Diversão e Arte

O fantástico mundo de Chico

Ricardo Daehn
postado em 11/06/2010 07:00
;O nome dele chama a gente: é o Chico (Buarque), poxa. Ele é um cantor maravilhoso, um compositor genial. Achei caro o livro (R$ 45), não pude comprá-lo, mas vim com o intuito de participar do debate;, comentou a estudante de filosofia da UnB Bia Salomão, enquanto aguardava a segunda etapa do lançamento de Essa história está diferente ; Dez contos para canções de Chico Buarque, com participação de quatro da dezena de autores do título organizado por Ronaldo Bressane. Cadão, Noll, Bressane, Carola e Sant'Anna na Caixa: recriações para ChicoPresente no evento da Caixa Cultural, Carola Saavedra ; autora do texto Entrelaces (baseado em Mil perdões) ; explicou o processo criativo. ;Quando você trabalha com um monstro sagrado, o autor funciona como uma medusa: se você olhar de frente, vira pedra. Você tem que tangenciar o universo. A obra pode estar ali, mas de forma transfigurada;, disse. A admiração diante da compreensão do universo feminino, por parte de Chico, foi resumida: ;Não é verdade que só uma mulher entenda outra;. A elegância ;no trato com as pessoas;, o maior indício de ;civilização;, foi a qualidade destacada por João Gilberto Noll (de A calça branca, inspirado por versos como ;passas sem ver teu vigia;, entalhados em As vitrines) na análise do colega. ;A reelaboração foi inusitada na minha carreira. Existe uma relação profunda entre a gente: quando ele lançou Estorvo, parte da crítica identificou muito do meu universo no livro dele, ao enfocar o cara desterrado, no ambiente urbano, quase que se desmanchando;, explicou. Com períodos distintos de narração, a ;quase novela; criada por Noll trata de ;uma erupção amorosa entre dois homens numa galeria carioca, diante de uma vitrine que exibe uma calça branca nunca vendida;. Cadão Volpato (que recalibrou Carioca) e André Sant;Anna (autor de Lodaçal, conto brotado de Brejo da cruz) também estiveram no encontro na Caixa Cultural. Sacudindo ligações afetivas, como a lembrança da irmã, ;uma tiete miserável que gritava coisas bisonhas no show do Chico;, Cadão (que chegou a compor Chico Buarque song para a banda Fellini) definiu o processo de escrita como ;muito natural;. ;Busquei me inspirar pela música de um cara que conhecia ; não foi um trauma. Eu não me transformei: fui eu mesmo ; dentro do meu estilo ;, para o bem e para o mal;, brincou. André Sant;Anna se aventurou pela intimidade musical. ;Tentei fazer um jazz, meio improvisado, com várias coisas acontecendo ao mesmo tempo;, contou. ;Ele me fez pensar em política, com o teor social. No conto, as personagens moram perto do polígono da maconha e, durante as viagens delas, sonham com outro mundo, que, na verdade, é a realidade nossa das cidades urbanas.; Trechos do livro Essa história está diferente ; Dez contos para canções de Chico Buarque (editado pela Companhia das Letras e organizado por Ronaldo Bressane) "Quis saber as horas; o tremor com que arregaçou o pulôver para ver o relógio quase o faz chorar. Que charlatão imbecil teve essa ideia de desenhar o tempo como uma linha reta e os fatos como riscas perpendiculares periódicas, como se a história pudesse ser uma dessas fitas métricas flexíveis que as costureiras usam para tirar medidas de corpos que não cessam de mudar, de crescer, de se transformar?" Trecho do conto O direito de ler enquanto se janta sozinho, de Alan Pauls "O Pedro gosta de dizer que a mulher estudou. Que lê, sabe línguas, vai ver filme francês. E que ele é um grosso. Que ela casou com ele pela sua beleza física. Só pode ser, já que pelo intelecto não foi." Trecho do conto Feijoada completa, de Luis Fernando Verissimo "Clarice sabia: amar é um verbo sem passado. Uma vez tendo amado nunca mais se deixa de amar. Com inesperada segurança ela repetiu: não exite o ter amado, nem o ter vivido. Amar e viver são verbos sem pretérito" Trecho do conto Olhos nus: olhos, de Mia Couto "Ele fechou o livro. Ela descruzou as pernas, apoiou as mãos no colchão. Ele apagou a luz. Foram para a cama e ficaram estudando as formas desenhadas no teto toda a vez que os faróis dos carros passavam na rua. Ele beijou o ouvido dela. Não era o que queria beijar, mas beijou. Pediu desculpas, torceu os lábios. Ela o beijou de volta, abrindo a boca ao máximo. E assim um enorme vazio tomou conta da boca dele. Mas o que não parecia se encaixar se encaixou" Ouça a entrevista com o organizador do livro Essa História está diferente -- dez contos para canções de Chico Buarque, Ronaldo Bressane
Ouça entrevista com a escritor Cadão Volpato
Ouça entrevista com a escritor André Sant'Anna
Ouça entrevista com a escritor João Gilberto Noll
Ouça entrevista com a escritora Carola Saavedra

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