Diversão e Arte

Boates brasilienses chegaram a ser referência nacional nos anos 1970 e 1980

Irlam Rocha Lima
postado em 15/05/2010 16:49
A cinquentona Brasília era adolescente quando começou a se jogar nas baladas. O ano era 1976 e, numa cidade em que havia grande carência de lazer e de diversão noturna, foi inaugurado o Centro Comercial Gilberto Salomão, transformando-se imediatamente em concorridíssimo point. Com ele, surgiram as duas primeiras boates: as hoje lendárias Kako e Shalako, frequentadas por jovens da época ; vários deles viriam a se tornar conhecidos empresários e políticos.

A Zoom foi um dos points mais concorridos daquela épocaEra a época da disco music e as pistas de dança das duas casas (e logo depois a da Sunshine, também no Gilberto Salomão) viviam lotadas, embaladas pela música pra lá de dançante de Donna Summer, Diana Ross, Gloria Gaynor, Barry White, ABBA e, claro, Bee Gees, presente na trilha sonora de Os embalos de sábado à noite, filme protagonizado por John Travolta, que acabara de ser lançado no Brasil.

No fim da década de 1970, a febre da novela Dancin;days, da TV Globo, contagiou o país. Não por coincidência, naquele período começaram a ser inauguradas discotecas em várias capitais brasileiras, inclusive Brasília. Aqui, durante um ano e meio, muita gente passou pela Machine, no Venâncio 2000, e dançou bastante sob os efeitos provocados pela luz que incidia sobre globos espelhados, suspensos no ar. A New Aquarius, primeira boate gay da cidade, arrastou quem já havia saído armário (ou não) para o Conic, em tempo de muita repressão, sob a égide do regime militar.

Foram contemporâneas da Machine a Nepenta e a Sherezade, que existiram no 9; andar e térreo do Torre Palace (Setor Hoteleiro Norte). Em 1982, os festeiros migraram para a Corte Club Privé, uma espécie de Hipopotamus ; a famosa boate de Ipanema, no Rio de Janeiro ; instalada no subsolo do St. Paul Hotel (Setor Hoteleiro Sul). ;A Corte teve noites de glória, com festas memoráveis, em seus três anos de funcionamento;, lembra o servidor público Fernando Maciel, que foi relações públicas do lugar.

Mas o que viria a colocar Brasília no mapa da noite brasileira foi a Zoom, erguida em 1986 onde antes havi a o Cine Espacial, no Gilberto Salomão. Fruto de parceria entre o empresário que dá nome ao centro comercial e o então ;rei; da noite carioca Chico Recarey, a danceteria foi inaugurada em 8 de maio daquele ano, com uma das festas mais badaladas da história da cidade, tendo entre os convidados celebridades como Pelé, Xuxa, Luiza Brunet e Roberta Close.

Recarey trouxe para agitar as noites da Zoom o disc jockey (o termo DJ ainda não era utilizado) Ricardo Lamounier, com passagem por cabines de som de boates e discotecas de Paris, Nova York, São Paulo e Rio de Janeiro. Num segundo momento, o local transformou-se em palco de shows de cantores e bandas de rock (a Plebe Rude e o Kid Abelha tocaram lá), pop e baianas, como Reflexu;s, Eva e Chiclete com Banana.

;Fui uma das pessoas que mais frequentou a Zoom, a grande boate da história da noite de Brasília. Além de festas inesquecíveis, ela acolheu shows e eventos diversos, como comemorações de vitórias do Brasil na Copa do Mundo e desfiles de moda. Participei de dois, pela Magrella e Zoomp;, recorda-se o ex-modelo e advogado Silvestre Rodrigues da Silva.

Saramouche (QI 11 do Lago Sul), Hyppo;s e Tequila Rock (Gilberto Salomão) foram destaques na primeira metade da década de 1990. Houve a tentativa de instalar aqui, na Academia de Tênis, uma filial do paulistano Palace. Apesar de inaugurado com pompa e circunstância, não vingou e deixou vários sócios, que haviam adquirido cartão, a ver barquinhos no Lago Paranoá. ;Nenhuma boate fez mais sucesso entre 1992 e 1995 que a Scaramouche. As melhores festas aconteceram lá e tínhamos sempre a presença de gente bacana. De atores globais a modelos. Recebemos até o príncipe Albert, de Mônaco;, conta Anna Paula Couto, uma das primeiras promoters brasilienses, anfitriã da casa.

