotógrafo naturalmente, uma vez que, pelo prédio do Sphan, passaram ainda Lucio Costa e Oscar Niemeyer. Brasília também traz artigo inédito do inglês Kenneth Frampton, professor da Universidade Columbia, de Nova York, e um dos mais importantes críticos da arquitetura moderna no mundo. Frampton esteve em Brasília pela primeira vez em 1966, durante uma viagem pela América Latina. Demorou mais de quatro décadas até voltar à cidade, em janeiro último, a convite do Instituto Moreira Salles e com a missão de buscar elementos para o artigo de Brasília - Marcel Gautherot. Hoje, Frampton constata que Brasília é um projeto moderno inacabado e, embora haja excesso de espaço, ainda não é possível encontrar na cidade um espaço público generalizado. A cidade, segundo o crítico, está "suspensa entre a aparentemente não planejada, e pós-moderna, economia do laissez-faire de suas cidades-satélites e a visão modernista e planejada, contudo ainda distante de ter sido consumada, de um modo de vida inteiramente novo". MARCEL GAUTHEROT - BRASÍLIA Ensaios de Sergio Burgi e Kenneth Frampton. Instituto Moreira Salles, 192 páginas. R$ 85.

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