postado em 11/06/2010 08:29
Uma cabaça, tecido, cordas e um pouco de palha. Elementos que ganham vida unidos, atados, costurados e manipulados pelas hábeis mãos de bonequeiros. Mesmo sem o uso de palavras, logo surgem um menino e sua mãe em uma terra desértica, em busca de água. A imaginação não tem limites para a Cia. francesa Les Trois Clés, e o espetáculo La gigantea, atração de hoje na Mostra Internacional de Teatro, transcende o teatro de manipulação.
Dança, música e circo são algumas das linguagens exploradas pela companhia, criada em 2006 e dirigida pelos atores Alejandro Nuñez e Eros Galvão. Ele, chileno radicado na França, já tinha passado pela companhia Teatro Del Silencio quando conheceu a brasiliense, uma ex-estudante de letras da Universidade de Brasília, que passou a se dedicar ao teatro quando se mudou para a França, em 1989. Entre ensaios e cenas da Companhia Cirque Barroque, na qual faziam um dueto de trapézio, decidiram montar uma companhia que explorasse o fértil universo teatral.
La gigantea, segundo espetáculo do grupo, é um passo adiante na proposta. A montagem nasceu em 2009 em uma parceria cultural entre França e Romênia com a intenção de dar vida a um conto fantástico criado pela dupla sul-americana. "Viemos do circo, mas não queríamos nos limitar a essa linguagem. A cada tema que a gente aborda, fazemos pesquisa sobre história similares da vida real, ficções que tratem a respeito e música. A gente busca dar vida a um novo formato. Cada espetáculo tem seu universo, sua forma particular", explica a brasiliense.
Em um enredo que mistura apelo humanitário e ecológico, com o cuidado de não pesar a mão na tragédia, a dupla desenvolve a trajetória do menino Makou, afastado da mãe por um tirano e forçado a atuar como soldado. As referências incluem contos primitivos e populares coletados por Henri Gougaud, a autobiografria Muito longe de casa, sobre o a infância de Ismael Beah a sua atuação na guerra civil de Serra Leoa aos 12 anos, e o universo apocalíptico pintado por Hieronymus Bosch. A pesquisa entre ficção e realidade levou à conclusão que, em diversas culturas, a árvore é o símbolo da vida. Assim, o nome do espetáculo é uma referência à planta Byblis gigantea, que brota em terras áridas e encontra-se em vias de extinção.
Alejandro Nuñes, acrobata e comediante formado pela Universidade Paris 8, e Eros Galvão, diplomada na Escola Superior de Artes Charleville Mézières, não se intimidam com temas polêmicos. O primeiro espetáculo dirigido pela dupla, O silêncio, reconstituía o universo de opressão imaginado por Federico García Lorca no texto para teatro A casa de Bernarda Alba. A visão do Les Trois Clés levou dois anos para ser concluída e abordou a arte circense à música.
Em La gigantea, a dupla optou por abordar a história do menino-soldado de forma poética. "Trabalhamos no enredo e na plasticidade de formas que um adulto pode captar a história, mas uma criança se encantaria com as imagens e teria outra visão do espetáculo", afirma Eros, sem perder o foco no tema delicado. "A criança, em uma situação como a do personagem, perde toda referência, e seu mundo se torna caótico, sem leis e regras. Sabemos que não há poesia nesse tema, mas acreditamos que, com uma proposta lúdica, vamos além da dor e do pathos e atingimos ainda mais profundamente o público", conclui.
LA GIGANTEA
Hoje e amanhã, às 21h, e domingo, às 20h, no Centro Cultural Banco do Brasil. Ingressos: R$ 7,50 (meia) e R$ 15 (inteira). Não recomendado para menores de 12 anos