Na segunda metade de 1990, o eixo da diversão noturna transferiu-se para Taguatinga. A Capital Club, no Pistão Sul, passou a ser o ponto de encontro dos baladeiros ao promover, sob o comando dos então DJs Hélio Kesseler e Neto Salut, eventos temáticos com a presença de atores e atrizes que se destacavam em novelas e minisséries globais, como Thiago Lacerda e Luana Piovani. Depois foi a Ilha, no shopping Top Mall.

Bem no fim da década, o agito voltou a se espalhar pelo Plano Piloto, com a inauguração, quase que simultânea, da Fashion Club e do Café Cancun (Liberty Mall), do Basic Club e Sétima Arte Café (413 Sul), Dom Taco Café (309 Sul), Dom Taco Fiesta e Farol (Pier 21). ;Com a Fashion trouxemos um novo conceito de diversão para a noite da capital, que até hoje é lembrado com saudade, em comunidades do Orkut, pelos frequentadores da casa;, afirma José Carlos Vasconcelos, ex-sócio da boate.

Além de festas inesquecíveis, a Zoom acolheu shows e eventos diversos, como desfiles de moda;
Silvestre Rodrigues da Silva, ex-modelo e advogado

Propostas diversificadas

Boates não costumam ter vida longa na cidade. O resistente Café Cancun, inaugurado no fim da década passada foi uma exceção: durou mais de 15 anos, mas acabou encerrando as atividades em dezembro do ano passado. Outras casas noturnas que surgiram no mesmo período, ou depois, por razões diversas fecharam as portas antes ; entre elas, Canal Street (304 Sul), Nix (QI 9, Lago Sul), Frei Caneca Draft (Brasília Shopping), e Macadâmia (Setor de Clubes Sul).

A Macadâmia, com uma proposta ousada de aproveitar ao máximo os espaços abertos, destacou-se entre as demais entre 2004 e 2006. Com programação variada, que ia de baladas ao som de house music e outros estilos de batidas eletrônicas a shows de artistas locais e de bandas baianas. ;Nos dois anos de existência, a casa era a principal referência de diversão. Lucas Falcão, Paulinho Madrugada, Luciano Verri e Rodrigo Verri e eu criamos um ambiente para festas que era elogiado por todos. A Macadâmia fez história na noite brasiliense;, acredita o produtor de eventos Ronald de Carvalho.

Há ainda as que, depois de reforma na estrutura, continuam funcionando, mas com outro nome. A Zoom, por exemplo, depois de algum tempo fechada ressurgiu como Trend Lounge, que manteve-se por mais cinco anos. No ano passado surgiu no mesmo local, com espaço reduzido, a Hype. Já onde funcionou a Nix, hoje existe a Hill. Enquanto no lugar ocupado anteriormente pela Farol, agora existe a Moena. A GLBTTs Blue Space (Setor de Oficinas Sul, substituiu a Garagem.

;Com a Moena, a noite da capital vive outro tempo, tendo a moderna tecnologia, na área de som e iluminação como diferencial. Se em décadas passadas o globo espelhado que pairava sobre a pista de dança era destaque, hoje o que chama a atenção são os painéis de led. Aliás, a pista de dança é um detalhe a mais em nossa casa, pois os frequentadores dançam nos lounges, no camarote;, observa Marco Aurélio Silva, um dos sócios do empreendimento. ;Outra coisa, o público de hoje é muito mais exigente em relação a itens como conforto e atendimento, e quer programação bem variada.;

Variado, igualmente, é o perfil das casas noturnas surgidas de dois anos para cá. A Heat (anexo ao Espaço Cultural Contemporâneo ; Ecco, no Setor Comercial Sul) é voltada para a galera da classe média alta. A Velvet (102 Norte) se transformou em reduto de roqueiros; enquanto a frequência da Drops é formada, predominantemente, por pessoas do segmento alternativo ; de quem curte música a eletrônica ao segmento GLBTTs.

Entre as boates abertas mais recentemente, a Pixy (Setor de Clubes Sul), que havia virado palco do funk, foi interditada há duas semanas pelo Instituto Brasiliense de Meio Ambiente e Recursos Hídricos ; Ibran. Enquanto isso o Gate;s Pub velho de guerra (403 Sul) mantém-se firme. Já a Landscape (Centro de Atividades do Lago Norte) segue em frente com altos e baixos.

Tags

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação