Diversão e Arte

Salve o compositor popular

Um dos melhores autores da nova MPB, o carioca Rodrigo Maranhão lança o segundo disco, com repertório variado, estilo enxuto e participação de ótimos instrumentistas

postado em 30/05/2010 15:59 / atualizado em 22/09/2020 14:46

Maranhão aposta em letras curtas e sem refrãos, para Rodrigo Maranhão é um cara surpreendente. Um dos melhores compositores que surgiram no país nos últimos anos, ganhou um Grammy antes de lançar o primeiro disco, teve música em trilha de novela das oito, faturou o Prêmio Tim de cantor regional e de revelação (já meio grisalho), e em pouco tempo virou um dos autores mais requisitados pelas intérpretes de sua geração. Tinha tudo para ficar deslumbrado, mas que nada. Sossegado, boa-praça, faz até piada com o dia de entrevistas na gravadora Universal. ;Tô me achando;, ri o músico carioca de 39 anos, que agora lança seu segundo disco, Passageiro, e, mais uma vez, surpreende.

Cercado por ótimos instrumentistas ; entre eles, Leandro Braga, Siba, Marçal, Marcos Suzano, Zé da Velha e Silvério Pontes ; e com a produção de Zé Nogueira, Rodrigo Maranhão volta com seus sambas, xotes, baiões e toadas (agora acrescidos de um ;quase fado; e uma ;valsa lisérgica;) em 12 faixas compostas por ele. Versão, nunca gravou. Tinha até pensado em incluir Futuros amantes, de Chico Buarque, no CD de estreia, Bordado (2007), mas desistiu. ;Não queria enveredar pelo caminho do intérprete;, justifica. ;Me sinto mais à vontade cantando minhas composições mesmo, acho que é o que tenho de mais forte para mostrar. É tanta música que tenho no baú, ali esperando;;

Metade das faixas foi feita especialmente para o álbum. A outra metade ele catou do baú. Valsa lisérgica (assinada com Pedro Luis, a única parceria do CD) e Sonho, por exemplo, foram feitas para uma peça do grupo Nós do Morro. Camaleão, gravada com Marçal na percussão e Andrea Ernest Dias na flauta, ia entrar em Bordado, mas só ganhou vez agora. É a canção mais pop das 12 e, sim, até lembra um pouco Caetano ; assim como Samba quadrado tem um quê de Chico Buarque, e Samba pra vadiar, de Dorival Caymmi. Mas são só influências. Rodrigo ; que também é cantor e cavaquinista do grupo Bangalafumenga ; é um compositor original, de estilo marcante.

Minimalista
Passageiro é um disco sintético, com letras bem curtas, sem refrãos. Rodrigo faz graça, diz que quase todas as faixas são ;inacabadas; porque chega uma hora em que não tem mais o que falar. ;Acho que isso ajuda o ouvinte a ser mais criativo;, argumenta ele, que já brinca um pouco mais do que antes, inclusive nas temáticas. ;Não me levo mais tão a sério;, confirma. Samba quadrado e Samba pra ela são as mais bem-humoradas. ;Eu quis fazer um samba importado/ um samba quadrado/ um samba sem rebolado/ um samba só/ (;) Eu quis fazer um samba falado/ fiz tudo errado e a perna deu um nó;, diz a primeira, com ironia, sobre a arte de compor, a capacidade de fazer coisas diferentes.

Samba quadrado, aliás, seria o nome do CD. Mas Passageiro, a faixa de encerramento, com Siba na rabeca, entrou ;nos 49 do segundo tempo; e acabou virando o título. Por dois motivos: ;As pessoas podiam pensar que se tratava de um disco de samba, e não é. Passageiro sintetiza o que eu queria dizer. Fala de todos nós, de estarmos juntos no mesmo barco, no mesmo bonde;. Com o álbum de estreia, também foi assim. Seria Baião digital. Para que não achassem que era um disco de baião eletrônico, coisa mais moderna, virou Bordado.

E se no primeiro algumas faixas já tinham sido gravadas por outros (Caminho das águas, por exemplo, rendeu-lhe o Grammy de melhor canção brasileira em 2006, na voz de Maria Rita), desta vez ele guardou o material para que seu segundo disco soasse como inédito, mesmo. E todos os músicos convidados aceitaram de imediato participar do CD. Até o cantor português António Zambujo, que Rodrigo conheceu numa das três turnês que fez em Portugal, veio para gravar, de chinelo e bermuda, Quase um fado. ;Todos vieram e foram muito generosos. Me senti querido.;

Força autoral
Rodrigo Maranhão escreveu as primeiras músicas (;horríveis;, segundo ele) aos 15 anos, quando aprendeu três acordes do violão. ;Aí você começa, gosta da função, vai se especializando; E quando passa a ser gravado, a ter eco, você continua. Se nunca tivessem gostado do que faço, eu teria parado de compor.; Pelo menos meia dúzia de cantoras entrou logo para o fã-clube: Fernanda Abreu, Zélia Duncan, Roberta Sá, Maria Rita, Verônica Sabino e Marianna Leporace.

Canções editadas, ele já teve 83. ;Essas são as que foram para o mundo, porque gravei ou alguém gravou. E para ter 83 prontas, com certeza tive 300 que não saíram do segundo compasso;, calcula. ;Mas não sou aquele compositor que fica trabalhando o tempo todo. Tenho fases em que sinto necessidade de compor. Aí fico trancado em casa. São fases inquietas, não necessariamente tristes ou alegres.;

Autoconfiança, nunca faltou. ;Faço sucesso desde que nasci (risos). Sempre fui popular no meu bairro, sempre falei com todo mundo, com o jornaleiro, o padeiro. Nunca deixei de acreditar em mim;, brinca. ;Mas deixo a expectativa para os outros e procuro fazer uma coisa de cada vez. Até porque, no mundo de hoje, a gente é treinado para se frustrar, né? Sabe aquilo que colocam no cavalo para que ele olhe só pra frente e puxe a charrete? É o que faço na minha carreira, na minha vida. Isso simplifica tudo.;

Reflexo de maturidade? ;Acho que consegui fazer um disco que tem uma cara. Porque maduro a gente não vai ficar nunca, senão apodrece (risos). Melhor continuar verde, mudando, nunca achar que chegou a algum lugar. Não cheguei.;

O número
83
Número de músicas de Rodrigo Maranhão já gravadas por ele e outros intérpretes


Ouça a música Sonho

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