Ricardo Daehn
postado em 12/05/2010 08:34
Uma sobrecarga de amores vai provocar engarrafamento, na trinca de atrações cinematográficas previstas para as próximas edições do projeto Seleção Cinema: A França no Olhar do Brasil, com exibições semanais de filmes na Sala Le Corbusier (Embaixada da França). Escolhidos pelo crítico José Carlos Avelar, os longas franceses (saídos de lote de 400 títulos preservados pela cinemateca da Embaixada da França) celebram a declarada paixão do diretor Jacques Demy não só pelo cinema e pela música, mas, diante da projeção do filme Jacquot de Nantes (1991), o alvo é ainda o amor dele, por mais de três décadas: a cineasta Agnès Varda, responsável pelo docudrama que homenageia Demy, morto (em 1990) em decorrência de um tumor cerebral.
Com exibição seguida de bate-papo com o professor e crítico Sérgio Moriconi, o projeto - que tem versão carioca e se estenderá até 8 de dezembro, sempre às 19h, - trará, hoje, o longa Duas garotas românticas (1967), indicado ao Oscar de melhor música.
Cristalizando a eterna parceria ao lado do compositor Michel Legrand, Demy usa da vivacidade das atrizes Catherine Deneuve e Françoise Dorléac e de paleta de cores marcantes para dar leveza à trama centrada na figura e nos sonhos das irmãs Delphine e Solange, uma ruiva e a outra, loura, que se completam no ramo da dança e da música. Tendo como astros George Chakiris (Amor, sublime amor) e Michael Piccoli, ele ainda ressalta a emblemática presença de Gene Kelly, em explícita homenagem aos musicais dos anos de 1950.
Na próxima semana, a programação para os brasilienses emplaca Jacquot de Nantes, dirigido e roteirizado por Agnès Varda, a partir de cunho memorialista de Jacques Demy, criado perto de Nantes. Além das reminiscências do diretor, o filme (exibido fora de competição no Festival de Cannes de 1991) traz clipes de filmes assinados por ele, como Pele de asno (1971) e Lola (1960). Ele, que não chegou a assistir ao filme, também aparece em entrevistas complementares às imagens fictícias, condensadas em termos de entretenimentos infantis do cineasta, que compreendiam contato com marionetes e pequenas óperas.
"Não gosto de ópera. Cinema é melhor", diz um personagem de Os guardas-chuvas do amor (1964), numa irônica passagem, por sinal, da atração do evento para o dia 26. Integralmente cantada, a produção arrebatou a Palma de Ouro no Festival de Cannes e ainda rendeu quatro indicações para o Oscar. Novamente com Catherine Deneuve, Demy divide a fita em três partes - A partida, A ausência e O retorno -, no filme em que uma figura alerta: "Só se morre de amor no cinema". A protagonista, Geneviéve, se divide, progressivamente, entre dois amores - Guy (Nino Castelnuovo), convocado pelo Exército, e Cassard (Marc Michel), um revendedor de diamantes que age como conselheiro. Cheio de palavras rimadas e com colorido exuberante, o clássico filme parece se esforçar para contrariar a crença da moribunda Tia Elise, que declara: "Talvez a felicidade me deixe triste".