Diversão e Arte

O imprevisível Ariel Pink sai da toca e conquista o rock independente

postado em 02/07/2010 08:22
Quem diria que, em 2010, o rock se curvaria às fitas cassete? Ariel Pink, uma das descobertas mais bajuladas do indie americano, não seria nada sem essas benditas pecinhas de museu. Desde 1996, o prolífico estudante de arte registrou nada menos do que 500 canções em um gravador caseiro. Com guitarra, baixo, teclado e nada de bateria (o som da percussão era tirado no gogó), arquivou uma torrente de incríveis canções psicodélicas. Que ninguém ouviu. Fã de Michael Jackson e The Cure, o músico simula o som de velhas cassetesFim da história? Nada. A melhor parte nem começou. Em 2003, o talento de Los Angeles cansou do anonimato e preparou um CD-R caprichado. Sorte a dele que a gravação foi parar na van do Animal Collective. A banda se viu diante de uma revelação. Isso porque Ariel conseguiu transformar a sonoridade chapada e distorcida das velhas fitas cassete em um estilo. Um novo padrão de baixa fidelidade (lo-fi). Que muito roqueiro amador passaria a imitar. Aos 25 anos, o compositor se tornou a primeira "aquisição" do selo Paw Tracks, do Animal Collective. Ainda em 2003, chegava às lojas uma reedição de The doldrums, álbum de 1999 que permanecia obscuro. O lançamento, tosco e incoerente (e de propósito), dividiu até os novidadeiros mais radicais. Até o descolado Pitchfork, site famoso por acolher as crias do underground, desconfiou da novidade. Nos shows, as vaias bombaram. "As pessoas não escondem o desprezo que sentem por mim. Estou até me acostumando", rebateu Ariel, na época. O choque poderia ter corroído o porão do músico. Felizmente, não foi o que aconteceu. De 2004 a 2008, lançou oito discos. Todos longuíssimos. A colagem frenética de Ariel continuou a ser execrada pela crítica, mas começou a arrebanhar seguidores intrigados com as referências do rapaz, cujo gosto musical parecia oscilar entre o pop mais descartável dos anos 1980, o lo-fi dos anos 1990, soul music, psicodelia e Michael Jackson. Era ou não era um excêntrico fadado às sombras? Reviravolta Em 2010, no entanto, Ariel Marcus Rosenberg está estampado nas maiores revistas de música do planeta. Até a Pitchfork elegeu o disco como um destaque do ano. Tudo por conta de um desvio imprevisto na trajetória do cantor, que resolveu abandonar o subsolo, formar uma banda de verdade (a Haunted Graffiti) e assinar com o selo 4AD Records, casa do The National e do Tindersticks. O banho de loja deu em Before today, um disco que resume o passado do compositor, aponta para o futuro e, ainda assim, soa como aquela fita cassete que você guardou no fundo do armário. Bem menos caótico do que os anteriores, o álbum parece um artefato perdido no tempo. Poderia ter sido lançado no início dos anos 1980, a era da new wave. Ou no início dos anos 1990, apogeu do "rock alternativo". Abre com uma faixa instrumental abstrata. Mas o clímax do disco é a delicada melodia soul de Round and round, made in Abbey Road. Tal como o Girls e o Japandroids, Ariel Pink simula o som áspero que ouvia quando adolescente, em fitinhas nem sempre confiáveis. Faça o teste: depois de Before today, o som que sai das rádios vai parecer polido, arrumadinho demais. ARIEL PINK'S HAUNTED GRAFFITI Conheça a banda de Ariel Pink em www.arielpink.com e www.myspace.com/arielpink. O disco Before today foi lançado pela 4AD Records. ****

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