postado em 28/05/2010 08:18
Um maio atípico em Brasília, com chuvas de fim de tarde e uma onda de insetos na Esplanada dos Ministérios, tem espantado muita gente. E se, em meio ao engarrafamento de fim de expediente, um trio elétrico para misteriosamente ao lado da fila de carros? Os integrantes, vestidos de capas pretas, batucam um samba tresloucado, com influências de jazz fusion, rock e música erudita por três minutos. Fim da apresentação, o veículo vai embora sem nenhuma explicação.
O que pode parecer um protesto sem gritos é na verdade o novo e inusitado projeto do Satanique Samba Trio. O grupo candango de música experimental, formado em 2002, pouco tem de satânico e contesta o próprio nome pela formação, de sexteto. De samba, há bastante. Tendo o ritmo brasileiro como base, o grupo quebra regras da MPB com elementos proibidos, como dissonância, distorção e compassos variáveis.
Como se as ironias já não fossem suficientes, o líder Munha esvazia o novo projeto, batizado de Satanique samba trio elétrico, de qualquer ideologia ou experimentação acadêmica. "Suspeito que tenha sido fruto de alguma piada de mau gosto, como boa parte do que o grupo costuma oferecer ao espectador", explica, irônico. "Nossa maior inspiração para esse projeto foram as micarês e o carnaval de Salvador", complementa.
O projeto, que roda diversos pontos do Plano Piloto hoje, pode surpreender motoristas e passantes em qualquer lugar. "O tempo de intervenção é curto porque temos de tocar em vários lugares durante o percurso. Em caso de engarrafamentos, no entanto, estenderemos o repertório, talvez repetindo até o trânsito ficar livre", detalha Munha. Amanhã, o grupo segue para outras regiões administrativas do Distrito Federal com o projeto, mantido por recursos do Fundo de Apoio à Cultura (FAC). "Uma das diretrizes principais é tomar as ruas de assalto, levar a estranheza ao dia a dia do cidadão. Dito isto, não me parece boa ideia divulgar os pontos exatos em que passaremos. Rasgaria a lona do circo de horrores que estamos levantando", conclui o líder.
O repertório relâmpago se baseia nos dois álbuns de estúdio, Misantropicália (2004) e Sangrou (2007), lançados pelo finado selo independente paulistano Amplitude. Munha (baixo), RC (viola caipira), André Togni (percussão), Jota (cavaquinho), Etos (clarineta) e Lupa (bateria) sobem ao palco itinerante inventado por Dodô e Osmar para desvirtuar o samba e impactar o público à moda das intervenções urbanas performáticas. O resultado é imprevisto pelo grupo, que prefere manter baixas expectativas e aguardam a "total indiferença" do público. "O objetivo principal é a divulgação do nosso repertório. O resto é incidental", arremata Munha.