Diversão e Arte

Asta-Rose Alcaide não para de estudar e trabalhar para que o gênero se torne popular na cidade

postado em 14/07/2010 07:00
Um dia Asta-Rose Alcaide comprou um gato de pelúcia para dar de presente a uma criança. Entre o caminho da loja e o apartamento, apegou-se tanto ao ;bichano; que desistiu de doá-lo. Hoje, ele repousa, com aspecto meio puído, no sofá da sala de estar. Antigamente, quando se apertava a barriga, ele mexia as patinhas, o rabinho e ainda miava. Agora, é de quando em quando. Mas o afeto é cada vez maior. No meio da entrevista, ela o apanha, acomoda-o entre o peito e abraça-o carinhosamente. ; Eu nunca dei nome a ele, mas adoro, conta. Tomás Alcaide, tenor português e grande amor de Asta-Rose: memória vivaA relação de Asta-Rose e o gatinho de pelúcia diz muito sobre essa mulher, a maior autoridade em óperas de Brasília. Os símbolos de afetos são caros para essa senhora. Na sala do confortável apartamento, onde ela mora sozinha, a memória está explicitada nas paredes, nos cômodos e nos cantos. O relicário ajuda a contar a história de vida da menina bailarina que se apaixonou por um tenor português. O mundo em guerra e os dois sem conseguir desgrudar os olhos uns dos outros. ; Tinha 18 anos, estava dançando no Municipal de São Paulo, quando chegou um grupo de artistas estrangeiros foragidos. Era o ano de 1941. Tudo foi muito rápido. A gente se viu e pouco mais de um ano estávamos casados, lembra Asta-Rose. As imagens, objetos, documentos e livros de Tomás Alcaide (1) estão ali, diariamente, diante de Asta-Rose. Ele morreu em 1967. Viveram juntos pouco mais de 25 anos. Pouco tempo, afirma a viúva, que manteve o status civil por convicção à história de amor. Em algumas fotos, ele aparece com ar de Rodolfo Valentino (2). Era um homem bonito, estilo galã, que foi cobiçado até por Hollywood, mas disse não. Era casado com a música. ; Com ele, aprendi tudo sobre óperas, a me interessar sobre óperas, a aprender a produzir óperas em Portugal, conta. O dois conheceram Brasília em 1962. Vieram porque ficaram curiosos sobre a construção da capital moderna. Hospedaram-se no Brasília Palace Hotel. Asta-Rose nem cogitava vir morar por aqui. Mas parecia estar traçado. Ela ainda viveu um tempo sozinha em Portugal após a morte do marido. Até que recebeu um convite para assumir as questões culturais da Embaixada dos Estados Unidos. Chegou em 1972 e o primeiro ano foi de dificuldades de adaptação. O obstáculo: a seca. Não exatamente a da natureza. Mas a da vida cultural. Aqui, havia pouca coisa, quase um deserto para uma mulher acostumada com a efervescência da Europa. Ópera então era raridade. Agora, Asta-Rose se sente brasiliense. No centro da sala, está emoldurado o diploma de cidadã honorária. É um dos seus orgulhos. ; Começa aí meu trabalho para criar a Associação Ópera-Brasília, fundada em 1978 e inaugurada em 1979, com Amahl e os visitantes da noite, na Escola de Música de Brasília. O maestro Claudio Santoro estava na regência, mas ele não era um homem afeito à ópera, pontua. Nos 32 anos de atividade da associação, foram 18 óperas criadas. Houve períodos de uma produção por ano. A época de Silvio Barbato foi a mais fértil. Asta-Rose se multiplicava para dar conta de tudo. À mente vêm flashes dela pintando cenário e subindo em escadas para retoques. Fala com ânimo da tentativa de popularizar a ópera no Distrito Federal. ; Há quatro anos não temos uma produção. Mas estou cheia de planos. Eu não paro, revela. 1 - Grão-senhor Um dos grandes tenores de Portugal, Tomás Alcaide nasceu em Estremoz em 1901 e morreu em Lisboa em 1967. Foi uma das estrelas do Teatro Scala de Milão. Figura marcante na vida cultural da Europa, colaborou com a Companhia Portuguesa de Ópera. Escreveu a autobiografia Um cantor no palco e na vida (1961). A sua memória está bem preservada na Europa. 2 - Amante latino Rodolfo Valentino foi um dos primeiros símbolos sexuais de Hollywood. Italiano radicado nos Estados Unidos, foi estrela nos anos 1920, época do cinema mudo. Consagrou-se pela imagem de amante latino. Morreu aos 31 anos.

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