Nahima Maciel
postado em 15/07/2010 07:00
O universo de Lydio Bandeira de Mello tem figuras de mãos e pés largos, colorido pastel e rostos expressivos. Tem ainda temáticas existenciais. Vida e morte estão subentendidas na maioria das cenas pintadas pelo artista mineiro radicado no Rio de Janeiro. ;Meu tema é sempre a relação com a vida e a morte;, avisa. ;A vida nos seus diversos aspectos. A vida é uma luta permanente para não morrer até o dia em que a gente perde.; São os frutos dessa luta que Bandeira de Mello colhe na Galeria Principal da Caixa Cultural. A exposição Bandeira de Mello ; Retrospecto é um panorama com 65 obras reunidas para comemorar os 80 anos do artista.Uma espiada no conjunto selecionado pelo próprio pintor dá um indício da carga expressiva de seus personagens. Um homem idoso carrega um corpo inerte e pálido em primeiro plano. É assistido, em segundo plano, por um conjunto de homens cujo espectro é mais visível do que as feições. Em outra composição, dois homens flutuam acima da terra tal qual anjos enquanto um grupo observa a cena muito semelhante à Criação de Adão pintada por Michelangelo na Capela Sistina. Em outra pintura, uma procissão realizada por gente de rostos semicobertos lembra o quanto pode ser sinistra e pálida a caminhada.
Arte, para Bandeira de Mello, tem duas funções. Uma delas é a permanência do testemunho, como explica em documentário do seu próprio site. Desde que começou a andar sobre as duas pernas, o homem se preocupa em registrar. A produção artística de hoje é uma continuação da necessidade de testemunhar a vida. ;O problema da arte é que ela é uma linguagem e o que a gente mostra é nossa relação com o universo, com o mundo. O que a gente coloca no trabalho são certos aspectos da vida que os outros não enxergam porque cada pessoa é uma pessoa;, acredita. ;Cada um tem uma consciência e a arte é o único jeito de romper a barreira da inconsciência.; Para o artista, pintar é estabelecer pontes, é libertar a consciência de sua clausura. ;E se a gente não pinta, uma parte da gente fica muda.;
Gravuras sociais
Nas galerias menores ; Piccola 1 e Piccola 2 ;, a gravadora Hannah Brandt mostra uma série de xilogravuras realizadas entre 1960 e 2001 e inspiradas em temáticas que vão de paisagens a retratos e cenas cotidianas. Gravadora tardia, Hannah começou a esculpir matrizes de madeira aos 37 anos. Hoje, aos 86, ela abandonou a prática por causa de uma artrite que impede o manuseio do material. A madeira serviu de base para o trabalho da artista. ;O veio da madeira me interessava muito. De acordo com o veio eu pensava no desenho;, conta.
A textura está sempre em primeiro plano nas obras da artista, que fez as primeiras aulas por correspondência antes de frequentar, como aluna, os ateliês de Lívio Abramo e Maria Bonomi, dois dos mais importantes nomes da gravura brasileira. Com Abramo, Hannah aprendeu a gravar em preto e branco. A cor foi adicionada em experiências autodidatas e os temas retratados sempre seguiram um anseio por justiça social cultivado desde a infância. Hannah nasceu na Alemanha e chegou ao Brasil ainda menina. As sucessivas guerras europeias do século 20 foram motivo de observação e reflexão que encontrou refúgio na arte. A gravadora não retrata cenas de guerra, mas tem olhar especial para o contexto social de tudo que observa. ;Todas as minhas temáticas têm fundo no meu coração, nos meus dilemas, nos meus sentimentos. Minhas gravuras são sociais e trazem um desejo de compreensão, de querer ajudar;, avisa.
BANDEIRA DE MELLO ; RETROSPECTO
Exposição de pinturas de Lydio Bandeira de Mello. Visitação até 29 de agosto, de terça a domingo, das 9h às 21h, na Caixa Cultural (SBS Q. 4 Lote 3/4)
O TERRITÓRIO POÉTICO DE HANNAH BRANDT
Exposição de gravuras de Hannah Brandt. Visitação até 29 de agosto, de terça a domingo, das 9h às 21h, na Caixa Cultural (SBS Q. 4 Lote 3/4)