Diversão e Arte

Exposição mostra como a artista plástica carioca Anna Bella Geiger usou a técnica para registrar o próprio trabalho

Nahima Maciel
postado em 01/06/2010 08:36
O casamento da carioca Anna Bella Geiger com a fotografia é coisa que vem do fim dos anos 1960. Curiosa e ousada, a artista enxergou no meio uma possibilidade de expandir a linguagem. Anna Bella, 77 anos, vem da gravura. Do ato visceral de marcar chapas de ferro e matrizes de madeira com o gesto manual. Daí enveredou para a arte conceitual, instalações, objetos e performances que marcavam sua presença. A fotografia entrou nesse conjunto como modo de testemunhar o próprio fazer da artista ou o fazer alheio do qual queria se apropriar. Por isso, é significativa a mostra Anna Bella Geiger - Fotografia além da fotografia (1972-2008), cuja curadoria de Adolfo Montejo Navas privilegia os trabalhos nos quais a imagem fotográfica aparece como indicativo da linguagem explorada pela artista. Anna Bella Geiger autorretratada em um dos trabalhos: pistas da linguagem explorada como artistaEm cartaz na galeria principal da Caixa Cultural, a exposição traz 70 obras realizadas nas últimas três décadas. Nelas, a condição fotográfica é parte do trabalho. "É uma visão que passa por objetos muito diversos, desde a gravura até a fotografia mesmo, com trabalhos onde o uso fotográfico está lá, mas não num ato meu como fotógrafa, e sim em situações onde atuo mais como diretora", avisa a artista. O percurso tem início na década de 1970, com gravuras em metal feitas a partir de fotografias, na época uma novidade em ateliês de gravadores. Por meio do gestual de esculpir a matriz em metal submetida à prensa ou do processo mais simples da serigrafia, algumas dessas obras reproduzem a superfície do chão da lua. Naqueles tempos, o homem via pela primeira vez as imagens de satélite da superfície lunar e Anna Bella visitou laboratórios nos quais conseguiu as imagens originais a partir das quais produziu as gravuras. "Nessas gravuras fotográficas o elemento territorial é a lua. É como se tivesse uma fotografia onde pudesse falar de polaridades que envolviam metaforicamente a situação política do país e a situação do Brasil periférico em relação a outros centros", lembra. Periferia e centro esclarece a narrativa da artista: o centro é deslocado para o território lunar enquanto a periferia da imagem está iluminada. O processo fotográfico ganhou tanta importância na trajetória da artista que certas experiências viraram padrões. Quando o alto contraste era usado apenas para retratos, a artista aplica a técnica ao registrar nuvens. "Isso me trouxe uma visão de território camuflado e virou um padrão no meu trabalho que se configurou como uma camuflagem", conta. É realmente difícil identificar o conjunto de nuvens como um simples conjunto de nuvens. "O uso da fotografia representa para mim um acesso direto à imagem que trazia consigo uma imediatez com caráter de reportagem jornalística. Certas imagens me davam agilidade para falar de questões filosóficas." Nos anos 1970, a combinação era uma novidade. Hoje, é uma evidência. Mas Anna Bella continua a pesquisa. Arte conceitual Foi no ateliê da gravadora Fayga Ostrower, pioneira da gravura abstrata no Brasil, que Anna Bella Geiger deu os primeiros passos artísticos. Sua trajetória se divide entre o Rio de Janeiro e Nova York. Na primeira frequentou o lendário ateliê de gravura do Museu de Arte Moderna. Na segunda teve aulas no Metropolitan Museum e deu aulas na Columbia University. Se a gravura marca o início da carreira, os anos seguintes são marcados pela sucessiva experimentação de novos suportes e linguagens. Nos anos 1970, Anna Bella explorou fotografia, fotomontagem e vídeos em Super 8. Os anos 1980 são marcados pela pintura e os 1990 trazem o viés cartográfico explorado em muitos objetos e instalações. ANNA BELLA GEIGER - FOTOGRAFIA ALÉM DA FOTOGRAFIA (1972- 2008) Exposição de Anna Bella Geiger. Curadoria: Adolfo Montejo Navas. Visitação até 4 de julho, de terça a domingo, das 9h às 21h, na Caixa Cultural (SBS Qd 4 lote 3/4, anexo do edifício Matriz da Caixa)

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