Nahima Maciel
postado em 11/06/2010 08:22
Difícil ficar com os braços e ombros relaxados diante de Pascal Gallet enquanto os dedos deslizam Chopin pelas teclas do piano. O pianista francês gravou nove discos - dos quais um consagrado a Chopin -, é diretor de um festival internacional de música da França e preside júris de concursos por toda a Europa. Para completar, foi aluno de Yvonne Loriot-Messiaen, mulher do compositor Olivier Messiaen, papa da música moderna francesa. Foi para Gallet que Messien dedicou algumas das partituras de Catálogo das aves. "Um grande compositor francês", na classificação modesta do pianista.
Natural, portanto, o nervosismo do jovem Gregório Oliveira, 15 anos. Mas Gallet é um francês descontraído. Tão extrovertido que, para fazer graça, testou o piano com Odeon (Ernesto Nazareth) antes de Gregório e outros 14 colegas iniciarem a master-class que se dispôs a ministrar na quarta-feira na Escola de Música de Brasília (EMB).
Gallet está em Brasília pela segunda vez. No ano passado, acompanhado da Orquestra Sinfônica do Teatro Nacional Claudio Santoro, tocou obra do também francês André Jolivet, inédita no Brasil. Ontem, fez recital na Sala Martins Penna com programa inteiramente dedicado a Frédéric Chopin e seus 200 anos de nascimento. A master-class para os alunos da EMB foi um brinde organizado pela Embaixada da França, responsável pela visita.
Gallet está acostumado a este tipo de encontro. Além de dar aulas no Conservatório de Montreuil, em Paris, realiza média de 10 master-classes por ano. "Para os estudantes é importante encontrar os artistas, receber conselhos e ter uma abordagem estética diferente. E às vezes me deparo com interpretações extraordinárias." Uma vez, Gallet ficou tão encantado com a musicalidade de um aluno em uma aula coletiva que acabou encaminhando o rapaz para uma série de concursos. "E ele venceu o Concurso Busoni (um dos mais concorridos da Itália)", comemora.
Ontem, os ouvidos do francês ficaram especialmente envolvidos pelo som de Gregório e de Kilmer Luiz Aleluia, 14 anos. O primeiro tocou o Noturno nº 1, de Chopin, e o segundo foi o único da turma a preparar uma peça brasileira. Mais jovem entre os pianistas da aula, Kilmer tocou Poema singelo, de Heitor Villa-Lobos. "Por que os jovens brasileiros não tocam mais música brasileira? Não é só a música que vem da Europa que é boa", observou Gallet, ao classificar de irretocável a interpretação do garoto para os primeiros compassos da peça. "Villa é meu compositor preferido", explicou Kilmer. "Primeiro porque é brasileiro, depois porque ele tem um pouco de tudo, você toca uma peça dele e tem a parte mais sentimental, em seguida a rapidez."
Gregório, que começou a aprender piano por causa do noturno de Chopin e deixou os pais em Salvador para estudar na EMB, saiu satisfeito. "Esperava dicas para melhorar de modo geral e foi isso que consegui%u2019", diz. A "dica" de Gallet foi praticamente uma ordem: "Você promete que vai estudar três horas por dia? Você é muito talentoso, precisa estudar." O garoto não tem piano em casa e precisa concorrer com colegas pelas vagas nas salas de estudo da escola. Mas prometeu.
A aula deveria durar três horas, porém Gallet não quis ir embora sem ouvir todos que se dispusessem a tocar, mesmo sem ter realizado inscrição prévia exigida pela escola. Foi assim que descobriu Arthur Marden e seu Liszt "magnífico". Depois de encontros como o de quarta-feira, Gallet fica esgotado. "Nunca consigo tocar depois de dar master-classes", admite.